2020-05-05


LÍNGUA PORTUGUESA É MESTIÇA E TRANSPORTA VALORES...ou de como, velha de séculos, conseguiu impor-se no concerto das nações, sendo hoje reconhecida pela UNESCO que, em Novembro de 2019, ratificou em Paris o dia 5 de Maio como o seu Dia Mundial. Celebramo-lo este ano pela primeira vez, facto que merece uma nota particular para lembrar – como diz Adriano Moreira – que «a língua não é nossa. Também é nossa»! Exatamente porque ela se expandiu, chegou a ser «franca» no Oriente, mas também pela razão de ter recebido muito de línguas de outros povos com que nos fomos cruzando.
Por isso, a língua portuguesa é hoje ensinada em cada vez mais países, é falada oficialmente em nove e em quatro continentes e é talvez a quarta mais utilizada no espaço da Internet. É, ainda, a língua oficial de 260 milhões de pessoas e a mais falada no hemisfério Sul. 


No meu livro LUSOFONIA E CPLP – DESAFIOS NA GLOBALIZAÇÃO[1], Adriano Moreira diz que «a língua nunca é neutra, nunca é um instrumento neutro, seja ela qual for. A língua transporta valores. Simplesmente acontece que a língua portuguesa, a meu ver, tem mistura de etnias. Também é mestiça”!
Neste aspeto da irradiação global, quero também destacar o Professor Joel Mata, nas suas “Lições de História da Cultura Portuguesa”, quando escreve que «…nos podemos orgulhar de ver, por exemplo, Camões traduzido nas diversas línguas europeias mas também em chinês e em japonês». E Joel Mata destaca ainda o «desafio» de Jorge Borges de Macedo, sobre a cultura portuguesa, dizendo ser imperativo refletir sobre a situação da Lusofonia «oficial», mas também ser “preciso chegar às pequenas comunidades dispersas e perdidas nos confins de outras culturas, mas que, até agora, ainda não sufocaram definitivamente a influência portuguesa nos seus costumes e no seu vocabulário”. É o caso de Malaca, tenho repetido incessantemente.



[1] - Edições Esgotadas, 2013. 


Voltando ao meu livro sobre a Lusofonia e à mestiçagem considerada por Adriano Moreira, lembro esta língua tão mestiça e tão rica como a que José Craveirinha utilizou poeticamente na sua «Fraternidade das Palavras», em 1974:
O céu     
É uma m’benga
Onde todos os braços das mamanas
Repisam os bagos de estrelas.
Amigos:
As palavras mesmo estranhas
Se têm música verdadeira
Só precisam de quem as toque
Ao mesmo ritmo para serem
Todas irmãs.
E eis que num espasmo
De harmonia como todas as coisas
Palavras rongas e algarvias ganguissam
Neste satanhoco papel
E recombinam o poema.[1]



[1] - m’benga = pote de barro; mamanas = mulheres; ronga = dialeto mais meridional do grupo linguístico banto tsonga. É falado numa pequena área que inclui a cidade de Maputo; ganguissam = namoram; satanhoco = uma coisa que não presta.

        Por outro lado, será bom lembrar que – já em 2009 – um estudo do ISCTE, também citado nesse meu livro, dizia que o valor da língua portuguesa representava aproximadamente 17% do PIB. 

António Bondoso
5 de Maio de 2020


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