Na ideia do «ditador» russo, a vegetar
entre psicopata e cleptocrata, a Ucrânia seria coisa para duas ou três semanas,
mas já lá vão quase cinco meses. Contudo, também ninguém pode garantir que o
objetivo – um dos – não seja mesmo esse: prolongar. Mas para avaliar isso temos
os «especialistas».
Eu, que penso por mim e não tenho qualquer «especialidade» – essa tive-a no serviço militar em “Transmissões de Infantaria” e foi um bico d’obra – só quero trazer à memória o seguinte: quando começaram os primeiros comentários e, depois, os relatos de alguns «enviados especiais»…fui à estante buscar “Correspondente de Guerra”, de John Steinbeck – uma edição de Livros do Brasil, de 1979. Curioso, neste livro de 260 páginas e que eu poderia «relatar» diacronicamente, é este parágrafo da «Introdução»: “Chamaram à Guerra Civil [Americana] a última guerra cavalheiresca. Pois aquela que baptizaram como a Segunda Guerra Mundial, foi certamente a última de todas as guerras globais. A futura guerra, isto se formos tão estúpidos que a deixemos rebentar, será a última de qualquer espécie. Ninguém sobreviverá para se lembrar seja do que for. E, se realmente formos estúpidos a esse ponto, não mereceremos, de qualquer modo, biologicamente falando, a sobrevivência.”
E depois, cronológica e diacronicamente, seguem-se os textos que o autor foi escrevendo, quer em Inglaterra, quer no Norte de África, nunca revelando os verdadeiros e precisos locais da sua «presença». A minha atenção recai num pequeno pormenor relacionado com a ideia feita de que a «História» não se repete. Numa crónica datada de 18 de Julho de 1943, algures em Londres, intitulada “Uma Sessão de Cinema”, o autor refere que a casa de espetáculos, tinha uma boa lotação de “soldados feridos, já em convalescença, mulheres do Serviço Militar em gozo de uma licença de horas, domésticas e operários cumprido o respetivo turno de trabalho. Na plateia, à frente, filas cheias de crianças que se apinhavam tão perto do palco quanto podiam”. À comédia do filme – Casei com uma Feiticeira – juntar-se-ia a tragédia da atuação de dez bombardeiros alemães: “Apenas um dos atacantes conseguiu passar, ziguezagueando e esquivando-se por entre a defesa. (…) Voava quase rasteiro quando passou por cima do teatro. Foi nessa altura que lançou as bombas. (…) O aviador inimigo…voltou a sobrevoar o teatro e despejou as peças sobre os escombros. (…) Esmagadas, feridas e mutiladas, as crianças atingidas foram arrancadas aos escombros e conduzidas ao hospital”. Infelizmente, nem sempre isso é possível, como temos vindo a constatar. Quando não são os próprios hospitais alvos de bombardeamentos de arrepiar.
Não há «guerras boas ou menos boas».
Todas são brutais e quase sempre criminosas. Como foram as da Coreia, da
Indochina, Vietnam, Afeganistão, Iraque, as chamadas coloniais ou de
libertação, as do realinhamento dos Balcãs, a das Malvinas, da Síria, da
Palestina ou as dos genocídios do Ruanda, Somália, Nagorno-Karabakh ou
Chechénia. E se formos mais atrás, infelizmente, não ficarão páginas por
preencher. Como não ficaram as publicadas por Fernando Farinha – lembrado como
o único repórter de guerra português – ontem falecido, com 81 anos de idade.
Conhecido pela cobertura da guerra
colonial em Angola, Fernando Farinha viveu em Angola desde 1952, iniciou
a sua atividade profissional no "Comércio de Luanda", escrevendo e
fotografando os movimentos dos soldados portugueses em todas as frentes de guerra,
entre 1961 e 1975.
Para acompanhar as operações dos
militares portugueses em território angolano, Farinha – que publicou mais tarde
também na revista «Notícia», frequentou um curso de comandos e outro de
paraquedistas. A guerra – qualquer guerra – exige muito! E magoa e dói sempre.
António Bondoso
Moimenta da Beira, 20 Julho
2022.
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