JOSÉ CONCEIÇÃO CASINHA NOVA recorda António Aleixo. Um livro de 2020 com plena atualidade.
Por agora, por muitos dias já antes e por tantos outros que vão seguir-se, as palavras repetidas soam a Guerra, invasão, urânio empobrecido, inflação, questões ambientais, cabaz alimentar, pobreza, solidão, terrorismo, o mundo globalizado e o multilateralismo.
E
hoje é o Dia do Teatro e ontem já foi o do livro português. Repesquei então a
minha leitura de um antigo meu professor de Literatura – José Conceição Casinha
Nova – algarvio de Burgau (1934), Vila do Bispo, que já deu mais de meia volta
ao mundo, partilhando comigo, por exemplo, memórias de São Tomé e Príncipe.
O livro, que tem mais de cem páginas preenchidas com muitas quadras e algumas sextilhas, fala de todos aqueles temas e tem um título que obriga a um compromisso de ação e de acutilância: “Recordando o Aleixo”.
Sem pretender entrar por caminhos comparativos – até pela distância dos momentos e dos sinais – este livro de Casinha Nova tem igualmente alguma crítica incisiva, embora também fale de amor, da capacidade de sonhar ou de dizer o que pensa.
E
apesar de ter sido escrito e publicado ainda antes da atual «guerra/invasão» da
Ucrânia (Setembro de 2020 com a Arandis Editora), a leitura levou-me a pousar
os olhos nesse tão antigo «urânio empobrecido» na forma de uma sextilha: “As actuais munições,/ com urânio
empobrecido,/ atenuam as distinções/ entre quem vence ou é vencido:/ Matam
todos por igual,/ o que é bem feito, afinal…”. O humor negro sobre a guerra
neste verso final de Casinha Nova, um tema que percorre outras quadras e
sextilhas de outras tantas páginas do livro, desde o «erro que foi a segunda
invasão do Iraque», passando pela triste guerra israelo-árabe até à água – um
recurso natural que pode vir a gerar conflitos: “ Por posse de águas potáveis,/ muita guerra vai haver,/ pois quem tem as
fontes de águas/ em seu solo as quer reter…”.
Críticas aos média, particularmente às
TVs, em temas como as guerras de audiência e a publicidade: «Se algo dá a televisão/ com uma certa
qualidade/ é para que o cidadão/ “engula” publicidade!...». E a qualidade
dos programas na perspetiva de quem vê: “O
espectador de bom gosto,/ quando vê televisão,/ sente vergonha e desgosto/ dos
programas que lhe dão!...”
E a liberdade de expressão comportando a verdade e a mentira. Para quê dizer o que penso e o que sinto, interroga Casinha Nova, (…) “ Se já mentindo convenço/ melhor que quando não minto?”. E é por aí, pelo caminho dos sonhos que não mentem, que o autor vai seguindo: “Ando permanentemente/ atrás de sonhos sem fim/ e é neste sonhar assim/ que minha mente não mente…”.
«Recordando o Aleixo», de Casinha Nova,
para não esquecermos a simplicidade da crítica mordaz. Como esta quadra sobre o
teatro: “Dizia Schopenhauer/ que quem ao
teatro não ia/ a toilette fazia/ sem um espelho p’ra se ver.”.
Março
de 2023.
António
Bondoso
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