2014-07-01

DISCUTIR A LUSOFONIA…E PARTICIPAR NELA, FRUINDO OS BONS SINAIS QUE NOS CHEGAM DA “SOCIEDADE CIVIL”. 


         O CEMD – Círculo de Escritores Moçambicanos na Diáspora – fez editar a sua ANTOLOGIA UNIVERSAL LUSÓFONA, em 2014, tendo a felicidade de encontrar um título abrangente e sugestivo [Rio dos Bons Sinais] e, para além disso, a beleza de cores e de significados que abraçam os povos lusófonos, expressa na capa e na contracapa de um volume de valores e de afetos com mais de 200 páginas.
         Rio dos Bons Sinais, lê-se ali, foi o nome que Vasco da Gama deu ao rio que o levou a Quelimane, no dia 24 de Fevereiro de 1498, a caminho da Índia.
         Rio dos Bons Sinais, digo eu, termina num “delta” de 54 autores que dão vida às águas de muitas vivências, de muitos afetos, de muitas dores que – ao longo de séculos – deram forma a estados de alma divergentes, polémicos, violentos…mas também de alguns afetos partilhados.
         Rio dos Bons Sinais, digo ainda eu, foi capaz de – sem esquecer uma parte – valorizar a outra que abre os caminhos do futuro. E, sem preconceitos, destacar a universalidade lusófona da obra, incluindo igualmente autores de origem espanhola.
         O prefaciador da obra – Rodrigo Sobral Cunha – diz, por sua vez, sentir-se em casa tanto na Ilha do Sal como em Sintra, “onde o mar ondula com fera/ Alegria/ E a rocha doira a fina harmonia/ - É nas praias vastas da/ Lusofonia”.
         E explica: «No princípio de todas as coisas eram os sinais». E quando os homens puderam perceber nas águas cheias de vida e de música o reflexo de Deus, «igual em baixo e em cima», Deus sorria. «Homens e mulheres sorriam assim com Deus e falavam por isso a linguagem de todos os seres». Até que um dia chegaram os «Caraveleiros do Amor e disseram: este é o Rio dos Bons Sinais. E disseram palavras – segundo Sobral Cunha – como estas: «cristal líquido, pura música, árvores santas, gente bela saída da terra negra com o sorriso de Deus». E pensando que vale a pena contar este «lado das coisas», escreve: «Tudo isto se passou no começo de um mundo donde saíram as palavras que chegaram, por milagre, até aos livros. São palavras como as que saem dos teus lábios sagrados. Há quem se lembre de tudo completamente e sempre que isto acontece faz-se um sinal na lusofonia. Já não é segredo: os seres da manhã do mundo guiam-se por estes sinais».
         Há quem não goste e conteste. Com toda a legitimidade, claro! Mas, tal como a universalidade de uma língua já falada há oito séculos – não sendo hoje apenas dos portugueses, mas de todos os povos que dela se servem – é incontornável que os sinais sejam intemporais. E o rio que deles emana, sendo eterno, vai-se alargando e ensinando as palavras da música pura, em baixo e em cima das águas, sorrindo com Deus.
         A lusofonia, volto a dizer eu, é o «projeto mais aliciante deste século, em termos de construção política internacional”.
         Por isso é que eu, nascido em Moimenta da Beira e crescido e vivido em S. Tomé e Príncipe, escrevi em MARE MAGNUM… que “foram navios de vidas/ Soldados de muitas pátrias/ Escravos de tanto mundo/ Que o mar levou ao fundo”.
         E por isso é que o Delmar Maia Gonçalves, nascido em Quelimane – ali bem perto do Rio dos Bons Sinais – sendo ele «Nem mais nem menos»…escreve que «E sou um nómada/ Um pássaro livre/(…)E sou um inconformado/ Descomprometido/(…) E estou louco como todos/ Mas viajo sozinho no tempo/ E sou um inútil/ Que procura ser útil».
         E por isso é que a Gisela Torquato Cosme, que nasceu em Luanda e vive em Lisboa, diz que «A vida tem mistérios/ Que nem todos os homens/ chegam a descobrir»…e Goretti Pina, que nasceu no Príncipe mas igualmente vive em Lisboa, escreve que, nas suas ilhas, há «Dias para serem contemplados. (…) E há dias na minha terra,/ sequiosos de amanhãs!».
         Por isso é que Lopito Feijóo, que nasceu em Malanje e vive em Luanda – onde é presidente da Sociedade Angolana do Direito de Autor – diz que, acima de tudo, A POESIA! Ele que escreve «comprei vendi troquei as notas da esperança/ a jusante a montante e sei lá…/ empresário nunca jamais porém/ todavia contudo(…)».
         E por isso é que Lourdes Peliz, também nascida em Moçambique, escreve que todos temos uma missão: (…)«No gesto, na acção, na diferença e no seu efeito».  
         Por isso é que Vera Fornelos, nascida em Viana do Castelo e moçambicana de alma e coração, trocou a «Linha de Montagem» de uma fábrica pela liberdade de escrever – também poesia…e talvez por isso, do mesmo modo, a brasileira Valentina Sperb, de Porto Alegre, seja levada a escrever sobre a subida dos degraus: «Suba um por um,/ pois na vida é assim./ Se você se apressar,/ e subir de dois em dois,/ ou três em três,/ o tombo vai ser grande,/ e a dor maior ainda.»
         Dia a dia, ano por ano…façamos crescer as águas deste grande Rio dos Bons Sinais! Um abraço a todos, mesmo aos descrentes – quer por opção filosófica e intelectual, quer por ser politicamente correto dizer mal.
António Bondoso - 30 de Junho de 2014-  


António Bondoso


Jornalista.

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