O MURO…NÃO CAÍU POR ACASO.
Ou de como a «Conferência de Imprensa» que os média (alguns) tanto têm vindo a
valorizar, não foi apenas mais um pormenor. A chamada CORTINA DE FERRO estava rota e cheia de caruncho. Desde a sua
tomada de posse, Gorbatchev sabia do «sacrifício» que o esperava e tinha noção
de que era inevitável.
Há
12 anos – por outro lado – quando escrevi o texto que segue, ainda não se
tinham registado factos que hoje são demonstrativos de que, afinal, a queda do
muro de Berlim e as suas consequências imediatas não constituíram o «Fim da História»
anunciado por Fukuyama. Os Estados Unidos desbarataram por mais do que uma vez o
capital conquistado (Adriano Moreira disse recentemente que “A maior ameaça atual é a incultura e a leviandade do Presidente dos EUA”),
a UE vai marcando passo a cada passo e a Rússia voltou a ser grande, como o
demonstram por exemplo os conflitos «Geórgia/Ossétia» e particularmente o da Ucrânia/Crimeia.
Mais recentemente, o reforço da sua posição na Síria. E depois, a esperada e
anunciada emergência da RP China e do seu projeto expansionista: África é
paradigma de uma visão universal que a liderança chinesa designa agora de iniciativa
«Belt and
Road» ou a «rota da seda do século
XXI».
Vejamos, então,
a minha «leitura» desse tempo distante, elaborada há 12 anos, como disse:
“Apesar
de ainda hoje serem visíveis algumas situações de conflito herdadas da chamada
“Guerra-Fria” – como por exemplo a divisão da Península da Coreia, o problema
de Cuba e a questão do Médio Oriente, particularmente entre Israel e a
Palestina – não tem sido possível estabelecer um consenso sobre os limites
temporais, causas e definição desse período.
No entanto, parece não haver dúvidas
sobre algumas características que marcaram significativamente quase toda a
segunda metade do Séc. XX (talvez não seja um acaso a designação corrente de
“Século da Guerra-Fria”, atribuída ao século passado): -- para além de um
confronto político, económico e tecnológico, a Guerra-Fria foi, sobretudo, um
conflito ideológico travado por dois Blocos, liderados pelos EUA – a Ocidente,
e pela URSS – a Leste. Os primeiros, numa tentativa de conter a expansão do
Comunismo e, os outros, na expectativa de derrotar o Capitalismo Demoliberal.
Bernard Droz e Anthony Rowley[1]
parecem situar o início do confronto no
seguimento da oficialização do plano Marshall (a guerra-fria cristalizou-se,
inicialmente, em torno do problema alemão para, rapidamente, adquirir uma
dimensão mundial) – atribuindo especial relevo à doutrina Jdanov ou dos
“dois mundos antagonistas” e à questão da Coreia. Este problema é também
mencionado por Maurice Vaïsse[2] - o ano de 1947 representa uma cisão – mas
refere já o que chama de “primeiras fricções”, aludindo nomeadamente à célebre
frase de Winston Churchill (já não exercendo o cargo de primeiro-ministro), em
1946 no Missouri (EUA) : “a cortina de ferro que, de Stettin, no Báltico, a
Trieste, no Adriático, caiu sobre o nosso continente”.
O ano de
1947 volta a ser uma referência no Atlas das Relações Internacionais, dirigido
por Pascal Boniface[3],
no qual se considera a “clivagem Este/Oeste” decomposta em dois grandes
períodos – a guerra fria (1947-1962) e a
détente (1962-1979), aos quais se sucederam dois períodos mais curtos: uma nova
guerra fria (1979-1985) e uma nova détente (1985-1989).
Para Boniface, apesar de se
apresentar globalmente o período de 1947-1989 como de “guerra fria” (foi tudo excepto uma guerra) – esse espaço temporal comportou,
efectivamente, duas etapas distintas : a guerra fria e a détente!
O complexo jogo de interesses,
inclusive a preservação da paz mundial, levou a que o confronto nunca se
desenvolvesse até ao extremo, ficando célebre o slogan de Raymond Aron “Guerra
improvável, paz impossível”!
Mas não se esgota aqui o leque de
opções, destacando Adriano Moreira[4]
cinco períodos na vida dessa “guerra que
só podia ser evitada pelo permanente equilíbrio pelo terror”:- entre 1945-1951 a dissuasão unilateral,
com o monopólio atómico dos EUA; entre 1952-1959 a dissuasão bilateral,
com a entrada da URSS no clube nuclear; a disputa cósmica entre 1959-1961, já
com o grupo dos cinco do Conselho de Segurança da ONU no “clube”; entre 1961-1975 a política de
co-responsabilidade, com os vários tratados de limitação das armas estratégicas
e a suspensão formal das experiências nucleares; e, por último, o período que vai da guerra das estrelas à
queda do muro, em 1989.
Resumindo, poderemos estabelecer a
Cronologia dos Principais Acontecimentos deste “confronto” como segue:
***
1945/1947 – A chamada Paz Falhada, em torno do problema alemão.
***
1947 – Plano Marshall e criação do Kominform (nova designação atribuída por
Estaline ao Komintern – a Terceira Internacional – Associação Internacional
Operária dos Movimentos Comunistas de todo o mundo).
***
1948 – Golpe de Praga e Bloqueio de Berlim.
***
1949 – Tratado da Aliança Atlântica.
***
1950/1953 – Guerra da Coreia.
***
1955 – Criação do Pacto de Varsóvia.
***
1956 – Crise do Suez e repressão soviética na Hungria.
***
1961 – Nova crise de Berlim e Construção do Muro.
***
1962 – Crise dos Mísseis em Cuba. (Juntamente com a efeméride anterior – os
momentos de maior tensão da Guerra Fria).
***
1963 – Instalação do “telefone vermelho” e Tratado sobre interdição dos ensaios
nucleares na atmosfera.
***
1964 – Guerra do Vietnam (envolvimento dos EUA).
***
1968 – “Primavera de Praga” e TNP (Tratado de Não Proliferação Nuclear).
***
1969 – Auge da “corrida espacial” (iniciada pela URSS em 1957 com o Sputnik)
com a chegada à Lua da Missão Apollo 11 – EUA.
***
1972 – Tratado SALT 1 sobre controlo de mísseis estratégicos.
***
1975 – Conferência CSCE em Helsínquia.
***
1979 - Invasão Soviética do Afeganistão, Descolonização da África Negra.
***
1980 - IIª Guerra Fria, com a ascensão de Ronald Reagan ao poder, nos EUA.
***
1985 – Nova Détente, com a Glasnost e Perestroika de Gorbatchev, na URSS.
***
1989 – Queda do Muro de Berlim e Fim da Guerra Fria.”
Para além de tudo isto, há igualmente outros
factos e acontecimentos que mereceriam destaque idêntico. Poderemos falar deles
em outra ocasião e num contexto apropriado, como por exemplo deste «affair» de
1952: “DC3 Affair” ou “Catalina Affair”.
[1]
História do Século XX – 3º Vol, pág. 141. Dom Quixote, Lisboa, 1991.
[2] As
Relações Internacionais Desde 1945, pág. 23/24. Edições 70, 2005.
[3] Atlas
das Relações Internacionais. Pascal Boniface (Dir). Pág. 22. Plátano Editora-
3ªedição, Lisboa,2005.
[4]
Teoria das Relações Internacionais, citada em www.iscsp.utl.pt/cepp. Consulta em
24/11/07.
E as consequências da queda do muro,
claro.
=
Desmoronamento da Cortina de Ferro
= Reunificação da
Alemanha
= Implosão da União
Soviética (URSS)
= Fim do Bloco de Leste
(Pacto de Varsóvia)
= Rússia
= Criação da CEI –
Comunidade de Estados Independentes
= Implosão da
Jugoslávia
= Guerra dos Balcãs
= Afirmação dos EUA
como Hiperpotência - «Polícia do Mundo».
=
O FIM DA HISTÓRIA E O ÚLTIMO HOMEM - Francis Fukuyama escreveu o “Fim da
História e o Último Homem” no começo da década de 1990 (publicado em 1992),
época em que o mundo atravessava uma séria crise ideológica. Depois de
aproximadamente 70 anos de avanços, o socialismo começa a perder espaço
político para a democracia e o capitalismo. O modelo capitalista, a democracia
e o liberalismo económico aparecem como a melhor alternativa de sobrevivência
para os países recém democratizados. Mais tarde disse que foi mal compreendido
pela esquerda e publicou em 2006 «Depois
dos Neoconservadores – A Encruzilhada Americana», no qual critica
fortemente as políticas de GW Bush.
Redemocratização
do Chile – Março 1990.
Realinhamento
político e económico dos países saídos da órbita soviética (à exceção da Coreia
Norte, Cuba e Vietnam).
Espaço
africano (Angola, Namíbia, África do Sul, Moçambique)
Retirada cubanos de
Angola – retirada sul africanos
Mas as «Guerras
civis» prosseguem
Democratização
dos PALOP (STP, Cabo Verde – inclusive na mudança do símbolo da soberania como
a bandeira – GB); tentativas de paz,várias, em Angola e Moçambique.
Crise
Asiática e Compasso de Espera no Movimento dos Não Alinhados – particularmente
após a implosão da ex- Jugoslávia – Índia, Indonésia e Egito.
Não
é tudo, mas é uma boa parte.
António Bondoso
Jornalista e
Mestre em R.I.
Novembro de
2019.
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