2020-04-27

A pandemia da covid-19 é um desafio em busca da criatividade para ser uma editora diferente, uma editora do mundo. «Edições Esgotadas» tem sede em Viseu e, segundo a diretora Teresa Adão, estar no interior é hoje a menor das preocupações. 


A editora, que celebra neste abril dez anos de vida, com mais de 500 títulos publicados, mereceu já a atenção da TVI com um convite para participar na gravação de uma novela, a qual viu as gravações interrompidas por força da crise sanitária.
         Este problema interrompeu igualmente, mas de forma temporária, as encomendas de Itália – uma ligação que vai sendo retomada aos poucos, para além da cooperação com a França, Espanha e com o Brasil.
         Respondendo a algumas questões deste blogue «Palavras Em Viagem», Teresa Adão afirma que «Ninguém fica financeiramente rico a editar livros, o que interessa mesmo é o prazer da equipa e semear cultura, para além de se darem ao luxo de editar os livros em que acreditam»:
AB - Continua a ser uma aventura de risco manter uma Editora em Viseu - região de uma interioridade acentuada!?  
TA - «Neste momento, não pode dizer-se que os problemas tenham muito a ver com a interioridade. Creio que as editoras estão todas no mesmo "barco". Necessitamos de empreendedorismo, estratégias e criatividade. Não podemos parar, nem deixar-nos abater pelas dificuldades. Tem de haver um caminho, basta sermos pró-ativos e marcarmos pela diferença. Consideramo-nos uma editora do mundo. Aliás, as redes sociais são uma boa ajuda para combater a interioridade. Os nossos autores do distrito não chegam a 40% do total de pessoas que escrevem connosco. No ano passado, fizemos uma apresentação em Paris e temos os nossos livros distribuídos em Espanha, no Brasil e em Itália. Temos autores nossos traduzidos noutros países e já editámos autores moçambicanos, brasileiros e norte-americanos. Só não temos mais expressividade na lusofonia, porque há problemas de vária ordem que impedem que os autores sejam mais divulgados.  No início de 2020, fomos convidados pela TVI para participarmos com os nossos livros, numa novela em que entra uma editora. As gravações encontram-se interrompidas pela situação de confinamento a que temos estado sujeitos. 
AB - As temáticas editadas são de uma enorme variedade. Essa abertura é para manter...Ou seria preferível, nestes tempos conturbados, limitar as «coleções»? 
TA - Em princípio, as coleções são para manter. Não há necessidade de reduzir a oferta. Temos áreas bem balizadas e categorizadas, bem como projetos e parcerias com algumas universidades. Hoje, mesmo, lançámos o primeiro livro de uma coleção de Serviço Social, coordenada por um professor do ISCTE. O livro técnico/científico engloba áreas pragmáticas, ajudando alunos, investigadores e curiosos com obras de pertinência e atualidade irrefragáveis. A poesia, por exemplo, é uma área pela qual os nossos livros são conhecidos além-fronteiras. No campo do livro infantil, estamos também na linha da frente, com as histórias personalizadas, em que as pessoas escolhem as características, os nomes e outros pormenores das personagens e da narrativa, podendo fazer agradáveis surpresas às crianças, ou ainda, com os livros em Pop up e para construir e montar, destinados aos mais pequenos.
AB - nem sempre um «bom livro» é recorde de vendas! Para vós, edições esgotadas, quais são os aspetos mais determinantes para prever o sucesso? Claro que tudo isto é do domínio da subjetividade! Além de que não se fazem sondagens para captar o gosto do público leitor. 
TA - Sendo nós uma editora independente, podemos dar-nos ao luxo de editar os livros em que acreditamos, mas não nego que, nem sempre, aqueles que têm mais qualidade são os mais vendidos. Já temos tido algumas surpresas. Atualmente, vamos percebendo os gostos do público com tiragens mais pequenas e reeditamos sempre que se justifica. Dessa forma, fazemos jus ao nosso nome Edições Esgotadas e não corremos o risco de ficar com os livros parados no armazém. Na medida do possível, tentamos conciliar os livros mais vendáveis com aqueles cuja qualidade a nossa comissão científica atesta, embora saibamos, de antemão, que não vão encontrar eco imediato em todos os tipos de público. Ninguém fica monetariamente rico a editar livros, mas é uma atividade que dá muito prazer à nossa equipa, porque percebemos que estamos a semear cultura, a despertar leitores e a contribuir para disponibilizar às pessoas uma forma de partilharem mensagens com as quais intervêm na comunidade, perpetuando saberes e patrimónios». 



Edições Esgotadas, uma editora de Viseu que acaba de celebrar 10 anos de vida (11 de Abril) e da qual eu sou um dos autores, estando a ela ligado já por quatro títulos publicados: O PODER E O POEMA (2012); LUSOFONIA E CPLP (2013); O RECOMEÇO (2014) e TERRA DE NINGUÉM (2019).
António Bondoso
27 de Abril de 2020




2020-04-22

DE DOR EM DOR, e continuando a «cozer o seu arroz na sua panela» …a Guiné-Bissau «caminha com e como todos, para o futuro». Mas, «Imaginemos que o país se encontrava sem Chefe de Estado neste quadro de pandemia…». É também assim, com esta frase, que Ernesto Dabo entende justificar a complexidade da situação política na Guiné-Bissau, revelando que, «Manter a situação de vazio de poder na presidência, isso sim, poderia levar a consequências de imprevisível gravidade». 



Ernesto Dabo, que é um veterano da luta de libertação da Guiné-Bissau e Cabo Verde e foi um alto quadro político guineense, quer no PAIGC, quer ao serviço do Estado, disse a este Blogue «Palavras Em Viagem» que, na sequência das recentes eleições para a Presidência da República, não houve “golpe de Estado. E justificou: “O empossamento do candidato reconhecido vencedor, aconteceu nos moldes em que aconteceu, porque a postura do candidato derrotado tinha por objetivo agir de forma dilatória, na esperança de conseguir uma saída favorável aos seus interesses”. E para reafirmar a sua convicção, Ernesto Dabo esclarece: “Admito que esta questão possa parecer um golpe de Estado, mas mesmo que alguém o consiga provar, direi que o apoiaria como apoiei o 25 de Abril”.  
O meu contacto com esta multifacetada figura guineense – poeta, escritor, cronista, dramaturgo, fotógrafo, ativista cultural, músico e Mestre em Direito Internacional – data de há já alguns anos, quando me foi oferecido por uma amiga de infância o seu livro/ensaio político “PAIGC : da maioria qualificada à crise qualificada”, de 2013. Também por essa altura publicava eu a dissertação de mestrado em Lusofonia e CPLP, a qual incluía como que um «estudo de caso» sobre a GB, acabadinha de viver mais um conflito politica e socialmente dramático em 2012. Dúvidas persistentes e um futuro carregado de incertezas – incluindo atos eleitorais normais – levavam-me a perguntar «E se o resultado eleitoral não corresponder às expectativas dos atuais militares no poder»? Pois essa minha dúvida tem vindo a repetir-se ciclicamente, tendo acontecido o mais recente episódio já no início de 2020, depois de o PAIGC ter perdido e contestado as eleições de Dezembro do ano passado. De novo o fantasma da crise com a derrota do candidato do partido «histórico», o que me levou a perguntar a Ernesto Dabo, sete anos depois do seu “ensaio”, se o partido voltaria a ter capacidade de liderança, numa sociedade dividida a vários níveis, ou se mais este episódio determinaria o fim da importância do PAIGC? Eis as respostas:
ED = Como se costuma dizer, “ uma crise também é oportunidade para se mudar, melhorar”. Assim sendo, acredito que o PAIGC poderá voltar à liderança do país. Aliás, quando perdeu Amílcar Cabral, prosseguiu a luta e proclamou, unilateralmente, o Estado da Guiné-Bissau, concluindo o processo com a proclamação do Estado de Cabo verde; com o golpe de 14 de Novembro de 1980, ficou sem a componente cabo-verdiana, mas seguiu liderando a Guiné-Bissau; com o advento da democracia, ganhou e perdeu eleições; após o conflito político militar de 7 de Junho de 1998, esteve à beira da extinção, conseguiu restaurar-se e ganhar eleições. Se tivermos em conta estes factos, julgo que se deve admitir que o PAIGC pode recuperar a liderança, se souber renovar e adaptar-se devidamente às exigências da luta política e democrática do presente.
AB = A «erosão» de que fala, está ainda hoje associada ao problema da corrupção?
     ED = A “erosão” me parece indissociável da corrupção. As situações em que a meritocracia seja dominante, os progressos atenuam o recurso à corrupção, porque a fiscalização da acção dos governantes e agentes da administração pública é mais competente, sofisticada, presente e prudente. Se a isso juntarmos o maior potencial de cultura ética, que se supõe residente num grupo de boa preparação técnica, culturalmente identificado e patriótico, os efeitos negativos da “erosão” de que falamos, serão reduzidos ao mínimo.
        AB = Houve «Golpe de Estado» agora…ou tudo é fruto da incapacidade das Instituições?
 ED = A meu ver não houve golpe de estado. A instituição com competência para pronunciar os resultados eleitorais (CNE) fê-lo reiteradamente; a CEDEAO reconheceu os resultados; unanimemente, os observadores internacionais, nacionais, órgãos fiscalizadores, reconheceram os resultados. O recurso apresentado ao STJ, não obedeceu aos preceitos legais para o efeito; até ao presente o STJ não consegue se pronunciar de forma clara e definitiva.
          AB = A «tomada do poder» tem também ou sobretudo a ver com a «luta» entre Lusofonia e Francofonia?
    ED = Interesses geopolíticos fazem parte integrante da acção externa dos Estados, dai que, nada a estranhar, que sejam factores a ter em conta na análise de factos políticos ocorridos nas zonas de interesses de actores diferentes.
         AB = A chamada «Comunidade Internacional» (incluindo a CPLP) não tem força para «normalizar» o país!? Para onde caminha a Guiné-Bissau?    
 ED = A esta questão, responderia com um pensamento de Amílcar Cabral: “ Por mais importantes que sejam os factores externos, em última instância, são os endógenos que determinam as soluções. “O arroz coze-se na panela”. A Guiné-Bissau caminha com e como todos, para o futuro.
Um futuro eventualmente adiado, de novo, agora pelos efeitos da pandemia da COVID-19. Não pelo número de casos registados – há dois ou três dias situava-se em 50 – mas sobretudo pelas consequências económicas e sociais. Segundo a diretora nacional do Banco Central dos Estados da África Ocidental para a GB, Helena Nasolini Embaló, as debilidades do país poderão conduzir a um choque económico mais profundo do que em outros países da sub-região. Mesmo tendo em conta o alívio da dívida por parte do FMI. 



Poliglota, fala sete línguas, Ernesto Dabo já publicou também “Mar Misto” e “Olonko” (Bilingue em Kiriol/Português) de poesia, e editou o CD “Lembrança”, considerado como uma referência para a música guineense e africana.


António Bondoso
22 de Abril de 2020

2020-04-18


TUDO O QUE TENHO ESCRITO É POUCO…mas é o que sinto e sei! 48 anos depois da sua partida precoce, a sua figura doce alimenta memórias que o tempo não consegue esbater.


         A propósito, documento algumas das palavras mais recentes:
Quando a mãe não está...há muitos espaços vazios entre o coração e a saudade. E a minha já não está há 47 anos.

Foi sempre uma âncora firme. Mas "levantou ferro" há 46 anos...e eu cheguei a navegar sem rumo. Na doçura da tua voz e do teu gesto fixo hoje a memória do carinho que me guia em cada dia, até nos voltarmos a encontrar... Bom dia MÃE!

À MINHA MÃE VIRGÍNIA
Há 45 anos – dava eu os primeiros passos de um jovem adulto e servindo no exército – veio sobre mim o clarão triste da morte. Foi atingida a mãe deste filho, provavelmente a meio do seu percurso de vida! Ainda jovem, portanto. E foi uma dor que fez mossa. Sentida ainda hoje. Não foi nada fácil adaptar-me à circunstância de ser órfão. E os caminhos multiplicaram-se na visão dos horizontes de uma ilha a meio do mundo, ora fechando ora abrindo as águas do mar imenso. E como não pude estar com ela nesse momento de passagem…é importante que agradeça a quem esteve comigo nas horas da cor do luto, é importante que estenda o gesto de carinho a quem esteve com ela nos momentos dolorosos dos suspiros – antes de uma nova viagem. Não sendo dono do tempo e não desistindo da memória, grato estou igualmente a quem me acompanha ainda hoje neste espaço de certeza, elevando o coração à altura das lembranças da mãe que tive e que foi. Bjs do filho e até um dia destes. Porque o Céu existe.

***** Bom dia Mãe!

EM MEMÓRIA…
Há dias em que a felicidade também devia ser medida pela quantidade de condensação que o vale das três montanhas oferece.
Há dias…ainda foi ontem mas parece ter sido há uma eternidade, sobretudo pela falta que me tens feito nestes 42 anos. Pelo carinho, pela paciência, pela paz e pela doçura que transpiravas. Pudera a minha juventude regressar ao ativo e eu sentir os passos da tua presença.
Hoje, digo apenas que continua a ser válido o que escrevi há dois anos:
FOI  HÁ QUARENTA ANOS!

Com a tua partida
Fiquei órfão de um sorriso lindo e doce,
Carente do desvelo com que mimaste minha infância
E me viste crescer,
Mesmo quando a tua serena fúria
Pretendia ser amarga e dizer não.
Não foste perfeita à imagem de uma santa

Mas amaste quem pariste
E sofreste quem amaste.

Foi há quarenta anos...
E eu
Na minha Ilha de Sonho,
Ainda procurava descobrir o caráter do mundo!

E hoje, em 2020
Mãe 48anos de Saudade
E de repente chegamos ao mundo e temos um aconchego pleno de carinho protetor que nos dá alento e nos ensina a respirar a vida. Chama-se Amor de Mãe! E só é interrompido quando se parte o elo físico da relação. Para preencher o «vazio», oferecem-nos então esse imenso estado d’alma a que se dá o nome de saudade. Renova-se a cada ano que passa. E não termina nunca!
         Como diz Almada, em «La Lettre», a mãe deixou-o sem querer e ele não quis que ela partisse. E confessa não lhe ter escrito, pois o céu onde a mãe está…é imenso!
“(…) Il est minuit…
Je vois le ciel
Où tu es, Maman…
Tu m’as quitté
Sans le vouloir!
Moi non plus,
Je ne l’ai pas voulu!(…)”


António Bondoso
Abril de 2020

2020-04-16


PARTIU LUÍS SEPÚLVEDA...e com ele parte uma autorizada e lúcida voz do Chile, de toda a América do Sul e do mundo que reclama Liberdade. 




Talvez não fosse um romancista – alguns classificaram-no como novelista – mas foi seguramente um dos maiores escritores chilenos. Jornalista, ambientalista, ativista político – um incondicional de Salvador Allende – LUÍS SEPÚLVEDA foi um perfeito retratista do Chile dos anos 70 do século XX e, mesmo exilado na Europa, nunca deixou de «pintar» criticamente a atualidade do seu país em tempos recentes. Gosto de o ler, a sua escrita apaixona-me. Transporta-me para o sul do sul, para a Patagónia, para Atacama, para o estreito de Magalhães, para a liberdade de uma vida simples num ambiente saudável, para a justiça do pensamento livre. Faleceu hoje em Espanha, vítima da Covid-19, a caminho dos 71 anos de vida que iria completar em 4 de Outubro. Recordo, a propósito, o que escrevi em 2013 no meu blogue:

2020-04-15


A CRISE SANITÁRIA E O «TUGA» ESPECIALISTA…
Quando não há certeza de coisa alguma e tudo evolui ao minuto, o ruído dos números divulgados publicamente ao nível micro não ajuda a uma clara e correta – tanto quanto possível – perceção da realidade.
         E a propósito de uma tão estranha quanto honrosa reação a uma legenda/rodapé de uma estação de televisão, na qual o inserçor de carateres é o menos responsável pelos eventuais erros que vão acontecendo, vale a pena destacar dois aspetos: 1 – ser obrigatório o recurso ao corretor ortográfico para os que trabalham com o inserçor de caracteres e fundamental a «revisão», por outros olhos, de tudo o quanto ali se escreve. 2 – depois da «indignação», alguém se lembrou de tentar perceber as razões dos números tão elevados na região norte sobre a Covid-19? Vale a pena refletir. Dos 18.091 casos confirmados hoje, muito mais de metade situam-se na região norte = 10.751! Aliás, o norte – só por si – absorve todos os casos de todas as outras zonas do país. E dos 599 mortos, bem mais de metade aconteceram na mesma região. Quais as razões? Há diversas e todas elas devem ser equacionadas.
         E não será igualmente oportuno questionarmo-nos sobre um tão elevado número de casos suspeitos? Mais de 150 mil, dá que pensar. É assustador! Deixemos, por isso, que os verdadeiros especialistas se concentrem na análise do processo. Tenho a certeza de que o estão a fazer. Mas, se cada um no seu quintal, pretender colocar um grão na engrenagem, seguramente que a tarefa só vai complicar.
         Deixo-vos esta sugestão. É um exercício muito interessante, ajuda a passar o tempo e auxilia os neurónios: Tentem fazer todas as conjugações possíveis. Podem combinar qualquer expressão inserida na primeira coluna com as das outras e na ordem 1, 2, 3, 4. As variações possíveis são cerca de 10 mil. O quadro permite ao «manipulador» falar ininterruptamente por mais de 40 horas, sem dizer absolutamente coisa alguma. Ora tentem…


António Bondoso
Abril de 2020. 

2020-04-10


POR AGORA DEIXOU DE CHOVER...MAS AS NUVENS NÃO DEIXARAM DE SER NEGRAS.

                                                                Foto de Ant. Bondoso


NUVENS NEGRAS

Eram nuvens
Nuvens negras
De um escuro carregado
Corriam velozes ao vento
Muito mais que o esperado.

Por certo levavam destino
Não parecia desatino
O rumo que foi tomado.

Estou triste
Triste, triste
Com todas as nuvens negras
Que me levam
Que me arrastam
Com os seus dedos em riste.

Que dimensão de tristeza
Que me faz chorar pobreza
Em tão nublado destino.

Nuvens negras
Tristes nuvens
Que sopro deveras zangado
Transformam-se num esfumado desenho
Perdido, puramente imaginado.
====
Ant. Bondoso
Março 2020

2020-04-09

PÁSCOA 2020 – o apelido é o medo!
Há quatro anos apontava eu imensas dúvidas de vida e a inquietação dos tempos. Permanecem.

                                                           Foto de Ant. Bondoso (Lapa)

E lembrava que da Síria ao Iraque, de Angola à Somália, do Sudão ao Congo, da Líbia ao Egito, de Israel ao Líbano, da Turquia ao Mali, da Europa ao Tibete, da Venezuela ao Brasil, do Haiti à Chechénia, da Etiópia aos Estados Unidos, da Rússia à Colômbia, da Indonésia à Ucrânia, do Afeganistão ao Curdistão, do Equador ao Iémen...o espírito devia ser de paz, independentemente das crenças e apesar de todas as angústias e de todas as inquietações.
                                                                     
PÁSCOA INQUIETA...
Se a Páscoa é Morte e Ressureição
Deverá ser igualmente Perdão e Redenção.
Acresce o Sofrimento no Mundo
Que merece inquietação.
E a Paz que se deseja
Não é pouca mas sim tanta
Para uma Quadra mais Santa.

         Hoje, embora por motivos diferentes, falamos igualmente da China e da Coreia, de muitos outros países do Sudeste asiático, mas sobretudo agora da Itália, da França, da Espanha, de Portugal e de novo dos EUA e do Brasil. E não esquecemos os campos de refugiados espalhados pelo mundo. Chamam-lhe Covid-19, mas o apelido é o «medo». Apesar de todas as dúvidas, esperemos também uma África poupada ao martírio.

DÚVIDAS DE VIDA                     
Páscoa
Paixão
Morte e ressurreição
Páscoa
Passos
Caminhos de contradição.
Esta vida é um senão
Perdida mas logo achada,
Páscoa
Angústia de sexta-feira
Reconvertida em esperança
Radiosa na mensagem
Que o sábado é de passagem.
Páscoa
Ideia inteira
Balança,
Nasce um domingo perfeito
Certeza de muitas dúvidas
De que o nosso mundo é feito.
===
António Bondoso
Abril de 2020.



2020-04-06

NUVENS NEGRAS…ou a vergonha de como um «bando de especialistas» pretende transformar um país, arrasando-o!

Foto de António Bondoso

NUVENS NEGRAS…ou a vergonha de como um «bando de especialistas» pretende transformar um país, arrasando-o! Uma absurda e vergonhosa competição/guerra – à moda de um ultraliberalismo no seu momento mais elevado – coloca médicos contra médicos, à procura de protagonismo, mete ao barulho os mais diversos laboratórios, em busca de projeção e do lucro.
         E os média e os seus peões de brega, alguns dizem-se jornalistas, vão entrando e alimentando esta luta. Sem bússola, sem referência, sempre à procura do show-off que os mantenha à tona da água ou os empurre para o topo.
É a economia, estúpido! A frase correu mundo, talvez muitos se lembrem, mas hoje há novos contornos. Podemos mesmo dizer que «não é apenas a economia, estúpido»! A ganância, a ambição, a traição, a manipulação, as lutas pelo poder tomaram conta desta sociedade doente. Tantos especialistas vão minando a confiança dos cidadãos, dividindo o país em bons e maus ou em falsos e verdadeiros, antagonizando governantes e governados numa situação que requere tranquilidade.
Hoje aparecem os mais diversos especializados em máscaras, na manipulação dos números e no prazer da necrologia, e eu vou olhando incrédulo para os efeitos do desgaste com que alguns média, ditos de referência, vão contribuindo para as campanhas despejadas nas redes sociais.
         De repente, este país que Almada chamou de «sítio, ainda por cima mal frequentado», passou a ter uma plêiade de especialistas. Não me refiro aos médicos de uma forma geral – a Ordem e os sindicatos são outra coisa – tal como não me refiro genericamente aos enfermeiros – a Ordem e os sindicatos são outra coisa – do mesmo modo que não destaco mais umas quantas profissões de grande relevância na sociedade portuguesa. Como são cientistas e investigadores de renome, que apenas amam e honram o seu trabalho, não se imiscuindo na baixa política da crítica fácil e enraivecida…
         Sabemos que há alguns bons empresários – negociantes são outra coisa – tal como sabemos que há alguns bons professores, os sindicatos não valem a abrangência, sabendo igualmente que há alguns bons jornalistas. Mas os média que os exploram com baixos salários e sem condições de trabalho dignas são os maiores culpados, tal como as «escolas» que os (de) formam com o objetivo único da mesquinhez e da morbidez das audiências.
         Para cumprirem o desiderato vão chafurdando no pântano da desinformação, sempre à procura de um pormenor, sempre atrás de um rumor, sempre em busca da agitação. A fricção vale muito mais do que o confronto leal, sério, honesto e de «valor acrescentado». À «gestão da crise» apelam à confusão da crise. Morreram pessoas com outras patologias? Coisa nunca vista, dizem! Não é habitual? A culpa é da falta e do desvio de recursos. Como se nunca tivesse havido falta de recursos – particularmente durante a crise financeira! E como se nunca tivesse havido cortes e má gestão no SNS!
         Mas apesar das nuvens negras – ou sobretudo por elas – perceba que o mais avisado, nas atuais circunstâncias, é ficar em casa e/ou manter a distância social. As máscaras do tipo comum, podem estar certos, não resolve por si só a proteção caso não se respeitem esses pressupostos. A DISCIPLINA é fundamental. Nada pior do que ver e ouvir um casal que, intercetado pela polícia, dizer que ia passar um bocado a casa de uns amigos.
         Voltando a Almada Negreiros, fixo um excerto do seu «Manifesto Anti Dantas»: “O Dantas é um habilidoso! (…) O Dantas em génio nem chega a pólvora seca e em talento é pim-pam-pum.(…)”.
         Por isso, deixe o talento, o profissionalismo, o empenho, a competência para quem merece, para os verdadeiros especialistas. A propósito, talvez se recorde do filme O ESPECIALISTA, excelentemente protagonizado por Sharon Stone e Sylvester Stallone. Não queira ser mais papista do que o Papa. E como Francisco tem dado o exemplo.
António Bondoso
Abril de 2020.

2020-04-04

José Inácio Peres.
Quando a proximidade nos toca, vem a lembrança à memória!

                                                       A partir de foto de Alberto Helder

De S. Tomé e Príncipe, a terra de Francisco José Tenreiro e de Almada Negreiros, o meu país do sul que me envia alegrias pelas ondas do mar e igualmente tristeza – como foi o caso da notícia de hoje, o falecimento de José Inácio Peres, quase a celebrar o 92º aniversário. O Peres que eu conheci por lá em circunstâncias diversas, mas que já não via há uns anos. O Peres da Fazenda, o Peres do Sindicato, o Peres do Benfica e da estrutura provincial do futebol, o Peres do Rádio Clube, o Peres da tipografia – a meio do percurso entre o Lima&Gama e a Farmácia Epifânio. O mesmo Peres que, depois de ter sido promovido na função pública, foi colocado em Moçambique em 1973. Dali regressou a Portugal em 1975 e foi Amarante o seu destino. De Amarante ao Porto é um saltinho, e algumas vezes nos encontrávamos a caminho dos convívios «da malta de S. Tomé». Ou no Bussaco ou no comboio para Lisboa, onde todos os anos se assinala o Dia do Santo.

O José Inácio Peres deixa duas filhas – a Mizé e a Lola – dois netos e dois bisnetos. A todos os familiares e amigos o meu abraço respeitoso. Fica a saudade. 

                                                      A partir de foto de Alberto Helder
                 (reconhecendo o IvoJordão, o Vieira da Recauchutagem e um dos irmãos Mendes)


António Bondoso
4 de Abril de 2020.



2020-04-02


Diz a minha agenda das Edições Esgotadas que hoje é o Dia Internacional do Livro Infantil e o Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor.
                    Como tenho saudades da Banda Desenhada do Major Alvega!
Mas quero apenas lembrar que fui tendo a oportunidade e o privilégio de ir escrevendo e publicando livros. Da mais diversa temática, da Poesia à Prosa, do Ensaio às Teses Académicas, vindos à luz do dia por meio de Editoras ou mesmo em «Edições de Autor», não esquecendo a participação em Diversas Coletâneas como a Poiesis, da Editorial Minerva, a Mangwana ou Rio dos Bons Sinais, do CEMD – Círculo de Escritores Moçambicanos na Diáspora – e também Palavras de Cristal, da Modocromia.


Escrevi notícias e elaborei programas de Rádio ao longo de 40 anos. Mas, em 1999, circunstâncias diversas levaram-me à Poesia, em Macau. Foi o primeiro livro, titulado Em Macau Por Acaso, mas talvez não tenha sido assim tão por acaso. Alguns amigos, a ocasião, o ambiente, a ambiência…ajudaram a produzir o conjunto: António Cardoso Pinto, Helder Fernando, Estima de Oliveira, António Correia, foram talvez os principais responsáveis. A todos eles estou imensamente grato.
Na esteira da inspiração, sobretudo da transpiração…foram aparecendo muitos, felizmente, dos quais pretendo apenas salientar hoje dois – resultado de um enorme trabalho de investigação e de pesquisa. 


ESCRAVOS DO PARAÍSO (Esgotado), de 2005, com a MinervaCoimbra, um relato abrangente de vivências de S. Tomé e Príncipe que percorre parte do trajeto da violência da Escravatura e dos serviçais contratados para as roças, ora no «ciclo da cana do açúcar», ora no «ciclo do cacau», permitindo enquadrar episódios reais e testemunhos na primeira pessoa, do tempo mais recente do longo «ciclo da colonização portuguesa» nessas ilhas encantadas do Golfo da Guiné. Digo ainda que é «uma viagem profunda à intimidade dos afetos e da paixão pelas ilhas de S. Tomé e do Príncipe, inventadas por Deus e abençoadas pela natureza africana. Dos que viveram e daqueles que ainda permanecem no coração das “Ilhas do Meio do Mundo”, são-nos também revelados sentimentos de desilusão e de mágoa pelas dificuldades surgidas nos caminhos da afirmação da Independência e, simultaneamente, de uma eterna esperança no futuro do novo país. Enquanto se vai esperando pelo «ciclo do petróleo», a governação tem apostado no turismo mas esquece as pescas, e a agricultura é o parente atribuladamente pobre». 


O PODER E O POEMA (ainda disponível), de 2012, com as Edições Esgotadas, é simultaneamente um ensaio e um canto de protesto e de revolta, que foi ao passado – recente e longínquo – buscar ensinamentos e conforto para enfrentar e ajudar a ultrapassar os problemas do presente e os desafios do futuro. Cito Luís Veiga Leitão – “Dizem que os poetas são o sal da terra. Hoje, como nunca, necessários são para que o mundo não apodreça mais ainda” – e o mais recentemente desaparecido Pedro Barroso: “Este livro não é apenas um livro de poesia, é sobretudo um livro/ensaio sobre as odes à revolta que foram surgindo ao longo da história”.
António Bondoso
2 de Abril de 2020. 


2020-04-01

No meio dos números cruéis e da depressão…o alento de Ramalho Eanes.
Foi sempre a grande «reserva» da Nação, sobretudo no interregno entre Jorge Sampaio e Marcelo Rebelo de Sousa. 


Para quem não teve oportunidade de ouvir a entrevista de Ramalho Eanes à RTP, deixo algumas das ideias mais marcantes:
         Esta crise é um momento de silêncio e de reflexão.
Não demos ouvidos às manifestações pandémicas anteriores. Reagimos tarde. Mas Somos falíveis e muito frágeis.
Solidariedade. A Globalização não trouxe a solidariedade indispensável.
Não há que alimentar mitos sem razão, apesar do medo.
Perdemos a capacidade de ser e de estar em sociedade.
Não é admissível que haja portugueses que não tenham que comer e onde dormir.
O Estado não pode ser um Estado «mínimo». Poderá haver nacionalizações totais ou parciais.
Novos e velhos. Se formos para o hospital, nós – os mais velhos – seremos capazes de oferecer o ventilador a quem tenha mulher e filhos.  
E os nossos irmãos, também em África. A Europa não pode abdicar de uma atitude realisticamente solidária. 



António Bondoso
1 de Abril de 2020.