MEMÓRIAS
DE MIM – 1.
2017
não é um ano qualquer. Significa muito para mim.
E
começa praticamente com mais um aniversário meu. O 67º! Que, não sendo embora
um número redondamente perfeito, reporta a factos de boa memória.
Há
50 anos…fazia eu mais um cruzeiro de sonho em oito dias no Atlântico…para tomar
conhecimento mais profundo sobre este promontório onde habito hoje…
Há
50 anos…os meus pais ainda eram vivos. E depois dessa viagem de barco, com eles
me encontrei em Moimenta da Beira, recebendo de presente da mãe um fio de ouro
que ainda uso.
Por
essa altura foi-me dada autorização paterna para fumar…
E
o meu pai, se fosse vivo, completaria em Junho 100 anos! No dia seguinte ao “milagre
de Fátima”.
Quando
me lembro dele o que me vem à ideia?
No
imediato a viola…e quando me levava pela mão ao Dramático para os ensaios de
algum espetáculo (acompanhava no fado o guitarrista Pinto Falcão), e o futebol inevitavelmente
(não só o FCPorto mas também o CDR de Moimenta da Beira, o Sindicato e o
Andorinha em S. Tomé), o sentido de humor, o sorriso maroto…algum “temperamento”
à mistura, claro. O árbitro era o principal adversário. Não deixa de ser uma
herança que eu prezo.
Lembro-me
de ter vivido ao seu lado, na praia de Diogo Nunes, a alegria – igualmente o sofrimento
do que viria a ser conhecido como o caso Calabote – da vitória portista no
campeonato de 58/59. E depois…toda a travessia do deserto que durou 19 anos.
Mas felizmente ainda viveu para celebrar novos títulos e – o mais importante –
ver o clube como Campeão Europeu.
E
vem-me igualmente à memória a sua habilidade intacta de alfaiate, atividade que
havia exercido na adolescência e em jovem adulto em Moimenta da Beira, antes de
iniciar funções na Conservatória do Registo local – as quais viria a desempenhar
na Conservatória do Registo Predial em S. Tomé, de 1952 até à data do seu
regresso a Portugal em finais de 1974. Pois exatamente no arquipélago do Golfo
da Guiné, quer na minha infância, quer nos primeiros anos da adolescência, o
meu pai ainda era exímio naquela arte, nomeadamente na confeção de calças ou
calções para mim. Por essa época usava-se muito o caqui.
Mas
a “indumentária” não era, nesse tempo de adolescência, uma questão essencial.
Uma simples t-shirt bastava, facilitando um reparador banho de mar em qualquer
altura ou a permanente disponibilidade para um jogo de bola.
Há
50 anos…iniciava igualmente a minha atividade radiofónica em S. Tomé. E como
ainda tenho presente os meus sprints na bicicleta do meu pai, quando saía das
aulas no Liceu de D. João II para chegar à tabela ao Rádio Clube a fim de
encerrar a emissão do espaço do almoço, exatamente às 14 horas. Gratificante
essa experiência – sendo certo que acabaria por abraçar a carreira na então
Emissora Nacional, em 1969, depois da transformação do Rádio Clube em Emissor
Regional. Nem sempre com um sorriso feliz, pois logo no início houve uma crise
de relacionamento com um elemento da “equipa de transição”, resolvida algum
tempo depois. Tudo havia começado, contudo, ainda no tempo da Voz da Mocidade –
através de um programa semanal. Uma equipa que recordo com saudade igualmente.
E
agora – 50 anos depois – empurrado para uma aposentação antes do tempo, aqui
estou neste Porto de abrigo, felizmente acompanhado pelo amor e pelo carinho indefetíveis
da minha mulher, do meu filho e mais recentemente também da nora, escrevendo,
escrevendo sempre, registando memórias que possam servir no futuro. E algumas
amizades, claro, que fui cultivando ao longo dos anos. E que espero manter, na
certeza de que o caminho se faz caminhando, nunca isoladamente. Há igualmente
outros familiares a quem dedico amizade, uns mais perto alguns mais longe pelas
circunstâncias da vida de cada um.
Tenho
memórias, tenho esperança. Que o significado de 2017 se estenda e se aprofunde,
permitindo atapetar uma estrada de vida ainda incompleta!
António Bondoso
Janeiro de 2017
1 comentário:
A "reconstrução da memória" estabelece laços connosco em tempos e espaços preenchidos pela rede de afectos e vivências que nos faz sentir "inteiros", ainda que a travessia de todas as paisagens possa (re)cortar o tecido...
Parabéns, António Bondoso, por mais um aniversário e pelo tributo carinhoso a teu pai.
Seja 2017 um ano fecundo e sempre corajoso.
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