LÍNGUA PORTUGUESA É MESTIÇA E
TRANSPORTA VALORES...ou de como, velha de séculos, conseguiu
impor-se no concerto das nações, sendo hoje reconhecida pela UNESCO que, em
Novembro de 2019, ratificou em Paris o dia 5 de Maio como o seu Dia Mundial. Celebramo-lo
este ano pela primeira vez, facto que merece uma nota particular para lembrar –
como diz Adriano Moreira – que «a língua não é nossa. Também é nossa»! Exatamente
porque ela se expandiu, chegou a ser «franca» no Oriente, mas também pela razão
de ter recebido muito de línguas de outros povos com que nos fomos cruzando.
Por isso, a língua
portuguesa é hoje ensinada em cada vez mais países, é falada oficialmente em
nove e em quatro continentes e é talvez a quarta mais utilizada no espaço da
Internet. É, ainda, a língua oficial de 260 milhões de pessoas e a
mais falada no hemisfério Sul.
No meu livro LUSOFONIA E CPLP – DESAFIOS NA GLOBALIZAÇÃO[1],
Adriano Moreira diz que «a língua nunca é neutra, nunca é um instrumento
neutro, seja ela qual for. A língua transporta valores. Simplesmente acontece
que a língua portuguesa, a meu ver, tem mistura de etnias. Também é mestiça”!
Neste aspeto da
irradiação global, quero também destacar o Professor Joel Mata, nas suas “Lições
de História da Cultura Portuguesa”, quando escreve que «…nos podemos orgulhar
de ver, por exemplo, Camões traduzido nas diversas línguas europeias mas também
em chinês e em japonês». E Joel Mata destaca ainda o «desafio» de Jorge Borges
de Macedo, sobre a cultura portuguesa, dizendo ser imperativo refletir sobre a
situação da Lusofonia «oficial», mas também ser “preciso chegar às pequenas
comunidades dispersas e perdidas nos confins de outras culturas, mas que, até
agora, ainda não sufocaram definitivamente a influência portuguesa nos seus
costumes e no seu vocabulário”. É o caso de Malaca, tenho repetido
incessantemente.
Voltando ao meu livro sobre
a Lusofonia e à mestiçagem considerada por Adriano Moreira, lembro esta língua
tão mestiça e tão rica como a que José Craveirinha utilizou poeticamente na sua
«Fraternidade das Palavras», em 1974:
O céu
É uma
m’benga
Onde todos
os braços das mamanas
Repisam
os bagos de estrelas.
Amigos:
As palavras
mesmo estranhas
Se têm
música verdadeira
Só precisam
de quem as toque
Ao mesmo
ritmo para serem
Todas
irmãs.
E eis
que num espasmo
De harmonia
como todas as coisas
Palavras
rongas e algarvias ganguissam
Neste
satanhoco papel
E recombinam
o poema.[1]
[1]
- m’benga = pote de barro; mamanas = mulheres; ronga = dialeto mais meridional do grupo linguístico banto tsonga.
É falado numa pequena área que inclui a cidade de Maputo; ganguissam = namoram; satanhoco
= uma coisa que não presta.
Por outro lado, será bom lembrar que – já em 2009 – um
estudo do ISCTE, também citado nesse meu livro, dizia que o valor da língua portuguesa
representava aproximadamente 17% do PIB.
António Bondoso
5 de Maio de 2020
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