2020-05-09


Esta UE – União Europeia – chega sempre atrasada às grandes decisões. Ainda não morreu mas parece ir na direção do precipício. Doente, quase prostrada, não consegue arranjar a vacina para debelar o mal, preferindo antes o egoísmo de alguns em prejuízo do todo. 

Das ideias de Schuman e mais tarde de Jacques Delors, desapareceu o essencial – o esforço solidário para consolidar a paz. Não foi dignificante o que se permitiu na última crise financeira relativamente à Grécia, à Itália e a Portugal. Os agiotas do Norte contra os pobres do Sul. E agora, em tempo de pandemia, o vírus vai consumindo ideais. Até o símbolo do cartaz para assinalar os 70 anos da Declaração Schuman se pode prestar a sorrisos amarelos: a posição das mãos, em vez de apertadas em sinal de regozijo, mais deveriam parecer as de Pilatos, a lavá-las de acordo com as diretrizes da OMS.

Como se pode assinalar o «Dia da Europa» com tanta incerteza, com hesitações permanentes, com divisões perniciosas, com falta de liderança, sem visão estratégica? Quando nasceu, a seis, a ideia fundamental e urgente era a paz, como lembrei. Depois o desenvolvimento. Mais tarde a liberdade, a tolerância, a solidariedade e o Estado de direito. Agora, a 27 e com o Ato Único ferido nas asas, alguns destes pressupostos desapareceram ou estão em vias de. Melhor fora eliminarem as estrelas da bandeira da União e passar a utilizar apenas uma outra com o símbolo do Euro. Talvez e apesar de tudo – como diz Maria João Rodrigues – a Europa ainda seja possível. Mesmo que seja seguindo a pista dos cafés de Steiner, como recordei há uns anos:
        «A Europa é feita de cafetarias, de cafés. Estes vão da cafetaria preferida de Pessoa, em Lisboa, aos cafés de Odessa frequentados pelos gangsters de Isaac Babel. […] Desenhe-se o mapa das cafetarias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da ‘ideia de Europa’»
GEORGE STEINER, 2005.
Se esta ideia de Steiner fosse a única – e determinante – não haveria dúvidas de que Portugal se encontraria na primeira linha da construção europeia. Temos, de facto, uma cultura de “cafés”, quer seja numa grande cidade, quer seja na mais recôndita aldeia do interior. Mas só isso não basta. Todo o processo foi e é muito mais complexo e para o qual o povo não foi consultado. O que, em boa verdade, agora já não importa. Decisivo, seria ter, apresentar, defender e liderar uma visão estratégica de futuro. Que também passa por uma cidadania percebida e assumida…e sobretudo ouvida! Valha-nos o Parlamento Europeu, onde reside a legitimidade. E o cartaz é elucidativo.
António Bondoso                                                                     
9 Maio 2020. 



1 comentário:

AF disse...

Obrigada, António Bondoso. Tão importante, está tua lucidez! Abraço.,