2013-01-05



OS MEUS LIVROS DO ANO DE 2012 (I)

Entre os milhares publicados – e alguns de grande qualidade – escolhi apenas dois. Perdoar-me-ão a “proximidade”...mas é como em outros lugares e com pessoas diversas. Há sempre uma escolha e, naturalmente, subjetiva.
          Sendo assim e entrando de imediato no tema, coloco em destaque o livro do amigo Prof. Doutor Rui de Azevedo Teixeira sobre a figura do militar Jaime Neves. Chamando de pronto a atenção para o título do livro, enfatiza que é exatamente “Homem de Guerra e Boémio – Jaime Neves, por Rui de Azevedo Teixeira”. Tal como está escrito na capa – uma biografia de autor: 



          Mesmo que não tivesse lido mais nada sobre a nossa última guerra do século XX; mesmo que não tivesse passado por parte dela; mesmo que não tivesse visto um ou dois filmes interessantes sobre a mesma; mesmo que não tivesse apreciado igual número de boas séries documentais na TV (por ex a que ainda passa, da autoria do jornalista Joaquim Furtado, apesar do repetitivo “recurso” às figuras dos entrevistados – sempre os mesmos – e alguns deles sem perceberem muito bem, ainda hoje, o que foi de facto essa guerra de guerrilha em três frentes); mesmo aceitando tudo isso – só o simples pormenor de poder ter lido (e percebido) este livro, vale a razão de o qualificar como o mais bem escrito e mais esclarecedor sobre a chamada guerra colonial, do ultramar, de África ou de libertação.
          Partindo da figura de um autêntico guerreiro – “centauro” como diz – Rui de Azevedo Teixeira descreve-nos o que foi e como foi a guerra, com todos os pontos nos “is”, não esquecendo os nomes malditos como Wyriamu. Sem complexos, sem dramas, sem culpas e desculpas desnecessárias – a guerra, essa guerra, foi vivida na passada e no percurso de Jaime Alberto Gonçalves das Neves, à nascença; o tenente Neves depois da Academia e nas primeiras missões na Índia e em Moçambique; finalmente o “comando” Jaime Neves, o homem do camuflado, com todos os defeitos e as muitas virtudes de um transmontano de gema que se vai fazendo homem na freguesia de Anta, depois Vila Real, Porto, Lisboa e, finalmente, no ultramar: 



          A uma escrita brilhante, simultaneamente realista, simples e erudita, direta e rude (humorada quanto baste, como é tradição da instituição militar), talvez não seja estranho o facto de também Rui de Azevedo Teixeira ter sido comando – um soldado – e, por isso mesmo, ter ele próprio vivido as cenas comuns de uma guerra de guerrilha, para a qual as tropas de elite como os “comandos” foram superiormente preparadas. Sobretudo no “teatro de guerra”, ao contrário do que sucedia com a chamada “tropa macaca” enviada da “metrópole” – primeiro sem conhecimentos suficientes do terreno das “frentes”, por fim, como notou Jaime Neves, mobilizada sem nunca ter disparado um tiro!
          “A maior parte das guerras dividem-se em noventa por cento de tédio e o resto de caos violento. Tal não acontece com os comandos. Com eles, mesmo não havendo tiros, há a hipótese de minas, o que exige uma contínua concentração impeditiva de qualquer das variantes do tédio” – escreve Teixeira. E ao caos violento consegue opor com elegância um caso de “pequena violência cómica” descrito por Jaime Neves e que lembra a 43ª CCMDS, na frente de Moçambique, após a captura de um “preto”:- “Como é que te chamas, pá? – pergunta o comando, no mato, ao preto capturado. – É Conforme, patrão! – O quê?! Estás a gozar comigo, pá?! – Não, patrão. É Conforme, patrão. – O preto, sentado no chão, leva um calçudo. – Como é que te chamas, caralho?! – É Conforme. – Recebe desta vez um consolo mais forte no cachaço. O comando, furioso, repete a pergunta.  – É Conforme. – Dois murros. Uma coronhada. Aproxima-se outro comando, que, a alguns metros, observa a cena. – Ouve, se calhar o gajo chama-se mesmo Conforme. – Si, si. O nomi é Conforme. Si, patrão.”  

        Este é o primeiro capítulo dos meus livros do ano de 2012. O outro, que vai trazer um “apêndice” como brinde, virá amanhã à luz do dia.
========== António Bondoso. 


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