2017-11-21

Celebrar S. Tomé e Príncipe - um desígnio meu. 
Desta vez, a propósito de uma memória do Dr. Manuel Ferreira Ribeiro, natural da Maia, pioneiro da investigação sobre a profilaxia da malária, entre 1869 e 1898.


A semana passada coloquei nas redes sociais (nomeadamente no facebook) uma memória sobre S. Tomé e Príncipe, destacando a figura do médico Manuel Ferreira Ribeiro que viveu, estudou e trabalhou uma dúzia de anos nas ilhas do meio do mundo. Ali chegou em 1869, tendo assumido a Direção dos Serviços de Saúde em 1871. Nas ilhas teve a oportunidade de viver “4 vidas”: - médico, investigador nas questões ligadas à malária, jornalista (fundou o jornal Equador - (…) Equador (1869) foi o primeiro jornal independente do arquipélago, e assumia-se como Semanário Agrícola, Comercial e Científico – e escritor (publicou muitos trabalhos e alguns livros sobre o desenvolvimento daquelas terras). Passou ainda 2 anos em Angola, 1877/1879, como médico da Expedição dos Estudos do Caminho-de-ferro de Ambaca – na linha Luanda/Malanje. Nesse âmbito, organizou em Lisboa quatro ambulâncias (hospital móvel na gíria militar) e publicou instruções higiénicas e de medicina preventiva destinadas sobretudo aos europeus que se deslocassem aos vales dos rios Cuanza e Lucala.
De salientar que ainda em Angola, tirando proveito dos seus conhecimentos, foi-lhe pedido que organizasse ambulâncias que servissem para as campanhas das obras públicas naquela colónia, bem como, um sanatório em Luanda, destinado aos expedicionários que necessitassem de primeiros socorros.
Quando o Dr. Manuel Ferreira Ribeiro chegou a S. Tomé, o território havia já entrado na chamada 2ª colonização – precisamente pela introdução das culturas do café e do cacau nos anos 20 do século XIX. Por essa altura, as condições no sector da saúde não eram famosas. Havia que criar condições para fixar os brancos europeus e, por outro lado, evitar que a malária prejudicasse o rendimento dos serviçais das roças.
As bases desse trabalho foram então lançadas, sendo mais tarde seguidas por outros médicos e investigadores – lembrando por exemplo os médicos já do século XX Melo Sereno, na Roça Água Izé; João Botica, na empresa Vale Flor (roças Rio do Ouro e Diogo Vaz nomeadamente); e o Dr. Mourão, nos Serviços de Saúde das ilhas, recordando-me ainda das campanhas do “flit” – DDT – para a erradicação do paludismo nos de 1950 e de 1960 concretamente.
Pois o Dr. Manuel Ferreira Ribeiro, que nascera em 1839 em Rebordãos, Águas Santas – Maia, viria a falecer na pobreza completa em 16 de Novembro de 1917, em Lisboa, sendo provável que tenha assistido ao funeral do primeiro grande poeta de S. Tomé – Caetano da Costa Alegre – em 21 de Abril de 1890, em Lisboa, onde terminava o seu curso de medicina na Escola Médico-Cirúrgica. Costa Alegre tinha 26 anos de idade. Ferreira Ribeiro exercia por essa altura funções na Direção Geral do Ultramar, só regressando a STP em 1892 para a sua segunda comissão de serviço. Assinalando a efeméride, organizei no passado dia 16 de Novembro, na Universidade Sénior Aprender a Viver/CES Pedras Rubras, na Maia, uma pequena homenagem na presença dos alunos – 2 dos quais familiares de Ferreira Ribeiro. Para além de dois pequenos filmes sobre as ilhas e sobre os escritores de STP, os alunos disseram poemas de autores de S. Tomé e Príncipe, por mim escolhidos. De Costa Alegre (1864-1890), como já referi, evocaram-se os SERÕES de S. Tomé
(…) A nossa terra é tão bela!
Duma beleza sem par,
E por ser assim formosa
Fê-la sua amante o mar. (…)
… de Alda Do Espírito Santo (1926-2010), professora e política, foi dito  A UMA MIRAGEM (1958), em O CORAL DAS ILHAS, de 2006
(…) Partir, partir para o destino das aventuras da glória
Romper as paredes do cárcere
É talvez um sonho marginal
Na prisão sem grades de muitas ilhas humanas
Onde o sonho flutua. (…)
… de Conceição Lima, jornalista (1961), escolhi INEGÁVEL (em A DOLOROSA RAÍZ DO MICONDÓ, de 2006)
(…) Casa marinha, fonte não eleita!
A ti pertenço e chamo-te minha
Como à mãe que não escolhi
E contudo amo.
… de Olinda Beja (1946), professora em Portugal, selecionei À SOMBRA DO OKÁ, (obra com o mesmo título, de 2016)
(…) ali ninguém mais se atreverá a negar-me o chão
a negar-me a mátria, o húmus materno doce e quente e
quente e húmido
o catre onde sempre estirei meu poema e minha mágoa e
minha sede.
… de Francisco José Tenreiro (1921-1963), geógrafo, professor e político em Portugal, o poema CANÇÃO DO MESTIÇO, em ILHA DE NOME SANTO (1942)
Mestiço!
Nasci do negro e do branco
e quem olhar para mim
é como que se olhasse
para um tabuleiro de xadrez:
a vista passando depressa
fica baralhando cor
no olho alumbrado de quem me vê.
Mestiço! (…)
         Ainda tempo para um poema meu (1953-1974 em STP) LEVE-LEVE, em SEIOS ILHÉUS, de 2010
(…) Às vezes sinto que o tempo caminha
Sorrateiro atrás de mim
Perseguindo memórias cheiros e paisagens
O ser e o estar de um ilhéu de mil imagens. (…)

António Bondoso
Jornalista
Novembro de 2017

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