2014-02-28

PARA O JORNAL "CORREIO BEIRÃO"...entrevistei o Presidente da Câmara de Lamego, Francisco Lopes.


LAMEGO PODERIA SER A CIDADE MAIS IMPORTANTE DA REGIÃO SE HÁ 100 OU HÁ 50 ANOS ISSO TIVESSE SIDO ESTABELECIDO COMO UM DESÍGNIO.

Tenciona cumprir o mandato até ao fim e vê que Lamego é uma das cidades mais conhecidas e reconhecidas do país e uma “marca” que se destaca pelo património. Francisco Lopes já vai no seu terceiro mandato à frente dos destinos da Câmara de Lamego e diz ter em carteira projetos para mais 20 anos. Liberal, membro do PSD e apoiante de Passos Coelho – que espera ver ganhador em 2015, mesmo que perca as “europeias” por margem mínima - Francisco Lopes critica os governos de Sócrates por não terem construído o IC26, afirma que as portagens na A24 prejudicam o desenvolvimento da região e considera desastroso o modelo de gestão da «Águas de Portugal» – defendendo mesmo que a solução da água, no nosso país, não passa por uma gestão estatal e centralizada.
                Na entrevista concedida ao Correio Beirão, Francisco Lopes admite algumas dificuldades de afirmação do novo hospital de Lamego uma vez que o objetivo inicial – servir a região de Trás-os-Montes e Alto Douro, com cerca de 400 mil habitantes – não tem merecido a adesão de muitas áreas que preferem a oferta de outros hospitais.
                FL – Há que aumentar a oferta e afirmar o hospital de Lamego como um dos melhores hospitais de cirurgia de ambulatório do país. Não há outro caminho, ou o enorme investimento que aqui foi feito terá sido em vão. Conseguimos que este hospital de proximidade tivesse um serviço de medicina interna e 30 camas de internamento de doentes agudos, mas é ainda insuficiente pois, normalmente, a taxa de ocupação é de 150%, com mais de 12 ou 15 doentes internados nas urgências. A oftalmologia está a trabalhar muito bem, mas tem necessidade de mais um cirurgião com urgência.
                CB – Não poderá considerar-se, então, um paradoxo projetar-se uma outra unidade hospitalar privada nas instalações do antigo hospital?
                FL – Não é um paradoxo. Outra unidade com valências não conflituantes faz todo o sentido. O problema é que as exigências legais para o licenciamento são tão grandes que estão a dificultar o projecto…estamos a acompanhar a situação.
Não é fácil combater o desemprego quando a economia está sujeita a um esforço brutal de ajustamento com vista à redução da dívida e do défice.
                CB – Lamego é um dos concelhos com mais elevada taxa de desemprego no país. Atribui o facto apenas à situação conjuntural…ou é uma questão estrutural e com raízes?
                FL - O desemprego no concelho e na região tem muito de estrutural. Mais de metade destes desempregados estão nas 17 freguesias rurais, onde é quase impossível encontrar emprego na indústria ou serviços e a agricultura é quase a única alternativa. O desemprego de licenciados está também a subir, sendo já mais de 300, pouco mais de 10% do total desempregados e que é um fenómeno comum a todo o eixo Lamego/Régua/Vila Real.
CB - Perante a atual situação do país…que iniciativas é que o presidente da câmara já tomou para minimizar o problema…quer localmente, quer junto do governo central?
FL - O desemprego combate-se essencialmente com a dinamização do tecido económico, para que produza emprego e riqueza. Com a simplificação de procedimentos para que os investidores tenham vontade e estímulo para continuar a investir. Com informação, com incentivos directos, com a redução de taxas, com condições de financiamento favoráveis, com ecos infraestruturados para receber novas empresas. E também com infra-estruturas e equipamentos públicos de qualidade, que tornem a cidade e o concelho mais atractivo. E combate-se, também, com a qualificação da população, para que possa responder aos desafios de um mundo globalizado e em permanente mudança.
CB - Está satisfeito com as políticas do governo central para combater o desemprego?
FL - Não é fácil combater o desemprego quando a economia está sujeita a um esforço brutal de ajustamento com vista à redução da dívida e do défice. No interior, onde não há indústria ou serviços, a situação é ainda mais gravosa do que nas grandes cidades. E por isso tenho defendido a importância da manutenção de emprego público no interior e, nesse particular, as políticas do governo, diga-se que deste e de anteriores, não têm sido as mais favoráveis.
A alteração do cálculo dos limites de endividamento e a extinção da Lamego Convida irão provocar um agravamento do endividamento do município, que é apenas contabilístico.
CB - E é provável que – com o encerramento da “Lamego Convida”…o número de desempregados aumente, claro!
FL - De forma nenhuma! Nem o município, nem a Lamego Convida, tem um único funcionário que não seja necessário ao exercício das suas funções, o que facilmente se compreende. A Lamego Convida gere equipamentos públicos, nomeadamente piscinas, pavilhões desportivos, o estádio e o teatro Ribeiro Conceição, que não funcionam sem essas (ou outras) pessoas. Esses trabalhadores manterão no município, depois do necessário ajustamento do vínculo contratual, exactamente as mesmas funções que tinham na Lamego Convida.
CB - Quanto à “dívida” do município… considera que é aceitável e controlável ?
FL - Sim, o endividamento municipal está perfeitamente controlado, mas a alteração do cálculo dos limites de endividamento e a extinção da Lamego Convida irão provocar um agravamento do endividamento do município, que é apenas contabilístico.
CB - Qual a contribuição do pavilhão multiusos para essa dívida?
FL - Para já o multiusos ainda não contribui para a dívida do município porque está na Lamego Renova. Virá com a extinção da Lamego Convida, mas isso não altera nada, pois os encargos com juros e amortizações já estão previstos no orçamento do município e da Lamego Convida.
CB - Tem sido um problema e um mau negócio para a Câmara de Lamego!
FL - Tirando o problema construtivo, que decorreu de um erro de projecto e está praticamente solucionado, nada afastou o empenhamento e a importância que atribuímos a esse equipamento que será único e diferenciador na região.
Fornecemos aos nossos munícipes água de excelente qualidade e quase tão cara como o vinho do Douro
CB - Para diminuir a dívida…não pensa aumentar os “impostos” ou as taxas municipais- como o IMI ou as taxas de resíduos …ou o preço da água?
FL - Não. O IMI tem o mesmo valor - 0,4% - desde que foi criado e assim se manterá. Quanto à água e aos resíduos os valores cobrados não são taxas, nem impostos e por isso não podem depender das necessidades financeiras do município.
CB - Pelos vistos…Lamego possui uma água de excelente qualidade!
FL - Exactamente! Fornecemos aos nossos munícipes água de excelente qualidade e quase tão cara como o vinho do Douro, pois pagamos às Águas de Trás-os-Montes 73 cêntimos por metro cúbico.
A cisterna do castelo de Lamego é um monumento de facto e de direito! É monumento nacional classificado conjuntamente com a torre do Castelo e considero o seu resgate e abertura ao público como uma das grandes vitórias da minha gestão.
CB – Voltando à “dívida”, ligeiramente desviada pelo curso da água, que projetos é que foram prejudicados ou ficaram na gaveta?
FL - Não ficou projecto nenhum na gaveta! Ao fim de 8 anos e de mais de 80 milhões de euros de investimentos e tantos projectos executados, temos em carteira projectos para mais 20 anos! Todos os que não foram executados irão sê-lo mais tarde ou mais cedo... biblioteca municipal, academia das artes, complexo desportivo de Lamego, circular externa de Lamego, centro interpretativo do entrudo e da máscara de Lazarim, requalificação do escadório e da mata dos remédios, pavilhão de Penude, parque urbano de Lamego, parque fluvial do bairro da Ponte, ampliação das instalações da ESTGL, mais regeneração urbana, mais habitação social (reabilitar Lara arrendar), enfim, uma lista infindável de projectos!
CB - Entretanto, a Câmara Municipal adquiriu a «cisterna» no terreno adjacente ao Castelo de Lamego…
FL - A câmara não comprou a cisterna. Comprou, por uns milhares de euros que não posso precisar de memória, o terreno envolvente à cisterna e sobre o qual pendia um legítimo com décadas, impedindo o acesso e a visita da cisterna.
CB - Esse “monumento”…podemos dizer assim, não deveria ser do domínio público e estar “classificado”?
FL - A cisterna do castelo de Lamego é um monumento de facto e de direito! É monumento nacional classificado conjuntamente com a torre do Castelo e considero o seu resgate e abertura ao público como uma das grandes vitórias da minha gestão. É uma das mais imponentes e bem conservadas cisternas do país e um orgulho para todos os Lamecenses.
Sejamos claros, todos os governos são centralistas e nós temos que ter argumentos, capacidade e coragem de reivindicar para a região os fundos que Bruxelas nos destina. Esses fundos são para o interior, não são para Lisboa!
CB - Está satisfeito com as explicações que o governo tem dado sobre a aplicação dos fundos comunitários?
FL - Que fundos? Os do próximo quadro comunitário? Ainda há muitas matérias para discutir. Tenho acompanhado o assunto com o presidente da CCDR-N e com o ministro e secretário de estado do desenvolvimento regional, com quem aliás ainda estive na passada semana. O secretário de estado virá à CIM Douro no dia 5 de Março. Temos o montante para a região norte - 3.320 milhões de euros- mas falta o modelo de governação, nomeadamente a intervenção das CIM e critérios de transparência na gestão dos fundos que ficam centralizados em Lisboa.
CB - O que pensa ser necessário para que haja, de facto, uma política de coesão… sabendo que o interior tem sido ou continua a ser “esquecido” pelo poder central?
FL - Sejamos claros, todos os governos são centralistas e nós temos que ter argumentos, capacidade e coragem de reivindicar para a região os fundos que Bruxelas nos destina. Esses fundos são para o interior, não são para Lisboa! Também temos que ter a noção de que os fundos são para ser investidos em infra-estruturas necessárias e em equipamentos produtivos. Fazer infra-estruturas e equipamentos que não têm procura não resolve problema nenhum, em lado nenhum do mundo! E há opções erradas, ou pelo menos discutíveis, mesmo dentro da região. Porque é que o governo de Sócrates fez o IC5 e não fez o IC26? O investimento era o mesmo, mas os resultados seriam seguramente diferentes. E mudou alguma coisa ao despejar milhares de milhões de euros na A4, IC5 e IP2, de uma assentada, numa região onde tradicionalmente o investimento público é diminuto? Não mudou. As políticas de coesão exigem ajustamento à realidade e portanto dinheiro, mas também diálogo com os actores locais. Os municípios e as CIM estão cá para isso.
CB – Mas defende a construção do IC26?
FL - Já o disse claramente! E acho que não havendo dinheiro para o construir será indispensável começar pelo menos com alguns troços ou variantes a aglomerados urbanos. A EN 226 está transformada numa via urbana, como passadeiras, semáforos, passeios de peões, casas e lojas à face da estrada... um caos!
Tenciono cumprir o mandato até ao fim, mas não é tabu. Se tiver que sair antes sairei e com a consciência do dever cumprido.
CB - Lamego poderia ter todas as condições para se assumir como a cabeça de uma região de futuro, capaz de ombrear com Viseu. Não está interessado nisso… ou a região não tem mesmo capacidade económica – apesar do turismo – para esse desafio?
FL -Lamego poderia ser a cidade mais importante da região se, há 100 anos, ou há 50 anos, isso tivesse sido estabelecido como um desígnio e todas as condicionantes fossem favoráveis. Com a progressiva perda de população e de serviços para as capitais de distrito, há muito que o papel de Lamego se alterou. Não deixou de ser importante no contexto regional, simplesmente é diferente.
CB - Tem pena de, no final do seu terceiro mandato, não ter conseguido colocar Lamego, digamos … na “agenda política ou económica” do país? Ou pelo menos a um nível mais elevado? 
FL - Muito pelo contrário, vejo com  satisfação que Lamego está sempre na agenda regional e nacional. É uma das cidades mais conhecidas e reconhecidas do país e uma "marca" que se destaca pelo património, pela cultura e pela maior e mais qualificada oferta turística da região. E esse reconhecimento é igualmente institucional e nos meus mandatos assumimos a presidência da associação de municípios com centro histórico, que é a segunda maior associação de municípios do país e que tem sede em Lamego, a presidência da assembleia geral da associação de municípios do vinho, de que somos fundadores, e neste mandato a presidência e lugares de direcção na associação de municípios do Douro Sul e na Beiradouro, entre muitas outras. Marcamos presença igualmente na comissão permanente do conselho regional do norte da CCDR e agora no CES - conselho económico e social, órgão de consulta do governo para a concertação social, representando os municípios do norte. E a nível internacional já assumimos a presidência da associação ibérica de municípios ribeirinhos do Douro, estamos na direcção da RECEVIN - rede europeia de cidades do vinho, que agrega mais de 800 cidades da Europa e estamos no comitê das regiões da união europeia em representação dos municípios portugueses.
CB - É que há rumores de que o Senhor Presidente poderá não levar este mandato até ao fim. Isso é verdade ?
FL - Já respondi a isso. Tenciono cumprir o mandato até ao fim, mas não é tabu. Se tiver que sair antes sairei e com a consciência do dever cumprido.




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