2007-07-28

IDEIAS E FRASES

VERÃO REFRESCANTE - VERÃO PREOCUPANTE ...
... uma dupla e estranha sensação que me assaltou esta semana, passado que foi o efeito da "profecia" de Saramago e já distante do "medo" de Manuel Alegre. Para quem tem o bom hábito de ligar palavras e ideias, não sei se, por um qualquer mérito do acaso que me rodeia, terá encontrado uma semelhante pista de raciocínio. Afinal, não terão ambos percebido e reagido aos tristes sinais dos tempos, sérios avisos à navegação política em Portugal ? Mais uma vez, penso, e por palavras diferentes, ambos se terão "manifestado" preocupados com a lógica da inércia que nos conduz ou desencaminha. De provocação ou aviso, as ideias de ambos poderão atingir idênticos objectivos. "Plagiando" o anúncio da SB - portugueses, ponham-se à fresca !
Pedro Norton, na Visão, diz que o momento é cada vez mais perigoso e que os partidos continuam, ufanos, a sua marcha em direcção ao abismo - lógico e natural mas preocupante ; Fernando Madrinha, no Courrier Internacional, parece muito mais trágico e dramático, quando escreve que "é muito triste que o nosso autor mais celebrado (JS) seja tão azedo e displicente para com o país onde nasceu, a ponto de não lhe importar que ele desapareça como Estado independente". Como disse, talvez tenha sido apenas uma "provocação" de Saramago. Contudo, se ele falou "seriamente", então todas as análises estarão inquinadas. Como acontece, amiúde, com as sondagens ! A "ficção" de que Portugal poderá vir a ser uma província de Espanha, talvez esbarre não só na romana ideia de que, para lá daqueles montes, há um povo que não se deixa governar, mas também numa moderna e legítima ideia de que a UE não vai ser capaz de atingir uma verdadeira "fusão" política. E com uma Europa menos unida, teremos sempre um tabuleiro com muitos jogos de interesses e de poder. E mais uma vez o mar estará a nosso favor, tal como evitou há nove séculos que tivéssemos caído na órbita de Castela.
Retomando o fio à meada, e pondo de parte o "triste espectáculo" diário das televisões que nos procuram moldar ( é só recordar os directos a propósito da ida de SS para Madrid, como se tivéssemos espetado uma lança em África!), foi na revista VISÃO que pude refrescar os sentidos, lendo uma oportuna e brilhante entrevista com António Arnaut e "Uma história exemplar" contada por Leonor Beleza.
António Arnaut, que prefere a expressão romântica e fraterna "camarada", em desfavor de doutor ou professor, chama os cidadãos pelo nome : - utentes do SNS e não "clientes". O Serviço Nacional de Saúde é património insubstituível do povo e é dos melhores do mundo. Mas agora (absurdo, escândalo) até a direita critica pela esquerda a política de Saúde do PS.
Arnaut ainda acredita na ideologia e no socialismo mas não percebe as bandeiras brancas e amarelas, em vez das vermelhas. Diz que o PS está a perder a alma e a identidade... "desviou-se tanto para a direita que, porventura, até estarei quase a sair"... ! É o humor de um homem de cultura : - um país sem humor não tem futuro. Basta ter lido o Eça. Como também escreve Vasco Pulido Valente, - a carreira partidária é hoje uma pura carreira profissional, em que a ideologia e as convicções não contam ou quase não contam !
E depois, a cereja no cimo do bolo : - "Esta geração ( que está no poder, - e o poder não é só o governo) vale-se mais da astúcia do que da seriedade.E aprendeu os ensinamentos de Maquiavel". Só que Maquiavel tinha um propósito concreto e definido - a unificação da Itália humilhada e moribunda ! E em Portugal, hoje, qual é o sentido ou o objectivo da geração do poder ? Entregar o país aos capitalistas neoliberais e globalizantes, à Espanha, EUA ou à UE ?
Vivemos num país sem rumo a longo prazo, sem dirigentes capazes e visionários, para quem só tem lugar a política do tostão. Regressamos, assim, ao velho ditado do país de AOS - depois de melão, vinho a tostão !
E o que dizer da "história exemplar" de Leonor Beleza ? Ela própria se encarrega de dizer que é uma história extraordinária, "em que um sistema de cuidados de saúde de visão se sustenta a si próprio há três décadas, gerindo magistralmente os recursos que consegue obter. O ARAVIND EYE CARE SYSTEM nasceu e desenvolveu-se numa zona particularmente carecida da Índia, em Madurai, no Estado de Tamil Nadu. Baseado numa dimensão filosófica extramaterial, o sistema "alia a espiritualidade que ali todos invocam a uma sofisticação na gestão de meios que o tornou um case study em grandes universidades do mundo. É um exemplo, invocado e seguido em muitos outros lugares, dentro e fora da Índia. Sobretudo, centra, na pessoa que serve, tudo o que faz" ! A instituição foi este ano galardoada com o prémio da Fundação Champalimaud.
Vale a pena reflectir e chamar a atenção de Sócrates, Mendes, Correia de Campos, Portas e Cavaco Silva.
António Bondoso.

2007-07-27

Arquipélago

O enigma é outro - aqui não moram deuses
Homens apenas e o mar, inamovível herança.


CONCEIÇÃO LIMA - Jornalista e Poeta Sãotomense

"A Dolorosa Raíz do Micondó". Caminho, 2006

Os Primeiros Bisavós

O tempo viajou depressa e deixou
gerações atrás de gerações que se perderam
e hoje não me lembro já de quem amou
os primeiros bisavós dos avós dos meus avós
que depois deles voltaram a ser avós
se espalharam possuíram e viveram.

ANTÓNIO BONDOSO - V.N. de Gaia e Moimenta da Beira.

Inédito. 2007

A Ilha e os Escravos

A ilha verde-esmeralda é agora um lago de cristal
onde as lágrimas da chuva ganham brancas asas
na vastidão das noites
que meus avós derramaram nos mares da escravatura.

OLINDA BEJA. Professora e Poeta Sãotomense.

"Pingos de Chuva" - Palimage Editores, 1999

2007-07-26

Belisa na noite de Lisboa

Para ela, todas as coisas têm o seu mistério, e a noite é o mistério de todas as coisas. Tal como o mistério da poesia. Talvez sem o saber, outro poeta o disse, antes e depois da morte : Lorca, o bruxo. Por isso, viajar à noite com ela, é descobrir o lado oculto ou torná-lo mais oculto para que a descoberta seja maior. É voar entre as asas de uma ave nocturna.

LUIS VEIGA LEITÃO . - MOIMENTA DA BEIRA (... e outras viagens na prisão e
no exílio nos trópicos ).
Livro da Paixão, Ulmeiro, - 1986

Livros que nos tocam para sempre !

Basta tão só um pensamento, um simples pensamento reflectido numa frase ou num poema. Bastam, por vezes, meia dúzia de linhas apenas, entre vírgulas, pontos, interrogações ou exclamações, para tocarem a nossa alma. E há livros que, afectuosamente, nos tocam para sempre!

António Cardoso Pinto. 2007 . ( Angola, Portugal, Macau).

Radialista, Jornalista, "Construtor de Palavras".

2007-07-25

Poetas de África

"Uma velha estrada parte, deixa-nos aqui na margem
Fixando no céu a nova estrela que se aproxima
A nova estrela aparece, obscurece a sua própria partida
Antes de um ir e um vir em perpétua sucessão".

CHRISTOPHER OKIGBO
"Elegia ao Alto"
Poeta, nascido em 1932 na então Nigéria Oriental
Morreu em 1967, em defesa da causa da independência do Biafra.

Tradução e sugestão de Conceição Lima, - Jornalista Sãotomense

O Sentir - de Estima de Oliveira

"o caminho da foz
é exactamente o rio

estrada
de novos encontros

e a ponte
está pronta"

Alberto Estima de OLiveira ( Lisboa, Angola, Guiné e Macau ).
ESTRUTURA I
O Sentir - 1996. Edição de Autor, c/patrocínio do Instituto Cultural de Macau

As palavras de Aquilino Ribeiro

"O escritor que se preza continua-se; continuar-se é acentuar a sua personalidade. As escolas passam, o artista, quando o é com dignidade, fica".

Aquilino Ribeiro.
"O Servo de Deus e a Casa Roubada". Bertrand, 1967 - p.10

2007-07-24

Pelo princípio, como sempre !

Cruzei-me com as palavras, pela primeira vez, há pouco mais de cinco décadas. Passei com êxito as fases das letras e das sílabas, depois aconteceram as palavras e as frases e, numa luta "quase" permanente ( o quase significa a dimensão do meu tempo de jogar à bola em qualquer lugar e em diversas circunstâncias!), fui "dominando" o som dos dizeres e a essência das coisas.
Confesso que não tem sido fácil. Mas, das antigas "redacções" e "ditados" dos bancos da escola e passando pelas letras dos escritores "permitidos" no liceu, sempre foi ficando alguma paixão pela vida das palavras e das ideias. E com elas e por elas fui "viajando". Ora no sentido da Estrela Polar, ora na direcção do Cruzeiro do Sul, mais para Ocidente, mais para Oriente, mas viajando sempre !
E, por vezes, viagens na companhia deliciosa de alguns construtores de palavras. No papel fui deixando algumas impressões e expressões da minha razão : Em Macau por Acaso, Tons Dispersos, A Cidade e a Paixão, Escravos do Paraíso.
Até que aqui cheguei, se bem que empurrado pelos "ventos" da geração de meu filho, essa "rajada" das novas TIC que navega em outra galáxia. Do dintel deste "blogue" ao "design gráfico" (passe o sacrifício aos puristas da língua), vou acomodando-me à utilização destes novos equipamentos, tendo a consciência de que as palavras se continuam a escrever da mesma forma.
Recordo, por exemplo, um pequeno texto que enviei há dias a um "amigo construtor " de palavras : - as palavras de um poeta deslizam pelas teclas do computador e vão directas ao coração dos sentidos e às artérias dos sonhos. Só pode ter sonhos quem utiliza a palavra ! Lendo, escrevendo, passeando o peso de cada letra. Apaixonadamente ! E depois... é seguir o vento, os caminhos da imaginação, um teletransporte ao infinito do pensamento e das coisas que não são deste mundo.
Percorrer estes caminhos, só pelas palavras. Trabalhadas com carinho, redoiçadas no balanço da vida. As palavras ganham vida viajando sempre. Uma permanente e perene viagem, muito para além da nossa existência.