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ABRIL PODERIA TER SIDO EM MARÇO…ou
de como os militares, em 1974, tiveram dificuldades em comunicar e se viram
envolvidos num fogo cruzado de informação e de contrainformação, envolvendo
oficiais oriundos da Academia e sendo outros milicianos.
Mas
o 16 de Março, garante Manuel Monge, não
foi um engodo de ninguém e muito menos do PCP. A operação desencadeada pelo
RI5, das Caldas da Rainha, tinha como objetivo primeiro reagir às anunciadas
demissões de Spínola e de Costa Gomes pelo regime de Marcelo Caetano.
Manuel
Monge diz sentir mágoa pela situação fortuita que levou ao falhanço do 16 de
Março, nomeadamente as hesitações dos Paraquedistas que – segundo ele –
eram incapazes de desobedecer à cadeia de comando e que, por isso, não deveriam
ter sido contactados. Foi um erro, diz o general Monge, apesar de as Ordens de
Operações apenas incluírem os Paraquedistas numa situação de “reserva”. Mas
garante que estava tudo preparado pelo Movimento dos Capitães, incluindo o
empenhamento de Otelo e de Jaime Neves, por exemplo e de outros elementos do
RI5 como Casanova Ferreira.
Contudo, Adelino de Matos Coelho – tenente
de infantaria à altura do acontecimento, que integrou a coluna das Caldas e que
viria a ser preso na sequência do fracasso – disse ao Centro de Documentação 25 de Abril, de Coimbra, que “…no dia 13, em Santarém e em
Lisboa, os tenentes (oriundos de cadetes) Rocha Neves e Moreira dos Santos, do
RI nº 5, participaram em reuniões destinadas à distribuição do “plano de
operações” de um golpe militar previsto para 14, o qual foi anulado.
Regressados de Lisboa, ao princípio da madrugada 14, os tenentes trouxeram esta
informação porque os pára-quedistas necessitariam de dez dias para preparar a
acção. Assim, ficámos a aguardar novas indicações.
Em ALVORADA EM ABRIL, Otelo Saraiva de
Carvalho descreve aquele plano, “elaborado no dia 11, em casa do major Casanova
Ferreira, com a participação de Monge, José Maria Azevedo, Geraldes, Luís
Macedo e Garcia dos Santos, parecendo uma brincadeira de garotos, cada um
atirava o seu objectivo para cima da mesa (…), tendo sido feito sobre o joelho,
sem força nem estrutura de qualquer espécie (…).”
Mas José Maria de Azevedo, então major –
recordo – apesar desta apreciação negativa de Otelo, havia estado na base do 1º
documento do Movimento dos Capitães. Já o próprio mo havia confirmado, mas
igualmente Vasco Lourenço o disse ao Centro de Documentação 25 de Abril a
propósito da reunião em casa de Marcelino Marques em Janeiro de 1974, e na qual
aparece Melo Antunes, que Vasco Lourenço não conhecia: “(…) o José Maria Moreira
de Azevedo que era um major, hoje coronel de Administração Militar que ficou
encarregado de elaborar um projecto e eu quero ir mais avançado, entrar já em
questões de natureza política e sou eu que o convenço e que digo. Nem pensar
nisso, tu tens que aparecer com um documento mais atrasado que aquilo que tu
queres e vais aparecer com um documento quase só com questões corporativas.
(…) E
aí o José Maria Moreira de Azevedo levou uma tareia por causa do documento
estar muito pró, que ele não queria. Bem, a certa altura irritou-se, atirou com
os livros ao chão - “Eu não estou para vos aturar, eu não quero saber mais nada
disto. Eu vou-me embora”. Eu puxei-o e disse: “Estás a ver que estamos a
atingir o que queríamos. Se tivesses trazido um documento mais avançado estavas
a levar tareia porque estavas longe de mais. Estás a levar tareia porque estás
muito aquém daquilo que a malta quer e agora vai sair daqui uma posição, vai
ser dado um salto qualitativo muito mais do que tu alguma vez imaginaste.” “Mas
não estou para vos aturar”. “Não, mas atingimos os objectivos e agora vais
ficar na comissão de redacção do próximo documento.” E ele. “Nem penses nisso!”
Mas acabou por ficar.”
Para
além do episódio com os Paraquedistas, Manuel Monge refere igualmente problemas de última hora com alguns dos
militares do CIOE de Lamego que não puderam tomar parte na operação. No
fim, acrescenta, acabou por assumir a responsabilidade juntamente com Casanova
Ferreira, tendo sido presos na Trafaria. Foram libertados na tarde do dia 25 de
Abril por uma unidade de Vendas Novas. Era para ter sido uma força do Batalhão
de Estremoz, mas foi preciso desviar esses militares para ajudar Salgueiro Maia
no Largo do Carmo.
Apesar
de tudo, Manuel Monge não sente desilusão com a sequência do golpe de 25 de
Abril, excetuando talvez o problema da
descolonização, cujo obreiro foi Melo Antunes, num período difícil da
Guerra Fria. Pior não era possível –
diz o gen. Monge – que não se esquiva igualmente a criticar o que chama de
infiltrações esquerdistas, nomeadamente da Marinha, cujo rosto mais visível era
o de Rosa Coutinho e que “nunca fez nada para o Movimento”. Por outro lado, o
já Movimento das Forças Armadas, apesar das tentativas de Spínola, não
conseguiu arregimentar o poder interventivo da ONU, ao contrário do que viria a
passar-se anos mais tarde com a sensibilização para a resolução do problema de
Timor-Leste.
E
sobre a União Europeia, o gen. Monge diz que a Organização sucumbiu atualmente aos
interesses do grande capital e da Alemanha, notando igualmente que há uma
gritante falta de líderes e de liderança.
A propósito do 25 de
Abril de 1974, quero ainda deixar um excerto de uma entrevista que o Coronel
Castro Carneiro deu em 2014 aos alunos do Instituto Multimédia do Porto Tomás
Cazaux e João Farpa, sob minha orientação. Castro Carneiro, que
aderiu ao Movimento dos Capitães em Angola, em 1973, foi o oficial encarregado
de distribuir as Ordens de Operações do golpe pelas unidades da Região Militar
do Norte (Lamego, Vila Real, Chaves e Bragança), a partir do CICA, no Porto.
Nessa entrevista, aquele oficial confessa que o sigilo era fundamental. Nem a
sua mulher sabia dos movimentos para que foi destacado. E destaca que o «golpe»
foi, de facto, um ato de desobediência.
António Bondoso
Jornalista
Abril de 2017.
(Versão actualizada em 2018).
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