2022-01-31


DE UMA PROPALADA ESTUPIDEZ AO BOM SENSO REAL – vai todo o caminho de uma arrojada «surpresa» que milhões de portugueses souberam oferecer no ato eleitoral. Ao «desejado» “empatão”…responderam com um perfeito “empadão”. 

Da Web...

Os portugueses souberam dizer a Francisco Louçã que o governo não estava a fazer de nós estúpidos. E souberam dizer aos jornalistas, analistas e comentadores que a «floresta está muito para além de meia dúzia de árvores»! Curioso não ter ouvido com firmeza as habituais críticas às sondagens.

No meio de tantos corporativismos, de tanta arrogância, de tanta demagogia, de tanta pequenez, de tanto atavismo…houve respostas para muitas questões que se anunciavam «perdidas»!

Houve vencedores? Claro. O PS e António Costa à cabeça. Só ele e o seu diretor de campanha, com humildade e visão, souberam preparar e executar a campanha. E como «choveram» as críticas! Exceto, devo reconhecer e felicitar, o “comentador” João Soares. Foi o único a quem ouvi dizer que esperava uma boa surpresa nestas eleições. E dos outros «ganhadores», quero distinguir a «inteligência» da IL e do Livre. O combate de Cotrim de Figueiredo e a inteligência de Rui Tavares vão ser muito úteis na A.R.

Os grandes «perdedores»? Simples: Catarina Martins e o BE à cabeça, por terem deliberadamente retirado o «tapete» ao governo, chumbando um excelente OE. De igual modo o PCP, que – desta vez – já não foi capaz de repetir a velha rábula de que, mesmo perdendo, ganhavam. Outros perdedores? Sem dúvida Rui Rio e o seu gato Zé Albino, que não perceberam – por falta de estratégia e sem ideias – o beco para aonde conseguiram levar o PSD; depois, seguramente os jornalistas, comentadores e analistas. Uns, porque não conseguiram perceber que a «floresta» não é a «árvore» à sua frente…e outros porque não conseguiram livrar-se do «pensamento normalizado», sendo incapazes de assumir a diferença e ir mais além da rábula popularizada por Ivone Silva: com um vestido preto, nunca me comprometo. E apesar de todo o «carinho» e «entusiasmo» que o P.R. tentou levar aos jornalistas, lá no seu Clube, em Lisboa…devo dizer que a maior parte dos «envolvidos» na campanha eleitoral não foram merecedores de reconhecimento. Foram, isso sim, incapazes de reconhecer o esforço de um governo – liderado por António Costa – que ao longo de dois anos enfrentou, com sucesso [recuperando o emprego e a economia], as enormes dificuldades da maior crise sanitária, económica e social que o país atravessou desde sempre. Essa questão foi completamente ignorada, quer nos debates, quer nas perguntas aos líderes em ações de campanha. Limitavam-se a ser «pés de microfone» e a alimentar o tal pensamento normalizado. Destaco, o grupo Impresa, o Público e até o JN. Basta recordar os títulos (mal) produzidos na campanha. Então aquele de que Pedro Nuno Santos tinha ignorado e virado as costas a António Costa, foi de gritos. E depois…o CDS. Foi um ar que lhe deu! E o imberbe Xicão bem pode «agradecer» a ele próprio – incapaz, mal preparado e sedento de poder – e ainda um agradecimento especial ao PSD, ao BE e ao PCP por terem chumbado o OE. Se não fosse a crise, ainda lá estariam os «passageiros do táxi». Só lamento a desconsideração pelo prestígio do Professor Adriano Moreira.

Agora, com a «maioria absoluta» que muitos vão continuar a menorizar e a complicar – introduzindo infantilmente o fator Marcelo Rebelo de Sousa – talvez se possam redimir, admitindo a espantosa visão e a determinante capacidade de combate de António Costa, capaz de uma inédita «maioria absoluta» depois de 6 (seis) anos de governação intensa para recuperar um país saído das trevas em 2015. 



Da Web...

António Bondoso

Jornalista – CP nº150 A.

Janeiro de 2022.

2022-01-22

ALGUMAS FIGURAS DA MINHA VIDA. 

Apresento-vos hoje o HELDER FERNANDO, um companheiro que é um resistente nos princípios e valores da justiça democrática…e que ainda respira e transpira «informação e comunicação» por todos os poros da vida. 



Ouvi a sua voz à distância – um traço entre Porto e Lisboa – estava a (re) nascer a Democracia Portuguesa em finais da década de 70 do século XX e tinha eu vindo de S. Tomé e Príncipe e ele de Moçambique.

Mas o clima, talvez o PREC ou ainda e de novo a aventura de saber outros lugares, colocaram a «rota de Macau» na vida de HÉLDER FERNANDO nos primeiros anos da década de 80. Foi lá que o «conheci» pessoalmente já no último lustro do século XX, na Rádio e no semanário A Tribuna de Macau. Um tempo atribulado, inquieto, a caminho da Administração Chinesa do Território, depois de uma «presença» portuguesa de mais de 400 anos. 



1 – Helder Fernando. África e Ásia, ano após ano, e agora o repouso na ponta ocidental da Europa. Tanto mundo, Helder! Sempre com a Rádio na «bolsa» do coração?

*** “Sim, sempre com a rádio no coração em tempos e continentes diferentes, tentando acumular concepções, orientações e até motivações vividas, inclusivamente opostas. A partir de 1983 até 2015, a palavra escrita complementou a radiófonica, nenhuma sendo eco ou emenda da outra”.



2 – Foste sucumbindo às mudanças? Reagiste? Ou conseguiste sempre condicionar e limitar a «moldura» de cada lugar?

*** Sucumbir no sentido de não poder resistir ou ir-me abaixo em forma de negação, naturalmente não - até pela razão do apoio à essência real do que motivou essas mudanças: a opressão, a ditadura, a usurpação territorial. O que levou, como sabemos todos, à Revolucão do 25 de Abril, seguida da democratização do regime, à descolonização e à transferência da administração portuguesa em Macau para a RPC, por exemplo. Com as indecisões, erros, avanços compridos e recuos demasiados que cada um de nós pode interpretar como entender.

### Mas foste e tens sido um «resistente»…

*** Sim, resisti e resisto com o que pude e vou podendo, contra a obscuridade mesquinha e velhaca dos que se artilham pesadamente, agora já com poucos disfarces, contra o regime  democrático, minando-o em cada sector, diabolizando-o em cada palmo de terreno; tal como fizeram e fazem contra tudo o que seja a dignificação e justiça social, embora bolsando o contrário. Com impudentes palavrinhas mansas, falsos modernismos de fancaria ou patética gritaria boçal, é como alguns bem instalados vão tentando convencer os mais distraídos.

Com os meios ao alcance, em jornais e na rádio, fui vivendo décadas de algum ativismo por um lado, e denúncia por outro. Uma reportagem no local, pode valer mais que mil discursos; uma entrevista bem dirigida pode ser mais esclarecedora que muitos debates. Meio século percorrido profissionalmente na denominada comunicação social, 10 anos em Moçambique, 8 em Portugal e 32 em Macau, senti-o, como tantos de nós, com picos de enorme responsabilidade e emoção indescritíveis, e momentos assaltados pela dúvida, pela desilusão, pelo quase abalo.



3 – A Rádio sobretudo, a comunicação, a escrita, a palavra, o Jornalismo, a imagem, mensagens com muito conteúdo são memórias boas!

*** A experiência de, na rádio,  integrar a cobertura em direto da Independência de Moçambique, na circunstância longe dos palcos principais, colocado numa carrinha-rádio, nos subúrbios de Maputo, juntamente com uma repórter moçambicana formada num país de Leste, e um motorista, tentando retratar as reações populares longe da pirotecnia barulhenta, luminosa ou discursiva no estádio da Machava onde descia uma Bandeira e subia outra, foi das mais marcantes lições humanas e profissionais que recebi. Tal como, logo posteriormente, as múltiplas iniciativas espontâneas e oficiais que acompanhei. Guardo que foram as 'molduras' mais significantes que vivi e relatei. 



4 – E em Macau, na Transferência de Administração… Acompanhámos/Vivemos as cerimónias juntos nos estúdio da Rádio Macau. Emoções fortes…

E o tempo depois? Correspondeu às expetativas?

*** Exatamente.  Duas dúzias de anos depois, a oriente, a mesma Bandeira descia para outra definitivamente subir. Apenas as particularidades fundamentais foram semelhantes. Nos contextos históricos, bastantes diferenças; a 'questão de Macau', as variantes do relacionamento Portugal-China foram factores que  estabeleceram e estabelecem outros olhares, naturalmente alguns outros sentires. A emoção do relato do momento e dos momentos posteriores, foi grande, mas a coreografia da alegria obedeceu ao estético vigente. Ambos vivemos esse histórico virar de página. Muito mais rico foi o experimentado tirocínio dos anos seguintes: ver, escrever e falar sobre o desenvolvimento da região, acompanhar  a quase completa transformação, organização social e administrativa de Macau. Com curvas apertadas, travagens, derrapagens, decisões críticas, mas imparável modernização.

5 – E em Portugal, Helder, voltando um pouco atrás…ainda há mensagens de conteúdo que «passem» nos média portugueses?

*** Na comunicação social em Portugal a preocupação com o rigor já teve melhores dias. Com as pontuais excepções conhecidas, jornais e audiovisuais atropelam-se na constância dos lugares-comuns, na confrangedora falta de memória, no seguidismo de modas e vassalagens. Estão com dificuldades financeiras e vão definhando e morrendo. Sobretudo perdendo credibilidade. 'Jornais de referência' é praticamente coisa do passado. Preocupante a imensidade de jornalistas a salário mínimo ou estágios sem receber, com carência de crítica profissional, maltratando o nosso idioma, ofendendo a deontologia, alguns cheios de maneirismos envaidecendo-se com os holofotes, a fatiota e o penteado, balbuciando textos copiados e colados, de canal para canal, de jornal para jornal, desbaratando os benefícios da era digital. Não fosse alguma imprensa regional respirando cultura e sentido ético, juntamente com um punhado de profissionais ainda resistentes, e uns poucos que vieram dar ao jornalismo a dinâmica e a clareza com o tecnicismo destes dias, mais um reduzido número de analistas e opinantes estudiosos e competentes, independentemente dos pontos de vista, e já nem valeria a pena olhar para os títulos pendurados num quiosque, ou saber das notícias para além das que nos chegam ao minuto, ao telemóvel.

Será bom lembrar que, apesar do universo da nossa Língua ser relativamente reduzido em Macau, e apesar de outras dificuldades, os jornais de língua portuguesa ali publicados são profissionalmente muito mais eficazes, capazes e indispensáveis do que muita imprensa entre nós.



6 – E os livros? E a Poesia? Companhia permanente, sendo tu um homem de Cultura. Há uma «Literatura» pujante em Portugal?

*** Felizmente os nossos poetas e prosadores em atividade prosseguem encantando-nos, pensando connosco e desbravando-nos caminhos. Na ficção mostrando-nos realidades, na poesia suscitando-nos paletas para meditar, no ensaio perspectivando a nossa reflexão. As comunidades de jornais na internet, alguns muitíssimo bem conseguidos, mais os bloggers e diferenciados autores de posts, por vezes podem mostrar-nos prejudiciais farrapos disparatados mas, por outro lado, consumindo com critério as novas estradas tecnológicas, temos muitos exemplos que nos habituam à rapidez de reflexão, a conjuntos de concepções e ideias não imaginados, a propostas de terminologias novas, sobretudo extensa pluralidade com carácter de urgência.



 

6 – Não me esqueço – como poderia – da (con) vivência com Estima de Oliveira. Tu e ele foram figuras decisivas na minha aventura da Poesia, com aquele EM MACAU POR ACASO (1999) …

*** Mesmo estando desativado profissionalmente, sinto a felicidade de ainda conviver,  não tanto como gostaria, com artistas, poetas e prosadores africanos, europeus e asiáticos. No necessário enquadramento social destes dias, faço por mantê-los como minha companhia,  consumindo o possível do que escrevem, dizem, pintam, tocam,  enfim constroem cultura nas variadas polissémicas e metafísicas. Para personalizar o primeiro exemplo, permite-me sublinhar que, mesmo à distância, vou acompanhando a tua atividade literária, António Bondoso, muito ajudado, é certo, pela generosidade que possuis. Ou a exemplar e pujante criatividade do poeta e prosador António Correia, que por Macau, Ceará, ou da sua Casa da Poesia em Resende, nos enche a alma de palavras mágicas. Como, também, o poeta e médico José Brites Inácio que, como observas, camarada, nas tuas Palavras em Viagem, ‘canta as belezas da vida e do Douro’. Como António Conceição Júnior, luminoso artista de tantas artes e da palavra profunda, o mais portuense de todos os portugueses do oriente. Ainda como o nosso querido Alberto Estima de Oliveira que por Angola, Macau e Portugal nos inundou de multiculturalismo, de genial visão do mundo, de poemas inesquecíveis, obra literária que tanto marcou e marcará tantos; mesmo não morando por aqui, o Alberto habita bem presente nas leituras, nas memórias, nos estudos académicos sobre o que escreveu. A palavra poética dele também inspirou o virtuoso violinista Carlos Damas, com concertos por todo o mundo, que morou em Macau, e que por volta de 1999, comigo se juntou em estúdio, para o registo formal desses encontros quotidianos da palavra.

Para mencionar ao de leve apenas alguns amigos comuns, ficando imensos por referir. 

### Claro que sim. Sei que o teu «arquivo» é imenso. Mas agora é o Algarve…O Algarve para descanso do espírito e nova oportunidade de conhecer «o Puto»…e de provar e saborear um excelente Terras do Demo.


Helder Fernando – de Moçambique a Macau, onde o conheci na Rádio. Por ali trabalhámos juntos, não me esquecendo de que ele valorizou – dando-lhe voz – o meu projeto “MACAU – O ORIENTE DA HISTÓRIA”, uma série de 31 programas que passaram em muitas rádios locais em Portugal, nesse ano de 1999.

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António Bondoso

Janeiro de 2022. 














 

2022-01-10


ALGUMAS FIGURAS DA MINHA VIDA - JOSÉ CUNHA SALGUEIRO


Foto A.B. 

 Em Moimenta da Beira, não há quem não conheça e respeite o Zé Cunha Salgueiro, nem que seja pela «alcunha» de que não gosta mesmo nada.

Sendo ainda adolescente, sei que me «acompanhou» desde que nasci em 1950. Ali no Largo das Cinco Ruas, amigo da família, particularmente de meus pais, sendo a minha mãe – por via do casamento da irmã Clementina com António Salgueiro – portadora dessa proximidade. E depois a vizinhança e esse convívio saudável de um dos pólos da Vila. Das Cinco Ruas ao Terreiro e ao Convento eram apenas umas dezenas de metros. Mas era o centro de uma animação permanente, vivida com imaginação – a grande fortuna de então. O «Tio Zé» recorda com satisfação os bailes de então, não esquecendo a brincadeira que era a preparação dos bonecos tradicionais de compadres e comadres, elaborados em segredo, e que, depois, rapazes e raparigas procuravam defender a todo o custo, face à investida dos «grupos» rivais. 


Foto A.B.

E depois…outras memórias que me levam a recuar aos tempos do «Nubal», “prédio” que confinava com o Arrabalde e era cuidado pelo “tio António e pela tia Clementina”, e sobretudo à «sapataria do Manel» (da Canoa) onde ele me aturava com muita paciência. Digo eu, claro. Mas, só por isto, o «Tio Zé» merece ser uma das “Figuras da minha Vida”.

Prestes a completar 87 anos de existência, José Cunha Salgueiro nasceu na Rua da (Casa da) Moimenta, sendo um de 7 irmãos – 6 rapazes e uma rapariga – dos quais tive uma relação mais próxima com os saudosos António, que já referi, e com o Eduardo, que marcou uma época no «Grémio» e, mais recentemente, foi uma figura central da “Feirinha da Terra”, tendo sempre a seu lado a «tia Alcinda».

Com o Eduardo trabalhou no Grémio, tendo colaborado com a Junta Nacional dos Vinhos numa altura em que se exportava para a Rússia e para o Brasil, sem esquecer a Casa do Povo – ali ao lado da Biblioteca – onde se jogava ping pong e dominó e onde havia uma escola de música e se podia ver cinema por iniciativa de João Gonçalves, tudo isso antes de terminar na Segurança Social até à idade de aposentação em 2005, os anos de uma grande satisfação. Depois da reforma sobrou o cultivo dos campos, uma atividade que hoje começa a «pesar» na idade mas que ele se «recusa» a deixar de lado. 


Foto A.B. 

Mas a minha «memória» tem mais a ver com o tempo em que José Cunha Salgueiro trabalhava na sapataria do «Manel», no Terreiro, onde eu – com 6 e 7 anos – me divertia a «martelar» taxas e pregos no soalho e a utilizar um poderoso «íman» para arrebanhar os que sobravam. Era um «mestre» nessa arte de «rapina», manobrando com entusiasmo o íman, numa espécie de ondulação à direita e à esquerda. O tempo que ali passava, extremamente rápido apesar de ser extenso, era feliz. Não só graças à compreensão do Sr. Manuel mas sobretudo à atenção dedicada do «tio Zé». Apesar do trabalho de «moldar» o couro, de fazer da farinha um tipo cola tudo, de implantar as «meias solas» ou os «tacões» com zelo e precisão, o tio Zé tinha a paciência para me explicar o «processo». E pelo meio, ia mostrando exemplares do jornal O PORTO, de que era assinante. Ainda hoje mantém no sótão muitos dos jornais desse tempo. Devo recordar que ele não estava sozinho na sapataria: tinha a companhia do Toninho do Pote e do Zé Raposo.

Mas uma legítima busca de melhores condições salariais levaram o tio Zé para outras tarefas, de que já falei, seguindo-se o casamento com a «tia Isaura», descendente da família dos Correia Alves e Requeijos. Tinha 24 anos e a boda, preparada pela mãe da D. Virgínia – mulher do Beto Varandas – coincidiu com o Domingo de Ramos de 1959. A festa rija teve ainda o condimento de acontecer no dia em que se decidiu o campeonato de futebol nacional, uma jornada marcada pelo «caso» Calabote. O tio Zé acrescentou à festa o relato do futebol, ideia que não caiu nada bem em alguns «representantes» da Igreja – uns padres de Braga que se encontravam em Moimenta e que resolveram criticar o «excesso» da festa em tempo de “Quaresma”. O tio Zé e a tia Isaura são pais de duas filhas, a Ana Maria e a Luísa Salgueiro, avós de 3 netos e já bisavós. É esta figura que eu hoje homenageio simbólica e singelamente. 



De José Cunha Salgueiro, que faz o favor de ser muito meu Amigo, se pode dizer ainda que o respeito e a consideração que foi granjeando, se têm vindo a refletir até nos convites para uma envolvência política, ora se apresentando como candidato à Assembleia Municipal, ora como candidato à Câmara – como foi o caso das recentes eleições autárquicas de 2021, nas listas do Partido Socialista. 


Aqui lhe deixo um forte abraço e votos de muita saúde para poder continuar a fazer o que gosta, trabalhar no campo e conviver, esperando eu poder manter a sua amizade e continuar a receber ensinamentos sobre a poda das árvores de frutos. Obrigado Tio Zé. 



António Bondoso

10 de Janeiro de 2022. 









2022-01-07

SOBRE MÁRIO SOARES…
…haverá sempre uma efeméride para celebrar, lembrando as lutas pela LIBERDADE!



         Sabe-se que Mário Soares não foi uma figura de relacionamento fácil e que preferiu sempre a frontalidade. Não deixou de alinhar em consensos – quando o país lhe pediu – mas foi sempre um homem de ruturas. Inclusive no interior do seu próprio partido e certamente na sequência das muitas dificuldades que atapetaram o seu percurso de vida, uma luta permanente pela liberdade – contra a ditadura! Por isso esteve preso, foi torturado, deportado e exilado. O que venho aqui dizer não é novo, talvez mesmo insignificante, mas fica registado mais uma vez.
         Dele ouvi falar em 1968, em S. Tomé, para onde foi deportado em Março desse ano sem culpa formada, depois de ter sido preso várias vezes. Ali, foi até impedido de dar explicações aos filhos do Secretário da Câmara, Aprígio António Malveiro, acontecendo que Maria Barroso foi igualmente impedida de exercer a atividade docente – como eu recordo no meu livro ESCRAVOS DO PARAÍSO (2005)


“Ninguém podia falar com ele porque a polícia não deixava, eu até tinha medo mesmo de ver a varanda de casa dele”, disse à LUSA (2014) Ângelo Carneiro, 76 anos, um dos poucos são-tomenses que conheceram de facto o então advogado oposicionista de Salazar. (…) Eu passava lá, era ainda no tempo da PIDE. Eu era jardineiro na casa de um branco que morava na marginal, perto do museu”, recordou Ângelo Carneiro. Com o passar dos anos ninguém ou muito pouca gente ainda se recorda de que Mário Soares viveu neste apartamento”, acrescentou.
O degredo, recordo ainda em Escravos do Paraíso, não mereceu a total concordância do então governador Silva Sebastião [que se avistava quase todos os sábados com Mário Soares], o qual achou a situação muito pouco própria – tendo em conta o elevado número de jornalistas estrangeiros presentes na Ilha, em consequência da trágica Guerra do Biafra.
         Um dos poucos brancos que mantiveram contacto com o ex-presidente foi Fernando Santos Mendes – mais conhecido por Fernandinho dos Angolares – um português de Viseu que foi para S. Tomé em 1952 e lá faleceu em 2013. A sua bisavó era natural de S. Tomé – Josefa Quaresma de Ceita – e os pais chegaram à Ilha nos primeiros anos do século XX. Fernando Mendes convidou Mário Soares para almoçar uma ou duas vezes e confessou-me não ter sido incomodado pela Pide.


Apesar de tudo, Soares teve a oportunidade de defender (pro bono) um funcionário da Alfândega acusado de desvio de bens. Um caso vulgar mas que, por toda a envolvência, acabou por ter grande repercussão na ilha. Julgamento de sala cheia, dizia-me o meu pai, que assistiu. E quando Mário Soares e toda a gente pensava na absolvição do réu, eis que a sentença produzida foi a condenação a 13 anos de prisão. Mário Soares, como eu escrevo em Escravos do Paraíso, nunca se havia sentido tão vexado na sua vida profissional, servindo-lhe apenas de consolação o facto de a sentença ter sido depois anulada pelo Tribunal da Relação de Luanda. Ficou, assim, patente aos olhos de todos, que a sentença tinha sido “dirigida politicamente” a Mário Soares.    


Foi com ele que a política se afirmou nos meus ouvidos e na minha consciência, sobretudo pela sua atitude e foi particularmente a sua combatividade que me motivou (ainda antes da Ala Liberal de Sá Carneiro e de Pinto Balsemão). Muitos anos depois tive o privilégio de o acompanhar na Presidência Aberta em Viana do Castelo (vindo-me à ideia o seu contacto com os pescadores e a simplicidade de um almoço informal de arroz de cabidela do qual não esqueço alguns pormenores curiosos); com ele me cruzei de novo em Macau, na inauguração do Aeroporto, e acompanhei a sua viagem a Tóquio, já no âmbito da sua presidência da Comissão Mundial Independente Sobre os Oceanos (1995-1998) que Mário Ruivo dinamizou por indicação da ONU. Mais recentemente, tive a oportunidade de lhe oferecer em Moimenta da Beira dois dos meus livros: "DA BEIRA! Alguns Poemas e Uma Carta Para Aquilino", o Mestre que ele admirou, como se sabe, e SEIOS ILHÉUS - como que uma recordação simbólica do tempo que passou em S. Tomé.



Mário Soares – um combatente pelas liberdades. E por isso foi escolhido para presidir à Comissão de Liberdade Religiosa no tempo de José Sócrates no cargo de 1º Ministro: "A vida pessoal e política de Mário Soares habilita-o a qualquer tarefa que tenha a ver com a liberdade e muito mais com a liberdade religiosa, que é um dos pilares das sociedades democráticas modernas”. MÁRIO SOARES respondeu: " Sou neutro em matéria de religião, mas reconheço a importância da religião e das Instituições Religiosas, particularmente no mundo conturbado de hoje, com o exacerbamento dos fanatismos religiosos. SOU AMIGO DE TODAS AS LIBERDADES"!
Um Homem a quem a Democracia Portuguesa e os portugueses ficam a "dever" uma importante quota-parte. Manuel Alegre, com quem se incompatibilizou nas presidenciais de 2006, acaba de classificar Mário Soares como “o construtor principal da democracia”.Como disse, nem sempre foi de relacionamento fácil. Apesar disso, outras figuras como o ex-presidente Ramalho Eanes dizem ter “uma grande consideração por Mário Soares enquanto batalhador pela democracia”, embora não tenha estima pessoal. Simultaneamente, embora possa parecer um paradoxo, foi um homem de afetos e cultor de amizades. E um homem de Cultura, muito à semelhança dos oito presidentes da Iª República. Que pensou o mundo e sobre ele escreveu muito, como se pode verificar pela extensa bibliografia. E que amou a Poesia e grandes Poetas – como é exemplo a seleção que José da Cruz Santos editou para o jornal Público. E esse poema para a mulher, Maria Barroso – trave mestra da sua estrutura familiar e cuja perda lhe terá acelerado o caminho para o final desta sua passagem. Poema escrito na prisão do Aljube em 22 de Fevereiro de 1962:
PARA TI, MEU AMOR
Para ti,
Meu amor,
Levanto a voz,
No silêncio
Desta solidão em que me encontro.
Sei que gostas de ouvir,
A minha voz,
Feita de palavras ternas e doces
Que invento para ti
Nos momentos calmos
Em que estamos sós.
Sei que me ouves
Agora
- Uma vez mais –
Apesar da distância
E do silêncio.
O amor,
Querida,
Opera esse milagre,
Simples,
Como tudo o que é natural:
Ouvir,
Bem no fundo do coração
As palavras não ditas
Mas sentidas;
Adivinhar,
Bem ao nosso lado,
A presença,
Insubstituível e certa
Do ausente
- Presença inconvertível
Em ausência,
Por maiores que sejam a distância
E o silêncio!
  
E depois há todo esse caminho que levou ao 25 de Abril de 1974 e à consequente descolonização – tardia e, sobretudo por isso, atabalhoada e traumática para os atingidos. É um tema complexo ao qual voltarei a dar especial atenção, tendo em conta particularmente o que vem sido dito e escrito – quantas vezes de forma mais emotiva do que racional, quantas vezes disparando em várias direções – com desconhecimento e com disparates, sem preparação de análise das conjunturas nacionais e internacionais nas várias épocas em perspetiva. Acusações infundadas e demagógicas a Mário Soares há de sobra. Só valem as que se reportarem à sua luta pela liberdade no seu país, contra a ditadura. Há muitas outras figuras de maior responsabilidade – como são Salazar e Caetano, que não perceberam o espírito do tempo; depois Spínola e Costa Gomes a juntar à Coordenadora do MFA. Como disse Melo Antunes – ideólogo maior do Movimento – “o processo de descolonização foi das coisas mais difíceis, mais dramáticas e mais trágicas que aconteceu em Portugal. Sei que se cometeram erros e assumo as minhas responsabilidades”.
António Bondoso
Jornalista
7 de Janeiro de 2017.














2022-01-06

UM TEMPO IMUTÁVEL...de promessas imutáveis.

Foto de António Bondoso
 

De um final de ano na modesta simplicidade de desejar pouco para mais um ano complexo, seguiu-se uma viagem às «origens» com a mesma estrada, mas um tempo diferente, apesar da imutável paisagem interior que nos modifica os silêncios.

E nem os gritos da vontade conseguem furar a barreira do isolamento, mesmo que se alarguem as promessas em tempo de eleições.

É que, segundo sei…

«O corpo só por si

Não regenera.

É dependente

Da mente

Enquanto espera».



Foto de António Bondoso

António Bondoso

Janeiro de 2022. 


 

2022-01-04


PROSSIGA O ESPETÁCULO.

ENTRE OS DEBATES E A PROPAGANDA…temos ainda a demagogia e a inclinação de interesses «ideológicos» dos moderadores e comentadores. E depois, uma questão essencial:

OS DEBATES – SOBRETUDO TELEVISIVOS – AINDA INFLUENCIAM DECISIVAMENTE O ELEITORADO?


Da Web

Não estou seguro de que isso aconteça a uma escala significativa, ao contrário do que ouvi dizer, embora admita que esse tipo de «eventos», particularmente «a dois», possa moldar as ideias de alguns eleitores. E os «comícios» também já não mobilizam como antigamente. Já lá vai o tempo em que despontavam figuras como a do «Carlitos», que o antigo Presidente da AR – Fernando Amaral – recorda de forma sublime nas suas “Recordações Menores”. Em nome da juventude, o «Carlitos» havia preparado uma intervenção para abrir o comício. Mas…lidas as frases, Fernando Amaral constatou que a sua leitura duraria apenas 30 segundos. Carlitos – eu pedi pelo menos 5 minutos! E veio a surpresa: - “e as palmas! E as palmas”! Fernando Amaral foi apanhado por muito mais de cinco minutos, tantas haviam sido as palmas para a intervenção mais aplaudida do comício. De facto, não havia contado com as palmas.

Com a penetração diversificada do que chamamos de «redes sociais», quase me atrevo a dizer que a TV – apesar de todo o seu poderio com a imagem – está hoje para as redes sociais como a Rádio, há já muitas décadas, tem estado para a TV. Isto…sou eu a pensar, claro!

É preciso encontrar novas formas de chegar aos eleitores? Claro que sim. Mas, insisto, não me parece que o caminho seja apenas através da TV. Os debates, por muito que digam alguns «especialistas», estão carregados de demagogia. E, sinceramente, creio que os eleitores sabem distinguir a demagogia da razão. E depois…as palmas! Faltam as palmas! Só se tivermos em consideração que elas virão dos analistas e dos comentadores. Pode acontecer. Mas ainda é válida a ideia de que não se pode enganar toda a gente o tempo todo.

Aqui chegados, há essa perspetiva que mereceu alguma atenção nos últimos dias: - primeiro o documento dos 31 e as “esquerdas”. Hoje, a Carta por uma “esquerda plural”, subscrita por 100 personalidades sem filiação partidária. Depois da farsa que foi o voto contra o OE, como se pode vir agora apelar à «coragem da esquerda para um compromisso», se alguns dos protagonistas – sedentos de “contar espingardas” ou “receosos de perder a força das ruas” – torpedearam a legislatura devido a «leituras» enviesadas a respeito de um OE de elaboração cuidadosamente responsável? Não faz sentido. E, sinceramente, o que me parece enformar a ideia é ir «torpedeando» o eleitorado no sentido de penalizar o PS, retirando «peso» a uma eventual – mas provável – vitória nas eleições de 30 de Janeiro. Tentando evitar, embora agitando, o «fantasma» de uma maioria absoluta – muito pouco provável – o BE e o PCP, em mais uma «maioria inquinada» com o PSD, CDS, IL, PAN, PEV, etc…parece apostarem mais numa maioria de direita no próximo parlamento.

Isto…sou eu a pensar, claro!

Bons debates e que prossiga o espetáculo. Viva o «Infotainment”! 


Foto de António Bondoso

 

António Bondoso

Janeiro de 2022