ÁGUA - DIREITO [humano] FUNDAMENTA
Este tema da água vai ser notícia na Assembleia da República na quinta-feira, quando for votado o Projeto de Lei nº368/XII designado como "Proteção dos direitos individuais e comuns à água".
A propósito, começo a publicar um trabalho que elaborei em 2008 [todos os dados são referentes àquela data, interessando saber que Portugal só ratificou o TRATADO DA ANTÁRTIDA em 2009 e que essa ratificação apenas foi depositada em Janeiro de 2010] sobre a Antártida e ao qual atribuí o título de ANTÁRTIDA - O ÚLTIMO REFÚGIO. No conhecido continente gelado, recordo, encontram-se praticamente 90% das reservas de água doce do Planeta.
INTRODUÇÃO
Tendo em conta que o
“aquecimento global” é um tema que vem ganhando enorme relevância de há uns
anos a esta parte – sobretudo pelas ligações colaterais que influenciam a
política e a economia mundiais (não será um acaso da História a recente
atribuição do Nobel da Paz a Instituições e a Figuras das áreas da Ecopolítica
e da Investigação ambiental) – o Continente Gelado tem sido apresentado como a
“última fronteira” da exploração de recursos decisivos para a sobrevivência do
nosso planeta, mesmo sabendo que as “reservas” são diminutas.
Quer seja pelas difíceis
condições de vida, quer seja pelo óptimo campo de investigação científica – a
Antárctida tem conseguido ser protegida das ambições e agressões humanas,
graças a um entendimento internacional consubstanciado num Tratado (datado de
1959) que define o Continente como uma zona a ser utilizada unicamente para
fins pacíficos. No Atlas de Relações Internacionais, dirigido por Pascal
Boniface, diz-se que a Antárctida “fornece, portanto, o modelo perfeito das
relações internacionais pacíficas”. Contudo, recentemente, a Grã-Bretanha
reclamou, na ONU, direitos de soberania para extracção de reservas de gás,
minerais e petróleo – atitude de imediato contestada pelo Chile e Argentina.
Independentemente do
desenvolvimento deste problema, o trabalho vai tentar responder a uma simples
questão de partida: - será a Antárctida, para além da já referenciada “última
fronteira”, também o “último refúgio” da humanidade?
Com esse objectivo,
estabelecemos três capítulos, para analisar a história do continente e a sua
importância política e científica- consubstanciada no Tratado de Washington de
1959; fazer o enquadramento geopolítico da região numa perspectiva da
Ecopolítica – uma das fases da arquitectura da nova geopolítica que salienta a
globalidade dos direitos humanos e, por último, uma breve referência ao
pensamento português sobre a Antárctida – destacando as ideias de Soromenho
Marques, para quem a ecopolítica ultrapassa uma simples política de ambiente.
CAPÍTULO I
BREVE HISTÓRIA E
RECONHECIDA IMPORTÂNCIA
POLÍTICA E CIENTÍFICA
A poluição do ar e da
água tende a espalhar-se indiferente a fronteiras políticas. Por exemplo, o ar
contaminado pela explosão nuclear de Chernobyl deslocou-se para ocidente na
direcção da Suécia, França, Itália e Suiça. Uma camada de ozono cada vez mais esgotada
sobre o Antárctico, torna todas as pessoas vulneráveis à radiação ultravioleta
que provoca o cancro.
Louis Pojman –
Filósofo político.
A Antárctida – o último
continente a ser descoberto – tem uma área de 14 milhões de Km2 e
representa 10% da superfície dos continentes emersos. Outrora submetido a um
clima tropical, o continente está hoje praticamente coberto por uma enorme
calote glaciária, cuja espessura pode atingir 4700m, e possui 90% das reservas
de água doce do nosso planeta. E tendo em consideração os jazigos de ferro,
cobre, carvão, níquel, crómio, cobalto, titânio, urânio, zinco, ouro, prata,
platina e petróleo – é apontado como muito promissor o potencial mineiro da
Antárctida.
Um ambiente de temperaturas
negativas que podem atingir os 90º não é propício a formas de vida superior,
mas existem grandes quantidades de baleias, cachalotes, orcas, focas, pinguins
e aves marinhas – graças a uma rica ictiofauna e grande abundância de plâncton.
Contudo, a “presença” humana na Antárctida fez-se notar a partir de meados do
séc.XVIII, com as expedições de Lozier Bouvet e de James Cook, sendo que, hoje,
as mais de 40 bases “científicas” empregam cerca de quatro mil pessoas no Verão
e apenas mil no longo e escuro Inverno. Além disso, considera-se haver também
já um turismo polar – representado por cerca de 40 mil visitantes – o que não
deixa de ser uma preocupação ambiental, a par da “Rodovia do Gelo” (1632 Km para ligar duas
estações americanas), o aeroporto de gelo australiano com 4 Km e uma base inglesa com
habitações permanentes. A Inglaterra foi, de facto, o primeiro país a
reivindicar o “gelo” antárctico (após a IIª GM), seguindo-se a Nova Zelândia,
França, Austrália e Noruega. Chile e Argentina, pela proximidade, dão como
adquiridos e indiscutíveis os seus direitos, enquanto os EUA nunca reclamaram –
nem reconheceram – qualquer parcela do continente, eventualmente querendo
sugerir que não existe propriedade nacional na Antárctida. Curiosamente, o nome
da ex-URSS só aparece por ocasião do Tratado de 1959 (Washington), sendo um dos
12 primeiros assinantes. A partir da entrada em vigor do Tratado – 1961 – foi
proibida toda a actividade militar e ficaram congeladas todas as reivindicações
territoriais por 30 anos. Reconhecida a importância da situação, o Tratado foi
renovado em 1991, pelo Protocolo de Madrid, por mais 50 anos. Considerado como
exemplo de uma vontade de cooperação pacífica entre as nações do mundo, ao
designar o continente como reserva natural consagrada à paz e à ciência – o
Tratado desde cedo começou a ser violado: em 1962 registou-se um acidente com
um reactor nuclear dos EUA; em 1983,
a construção de uma pista de aterragem francesa destruiu
uma grande colónia de pinguins e, em 1989, aconteceu um grande derramamento de
crude, provocado pelo choque de um petroleiro argentino e outro peruano. E
agora, a GB reclama a possibilidade de extracção de reservas de gás, minerais e
petróleo, num raio de 350
milhas náuticas em frente ao território antárctico
chileno. Uma clara violação do Tratado, que o deputado chileno Jorge Tarud
classificou de grave, apelando à sua Presidente no sentido de convocar os
membros do Tratado Antárctico.
Pelo Tratado, que Portugal
ainda não aprovou*, o interesse científico da região sobrepõe-se aos económicos,
territoriais ou militares. O Antárctico é um observatório privilegiado para o
estudo do ambiente, medicina, biologia, zoologia e sismologia. E, apesar dos
elevados custos com a investigação científica, a Rússia dispõe de 7 bases (750
pessoas), os EUA três (embora a figura do “Atlas” refira 6 para cada) - qual
competição da “velha” guerra fria! – a Argentina seis, mas em ligação com a GB,
Austrália e Chile; o Japão duas e, depois, vários países com uma: França,
África do Sul, Índia, Alemanha, Polónia, Nova Zelândia e Ucrânia. Brasil, Peru,
Uruguai e China organizam regularmente campanhas oceanográficas, tal como
outros países europeus.
Compreender o sistema
atmosférico e climático mundial tem sido uma das tarefas mais activas, mas –
desde o Ano Geofísico Internacional em 1957 – já se elaborou uma nova teoria
sobre os fenómenos magnéticos e foram identificados mais de 200 minerais. Já no
início deste ano, o navio oceanográfico Polarstern identificou mil espécies nas
águas da Antárctida. Os 52 cientistas (de 14 países) a bordo, pretendem ainda
conhecer os efeitos das alterações climáticas na biodiversidade. São as
“viagens do censo” no terceiro Ano Polar Internacional.
* Viria a aprovar em 2009 e a depositar o documento de ratificação apenas em Janeiro de 2010.
OS OUTROS DOIS CAPÍTULOS SERÃO PUBLICADOS NA QUINTA-FEIRA.
António Bondoso
Jornalista
2014
Sem comentários:
Enviar um comentário