UM
ANIVERSÁRIO…
Hoje,
o grande escritor chileno LUÍS SEPÚLVEDA, amigo de Salvador Allende, perseguido
político, preso e depois “condenado” ao exílio, celebra mais um aniversário.
Longe da Pátria mas junto da sua família.
Dele
tenho todas as obras publicadas em Portugal – algumas pelo próprio autografadas
– e com ele partilho a paixão pela Rádio. Apenas falei com ele duas vezes: uma
pelo telefone, quando me encontrava em Macau [Luís vivia já em Gijon depois do
exílio na Alemanha] e pretendi alertar para os problemas ambientais que estavam
a condenar a vida dos golfinhos em todo o Delta do Rio das Pérolas,
especialmente em Hong Kong – e outra na Póvoa de Varzim, durante uma edição de
Corrente d’Escritas.
A
propósito desta reunião/convívio de escritores de várias línguas – sobretudo do
português e do castelhano – e de uma outra que se vai realizar amanhã em
Montemor-o-Velho, por iniciativa da ONG “AECODE”-
apenas dedicada à Lusofonia – quero destacar um excerto do seu mais recente
livro PALAVRAS EM TEMPOS DE CRISE. No
capítulo que designa por “Narrar…Resistir”, Sepúlveda escreve: “A cada dia que
passa mais me convenço de que leio livros que não interessam a ninguém, e os
outros leem livros que a mim não me interessam. A cada dia que passa mais digo
NÃO a convites para participar em encontros de escritores porque me cansam, me
aborrece o show literário, essa
passarela onde se exibem as piores vaidades e as mediocridades mais bem
conservadas. A cada dia que passa mais amo a vida, a rua, os atos sociais,
porque aí descubro que as palavras ainda cumprem uma função necessária. (…)
porque a minha valoração das palavras ensinou-me que estas possuem um profundo
sentido do pudor e sofrem quando são mal usadas.(…) Ordeno as palavras que me permitem
narrar o universo, e porque sou fiel aos meus, àqueles que tornam a vida
possível com o seu esforço resistente [refere-se à recente luta dos mineiros em
Espanha], escrevo, narro e resisto”.
Luís
Sepúlveda mostrava a sua opção por acompanhar a luta dos mineiros, em desfavor
de um convite para assistir a uma conferência de um outro escritor
latino-americano que ele não considera. Daí, a crítica inicial aos encontros de
escritores. Não seguramente ao da Póvoa de Varzim – um dos poucos que ele
admira e no qual marca presença assídua.
Do
mesmo modo, espero eu vir a admirar o que vai ter lugar amanhã em
Montemor-o-Velho. Dedicado à Lusofonia, já vai na 3ª edição. E promete uma
próxima até de maior envergadura. Uma vez que se assinala a 5 de Outubro o dia
da implantação da República em Portugal – já lá vão 103 anos! – espero que
valha a pena participar no encontro de escritores, mesmo sabendo que o mesmo
será mais uma oportunidade para desfilarem vaidades, em troca de poder celebrar
na invicta cidade do Porto os ideais republicanos da justiça, da liberdade e da
solidariedade.
Termino,
naturalmente, com um abraço de parabéns ao Luís Sepúlveda e fazendo votos para
que possa continuar a deliciar-nos com a beleza da sua escrita e das suas
histórias. Ao Luís, um apaixonado da rádio [é raro o livro seu em que não haja
referências à rádio], a quem eu também pedi os contactos da Rádio Ventisquero,
na longínqua Terra do Fogo, lá nos confins do Sul – “está sempre tudo no Sul!”
repete o Luís – para depois chegar à fala com outro grande escritor chileno
Francisco Coloane, que teve pena de não poder ir conhecer Macau e essa ilha de
Coloane gravada no seu nome.
António Bondoso
Jornalista.
4 de Outubro de
2013.
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