2016-03-21


A PROPÓSITO DO DIA DA POESIA: 

***** É um ofício difícil - dizia Manuel António Pina sobre a Poesia.
Por sua vez a Cristina Carvalho diz que "É uma arte. E como toda a arte tem uma linguagem que permite tudo, sempre."
Já Sophia escreve que ""A poesia não me pede propriamente uma especialização pois a sua arte é uma arte do ser." E a catedrática Silvina Rodrigues Lopes afirma que "Falar de poesia é afirmar, postulando-o imanente ao viver humano, um exercício da linguagem que excede o seu uso instrumental."
=== É portanto, fácil, perceber que o assunto é mesmo muito difícil. Apesar disso, nada me inibe de vos deixar aqui um eventual PENSAMENTO POÉTICO:
"Mergulhei na escuridão!
Mas tenho todas as luzes de todos os faróis do mundo
Para me guiarem
Pela tua costa rochosa.
=== A. Bondoso (A Publicar).
Tudo isto, antes de partir para as ilhas do meio do mundo, onde vou ver nascer o sol:
NASCER DO SOL EM S. TOMÉ (A Publicar)
Ali vi um dia o sol nascer
Manhã desperta
Fixando o horizonte a transformar-se.
Ansiosa contagem a passar cada segundo
Eram cinco e trinta e dois
De um agosto já perdido
O astro poderoso a crescer no Equador
E o olhar a acompanhar
A luz mais forte deste mundo
A aquecer e a queimar
O tempo de um novo dia
Que o coração…sem querer
Já esquecer não podia.
E em frente estava o mar
Que refletia o poder
Desse sol que depois
Alimentava a flora
Aspirava as gotas húmidas
E sem molhar a história
Trovejava mil pecados
Em tantos verdes pintados
Que a alma…sem eu querer
Perdão pedia por ser.

O mar e o sol a acompanhar
O transpirar das ideias
Tórrido calor de vida
De gente de muitas cores
Que partiu e que chegou
E quase sempre voltou
Mas valendo o pensamento
Quase nunca me acompanhou.

Porque são coisas diferentes
Estar e ser…mais ainda pertencer!

=== António Bondoso (A Publicar)
Maio de 2015. 

Foto de A. Bondoso. 

2016-03-20


ATÉ OS MORTOS FALAM NA RÁDIO

É assim. Fatal como o destino. De vez em quando aqui tenho que voltar para atualizar as notícias de amigos e camaradas que partem.
Hoje, para comunicar que faleceu em Guimarães o camarada Armando Leston Martins – homem da Cultura e da Informação, tendo trabalhado em jornais em Angola no tempo colonial, em Luanda e creio que também em Benguela, para além de fundador da Revista Mensagem e de colaborador na 2ª série da Revista Cultura. Amigo de Agostinho Neto, de Mário de Andrade e de Viriato da Cruz, engajados na luta anti-colonial, Leston Martins viu o regime fixar-lhe residência em Lisboa [tal como aconteceria com outro seu amigo, D. Alexandre Nascimento, hoje Cardeal e Arcebispo emérito de Luanda], onde acabaria mais tarde por integrar os quadros do Rádio Clube Português, depois na RDP – ainda em Lisboa – e mais tarde no Porto, na área dos Programas, onde eu o conheci. Tudo isto pode ser confirmado nas imagens que acompanham este texto.
Leston Martins deixa este mundo aos 86 anos, depois de ter visto partir dois dos três filhos do seu primeiro casamento e vencido por uma lenta doença degenerativa cerebral que não o impediu de – até há uns meses – teimar em fazer palavras cruzadas.
O corpo poderá ser velado a partir de amanhã na capela mortuária da Igreja do Campo da Feira, em Guimarães, realizando-se o funeral na terça-feira. À atual mulher e mãe do seu filho mais novo, tal como ao Pedro Leston e a todos os familiares e amigos, deixo o meu abraço solidário.
Até sempre Leston Martins.  

Do Livro ESCRAVOS DO PARAÍSO, 2005.

Entretanto, do Leonel Cosme aqui referido, acabei de receber umas notas do  que ainda se recorda de Leston Martins, como segue: 
"- Foi. nos anos 1951-52 um dos promotores do Movimento dos Novos
Intelectuais de Angola e colaborador activo da histórica revista
MENSAGEM, tendo publicado logo no primeiro número (só houve mais um segundo) o poema "Canto de amor e esperança." Num concurso literário da mesma data promovido pela ANANGOLA, obteve o 2º prémio de Conto.
- Naquela mesma época colaborou em programas culturais de Luanda, Benguela e Moçâmedes(donde era natural), aqui ao lado de Sebastião Coelho, director de produção.
Pode ser considerado um activista cultural pró-angolanidade, enquanto integrado num grupo que, alguns anos depois,(com ele já em Portugal) passaria pelo Tarrafal.
Não me lembro se ainda passou pelo Apostolado e R.C.Português. Quando contactei com ele já estava na RDP". 


António Bondoso
Jornalista


UM BRASIL...BRASILEIRO.
Agora, sobretudo, que todo o mundo bota faladura sobre um país em crise.

Foto de António Bondoso

UM BRASIL…BRASILEIRO!

Do outro lado de Angola
O que vemos é Brasil.

Uma imensidão de tamanho
De gente…que multidão!
Nem todos filhos da terra
Onde reina Iemanjá
Um leito de grandes rios
Que alimentam o Amazonas.

É terra de acolhimento
Desejada, conquistada
Violentada de séculos.
E isso mereceu de Vieira duras críticas
Sermões inéditos
Antes da liberdade de Pedro
E da força das palavras
Que nos deixaram Bandeira
Drummond, Machado de Assis
Jorge Amado ou Sarney.

Do outro lado de Angola
O que vemos é Brasil.


De um destino de escravatura
A potência dita emergente
Quem lá vive é o que sente
A crise do crescimento
De um complexo mosaico.

Virando da história outra página
De Tiradentes a Lula
Passando por Xico Mendes
Repousam nos meus sentidos
As mais belas notas de Vinícius
E a suprema voz de Bethânia.
Em AROMAS DE LIBERDADE(S), 2015, Pgs 85-86
====== António Bondoso
Jornalista


2016-03-19

SIMBOLISMO QUASE PERFEITO

Foto de António Bondoso



SIMBOLISMO QUASE PERFEITO…
(A PUBLICAR)

É um simbolismo que marca
Se os afetos são seguros.

Nada se exige
Mas tudo se dá
Numa relação tecida
Em cumplicidade assumida.

Um dia de tantos dias
Anúncio de calendário
Vale a imagem de sempre
Aquela que nos alcança
A mesma que nos atinge
No peito de um amor feito.

Meu pai, meu filho,
Sem ser dia da razão
De um absoluto viver,
Quase dizem que é banal
A alegria de um sinal
E o calor de uma paixão.

Mas será sempre um simbolismo
De presença e de querer.
=== António Bondoso (A PUBLICAR)

Março de 2016.

2016-03-17

 E SE O PODER CAIR NA RUA? 
Não tenhamos medo de colocar a questão.

Foto de António Bondoso

Anda muita poeira no ar, sobretudo para os lados do Brasil.
Ficámos a saber já que a "Justiça" caiu na rua, quando o próprio investigador de Lula - o Procurador Moro - divulgou gravações que ele mesmo considera não serem conclusivas. E não se sabe até se serão lícitas! A "justiça", portanto, caiu na rua divulgada em altifalantes de viaturas próprias de campanha. 
E SE O PODER igualmente vier a cair na rua...não tenhamos ilusões - a solução é uma nova ditadura militar!
Não tenhamos medo de refletir sobre isto. A oposição quer conquistar nas ruas o que perdeu nas urnas...mas pode sair-lhe o tiro pela culatra. Lá teremos a Democracia aprisionada. De novo.
E lembremo-nos de que, quando uma borboleta bate as asas na Amazónia, a terra treme no outro lado do mundo.
António Bondoso
Jornalista

2016-03-15


LUSOFONIA E LÍNGUA PORTUGUESA A ORIENTE.


A propósito desta Conferência, recordo hoje um trabalho que elaborei em 2008 e subordinado ao título: 
“PORTUGAL E A LUSOFONIA A ORIENTE:
ESPLENDOR, ESQUECIMENTO E UMA NOVA EXPANSÃO”



António Augusto Bondoso



PORTO
2008

INTRODUÇÃO

            Terminado o Império físico português, e não se tendo cumprido em qualquer altura e circunstância um tal “Quinto Império” de Vieira ou de Pessoa – ou mesmo de Camões, que o tinha pensado sem qualquer limite à liberdade na ilha dos Amores, como refere Agostinho da Silva[1]- a presença da Cultura e da Língua Lusas no mundo volta a merecer atenções na cena internacional.
            Em Portugal, naturalmente; no Grande Brasil; também nos países africanos falantes do português mas não só. A Oriente da História (sobretudo), onde o português desempenhou o papel de língua franca – a par do glorioso passado de Goa, Damão e Diu temos ainda hoje o caso singular e não menos preocupante do território de Macau, desde Dezembro de 1999 parte integrante da República Popular da China.
            Foi exactamente em Macau que o Professor Malaca Casteleiro, no Verão passado, se lamentou do facto de Portugal não ter uma política para a língua – dizendo haver falta de dinheiro para coisas essenciais.
            Então, como conciliar não só a preservação mas já uma nova expansão, se não houver meios para o conseguir?
            Temendo não encontrar uma resposta inequívoca – ou até mesmo minimamente apropriada – vamos procurar recolher algumas opiniões que possam sustentar um caminho a seguir em direcção ao objectivo.

CAPÍTULO I

O ESPLENDOR DO PASSADO NÃO MERECE O ESQUECIMENTO.


“Considero que o monumento mais importante do passado histórico dos portugueses por terras do Oriente não é nenhuma fortaleza ou catedral mas sim o ‘portuguese settlement’ de Malaca, na Malásia. As casas de pescadores são de madeira, mas a sua língua, a sua religião e os seus costumes – o seu substrato cultural – permaneceram ao longo de 500 anos sem outros contactos com Portugal”.
                                                                                                                                  Armando Teixeira Carneiro, 2004[2]


Este testemunho, que podemos de certa forma subscrever – não se desse o caso de desconhecermos muitos outros monumentos e lugares – merece apenas uma ligeira “correcção”: durante os últimos anos da Administração Portuguesa de Macau, a comunidade de luso-descendentes de Malaca foi alvo das atenções que foi possível desenvolver em termos oficiais, mesmo sem o apoio ou iniciativa do Governo da República. De Macau partiram para o Bairro Português de Malaca alguns conjuntos de trajes folclóricos para “alimentar” uma das grandes atracções turísticas da cidade[3].
Nós próprios pudemos colaborar com gravações de música portuguesa, incluindo o Hino Nacional (a música que se toca e canta com a Bandeira!) – quer instrumental, quer cantado – a pedido do proprietário do restaurante Lisboa, Sr. Silva (já por diversas vezes aliciado para trabalhar num restaurante português da ilha de Coloane em Macau) e do amigo Sr. Alcântara, cujos netos nos “brindaram” com a simplicidade e à vontade de uma longa convivência, dizendo em perfeito e perceptível Kristang que “na escola fala malaio, em casa fala português”! Querendo manter vivas as suas raízes, George Alcântara (Alcantra) publicou mesmo nos anos de 1990 um pequeno livro onde conta toda a história dos luso-descendentes de Malaca e da sua fixação no Portuguese Settlement nos anos de 1930. Escrito embora em língua inglesa e com o título “The Malacca Malaysian Portuguese Heritage”, o livro inclui até um modesto e pequeno “dicionário” de vocábulos portugueses traduzidos para Inglês e para Malay (Kristang)
Num artigo para a Revista Macau, o bolseiro da Fundação Oriente Brian Juan O’Neill[4] – que trabalhou em Malaca cerca de ano e meio – descreve também em pormenor toda essa história e, a propósito do livro “Undi nos by di aki?”[5], destaca as dificuldades que a comunidade enfrenta no presente, nomeadamente a questão jurídica da posse da terra e a construção de um aterro para instalar um complexo hoteleiro – aterro que poderá significar a “morte” do Bairro Português. Ficará em perigo a actividade piscatória a que se dedica ainda uma boa parte dos luso-descendentes. A questão do hotel não é pacífica e tem dividido a comunidade, que receia poderem vir os especuladores imobiliários a colocar em risco a coesão dos cerca de dois mil habitantes do Bairro.
Sem pretender mediatizar excessivamente a questão de Malaca – talvez a menos conhecida e menos estudada das possessões do antigo Império Português – destaque ainda para outro livro, da autoria da Historiadora Beatriz Basto da Silva, publicado em Macau em 1989 pelos Serviços da Educação e distribuído e dedicado às crianças de Malaca. Trabalho pedagógico, simples mas atractivo e bilingue (português e inglês), “Malaca – o Futuro no Passado” põe na palavra de Luís de Camões a história da aventura lusíada que uniu povos e países bem distintos, apesar da distância acentuada. De 1511 a 1641 – foram apenas 130 anos de convívio, contudo suficientes para o que a autora classifica de milagre: “o sentimento de portugalidade preservado pela religião e pela língua lusíada, apesar de tudo em volta ser tão diferente”. Beatriz B. da Silva termina perguntando “será que a herança recebida irá permanecer por muito tempo”?
Uma pergunta ainda sem resposta, tal como muitas outras referentes a outros tantos pontos de contacto luso a Oriente e nos quais a presença portuguesa sempre assentou em dois pilares – a religião católica e a língua crioula.

CAPÍTULO II

INCAPACIDADE = FALTA DE VONTADE POLÍTICA

 “Em toda a parte, aquilo que avulta como menos vulnerável e como cimento mais forte, é realmente a língua e, com ela, se a capacidade existir e a vontade não faltar, o veículo da cultura capaz de disputar o seu espaço e de o fazer crescer”.
                                                                                                                                                                Adriano Moreira                                                                                                                                                                                                               

Aquando da sua eleição presidencial, Cavaco Silva dirigiu aos portugueses na diáspora uma carta[6] em que prometeu criar, na Presidência da República, uma assessoria política para as Comunidades Portuguesas.
Aproveitando a circunstância, as “Comunidades ou Cristandades Crioulas Lusófonas do Oriente” dirigiram a Cavaco Silva uma carta aberta[7], na qual solicitaram atenção para as suas dificuldades de sobrevivência cultural por parte daquela “assessoria”, que funciona – de facto – no âmbito da tradicional assessoria política da Presidência da República. Não se sabe a resposta mas, tratando-se de uma questão de política externa, é natural que o assunto tenha sido encaminhado para a Secretaria de Estado das Comunidades e Cooperação.
Contudo, como é lembrado naquela carta aberta, “a incapacidade de Portugal nesta matéria tem sido uma evidência secular, filha da ignorância e do preconceito”. O documento refere também uma Conferência realizada em Malaca, em 1996, sobre “O renascimento do Papiá-Cristão e o Desenvolvimento do Património Malaco-Português”, na qual as diversas comunicações questionaram temas de grande importância – nomeadamente sobre o crescente interesse dos estudantes e professores malaios pelo estudo do crioulo Kristang; sobre a eventualidade de o crioulo e o Português padrão poderem vir a incluir o sistema de ensino da Malásia e sobre a necessidade de uma sumariação dos crioulos existentes no mundo e de uma troca de experiências dos seus falantes. Apelou-se então ao apoio de Portugal e das Fundações Portuguesas, falando-se inclusive da possibilidade de ligação das Comunidades Crioulas Lusófonas do Oriente à CPLP. Por outro lado – e a atestar a dita incapacidade de Portugal – foi pedido ao Governo Português que viabilizasse a organização de um pavilhão das Comunidades Crioulas na EXPO 98. Primeira resposta – o envio do preçário para arrendamento dos pavilhões! Nova diligência, nova resposta – cada Comunidade deveria diligenciar no sentido de ser incluída nos pavilhões dos respectivos países!
Assunto arrumado e que mereceu do Arcebispo Emérito de Mandalay (Birmânia-Myanmar) – D. U Thang Aung, descendente de portugueses e onde a maioria do clero católico é de origem portuguesa com raízes na cidade de Pegú, desde 1600 – o comentário de que “quem nunca recebeu a mais ténue manifestação de solidariedade de Portugal nada tem a esperar daí”!
Confirmando este lamento e dando corpo ao título deste Capítulo II e ainda ao “se” de Adriano Moreira, não é de estranhar que o crioulo de Myanmar – já não seja falado, tendo a comunidade perdido, com o tempo, os nomes e apelidos cristãos, apesar de permanecer fiel à religião católica.
Em Goa – considerada em tempos a Roma do Oriente – ainda hoje se fala e escreve em português padrão, não tendo as características dialectais chegado a dar origem a um verdadeiro crioulo[8]. A presença da Fundação Oriente tem, certamente, muita influência, mas o mesmo parece já não acontecer em outras regiões da Índia, como Diu, Damão, Mangalor, Cananor, Mahé e Cochim – e também no Sri Lanka, Xangai, Java, Flores, Bali, Sumatra e Singapura.
Entretanto em Korlai, junto a Chaúl, na Índia – é provável que ainda resista o crioulo Kristi, revelado ao mundo somente em 1982 pelo etnólogo romeno Laurentiu Theban, e na Tailândia (Bangkok e Ayutia) ainda permanecem vocábulos de uso corrente no relacionamento familiar e na religião.
Aliada a outros sinais da presença lusa a Oriente, a preservação e a expansão do ensino da língua devem ser encaradas – não como despesa mas sim como investimento para o futuro de Portugal – opção estratégica que implica equacionar meios e objectivos diferentes, consoante os territórios e os públicos alvo.
Esta evidência, a par de um real desinvestimento por parte do Estado Português ao longo dos últimos anos, estava contida num Projecto de Resolução apresentado por deputados do PCP na A.R., já em 2005, e no qual se propunha – por ex – a criação de um sítio na Internet; a divulgação de programas de qualidade na RTP Int., na RTP/África e em idênticos canais da Rádio Pública, de modo a estimular a aprendizagem da língua portuguesa no mundo; e o apoio aos Órgãos de Comunicação Social de língua portuguesa publicados ou transmitidos no estrangeiro.
Não se conhecem efeitos práticos desta iniciativa do PCP mas, a julgar pelas críticas que continuam a surgir de diversos quadrantes, não terá sido um projecto bem sucedido. Curiosamente, no mesmo ano, o sítio do Ministério da Educação na Internet, sobre a promoção e ensino da língua – antecipava que “O século XXI assistirá, pois, a um assinalável processo de expansão da Língua Portuguesa nos diversos continentes”.
É verdade que o século actual vai ainda consumir muitas e longas décadas, mas também é um facto que os primeiros anos não têm sido muito animadores para tal desiderato. Guerras e crises financeiras e económicas complicam o presente e ensombram o futuro.          
Numa análise breve e simplista, poder-se-á ficar com a ideia de que o assunto é ‘um caso perdido’.
Contudo e certamente não de forma espontânea e casuística, eis que a Indonésia – através do seu Embaixador em Lisboa, o timorense por nascimento Francisco Lopes da Cruz[9]afirma ter dado início aos contactos para obter o estatuto de observador associado da CPLP. A Indonésia tem Timor-Leste como vizinho e o relacionamento entre os dois países é excelente – disse Lopes da Cruz – acrescentando haver muitas razões de ordem histórica que ligam a Indonésia a Portugal, sobrando ainda o facto de a língua indonésia contar com cerca de duas mil palavras de origem portuguesa.
Uma aposta estratégica e geopolítica da Indonésia – sem dúvida – mas também um verdadeiro ‘balão de oxigénio’ para os objectivos de Portugal nesta matéria.
As palavras de Lopes da Cruz mereceram já assentimento e elogios por parte do Presidente Timorense, Ramos Horta[10]: “é uma excelente ideia” e a Indonésia “é um país com longas tradições portuguesas. Só por aí, a Indonésia merece o estatuto”.
Ramos Horta levantou ainda a hipótese de ser concedido o mesmo estatuto à Malásia por causa de Malaca, se esse país se mostrar interessado.


CAPÍTULO III

TIMOR-LESTE E MACAU – CASOS ESPECIAIS.

“Seria lógico pensar-se que o fim da administração portuguesa de Macau significaria a morte da língua portuguesa na China. Mas ao fazer de Macau uma plataforma para os países lusófonos, a política de Pequim mudou tudo. Afinal, há um número crescente de chineses que querem aprender a falar português”.
                                                                                                                                                                     Luís Pereira[11]

            Não há muito tempo, este lead de um artigo na Revista Macau com o título “queremos falar português” talvez merecesse dos eternos cépticos um sorriso irónico e amarelo. Mas hoje, mau grado a “falta de (vontade) política”, a falta de estratégia ou a falta de meios financeiros, há que encontrar um caminho para dar resposta – não só à procura (essencial no imediato) mas sobretudo ao “esquecimento” de longo prazo, onde estão os afectos e onde o futuro da língua pode ser mais sólido e mais duradouro.
            Já vimos o caso de Goa onde, apesar de ainda se falar e escrever em português corrente, a língua está em regressão. Segundo Vasco Graça Moura[12], a situação só poderá ser ultrapassada “se houver políticas de cooperação bilateral suficientemente fortes e sugestivas”. Em Timor, acrescenta Vasco Graça Moura, “a tradição cultural e religiosa, aliada à cooperação bilateral e inscrita em todo o complexo processo que levou à independência em relação à Indonésia, levam a que o português possa aspirar a um papel importante na construção desse novo país”.

            Não custa imaginar, por isso, que – se “a capacidade existir e a vontade não faltar”, na palavra de Adriano Moreira – as recentes declarações de Lopes da Cruz e de Ramos Horta possam ultrapassar a simples retórica.
            Timor, ex-colónia portuguesa, independente em 1975, invadida e ocupada pela Indonésia que a fez sua 27ª província, libertada pela ONU em finais do século XX e de novo independente em 2002 – tem dezasseis línguas autóctones[13]que, ao longo do último século, foram “ligadas” pelo tétum-Praça (ou tétum-Díli), uma forma específica do tétum, crioulizado pelo português. De considerar também a importância recente do inglês e, particularmente, o português e o bahasa[14] indonésio.
            Ao inverso do português durante o período colonial – praticamente só as elites escolarizadas e os funcionários da administração pública nos grandes centros utilizavam a língua de forma corrente – o idioma indonésio foi imposto (com a proibição total da utilização da língua portuguesa) numa tentativa  de promover a assimilação completa do povo timorense. Uma intenção acompanhada, e salientada por Rui Feijó, de “uma invasão administrativa e da religião muçulmana, na sequência de uma invasão militar que, nos primeiros quatro anos, terá sido responsável pelo desaparecimento de cerca de duzentos mil cidadãos”.
            Mas foi exactamente neste período de ocupação indonésia que os timorenses decidiram afirmar a sua identidade, resistindo por todas as formas – até mesmo pela simples “nomeação” e, talvez particularmente, pela religião. O estudo de Rui Feijó destaca o baptismo de amplos sectores da população de qualquer escalão etário no tempo indonésio e cita Frédéric Durand (2004)[15] para referir que “a população baptizada terá passado de cerca de um quarto a mais de três quartos” adoptando geralmente nomes em língua portuguesa.
            E há ainda a “guerrilha” – diz Rui Feijó. Taur Matan Ruak (o seu último comandante), em 2001, sustentou ter havido três factores de peso na decisão de a guerrilha manter o uso da língua portuguesa: “a) a presença de intelectuais falantes dessa língua, cujo contributo para a formação da estrutura militar da guerrilha terá sido considerável; b) a existência entre os timorenses conhecedores da língua escrita de um elevado número de indivíduos que se exprimiam em português; e ainda c) o facto de ser uma língua ortograficamente estabilizada e desenvolvida”. Essa – acrescenta Taur – seria “uma arma para contrapor à língua malaia no âmbito da luta cultural”.
            Contudo, é um problema passado. Hoje, interessa criar ali condições para um correcto e atractivo ensino da língua a estrangeiros.
            Como se clama hoje em Macau (tanto pelo IPOR como pelo IPM e pela Universidade), onde a grande maioria da população chinesa nunca se interessou pela aprendizagem do português – exceptuando talvez o esforço desenvolvido nos últimos anos da Administração Portuguesa. A falta de capacidade e de uma política das entidades de Portugal para o ensino e expansão da língua foi uma constante e Rui Rocha[16] – empresário macaense de origem portuguesa – diz mesmo que “Portugal sempre desprezou Macau”.
            Vasco Graça Moura salienta o exemplo de Goa, em contraponto com o caso de Macau, onde – “sem uma política concertada com as autoridades daquela autonomia especial da República Popular da China, o português estaria condenado a desaparecer de todo a breve trecho”.
            Voltando a Luís Pereira e ao seu trabalho na Revista Macau, o Director dos Serviços de Educação – Sou Chiu Fai – afirma que o interesse pelo português se faz sentir desde a escolaridade infantil ao secundário complementar, incluindo o nocturno e programas de formação contínua. Mas… só há um professor de português por cada 2,3 escolas, exceptuando as do ensino luso-chinês e, naturalmente, a Escola Portuguesa.
            De que se queixam as instituições para o ensino do português em Macau? Sobretudo da falta de materiais adequados, pelo menos numa versão bilingue, com explicações gramaticais e vocabulário para facilitar o processo de estudo – afirma o director da Escola Superior de Línguas e Tradução do IPM, Choi Wai Hão[17]. O Prof. Malaca Casteleiro está de acordo, confessando que os materiais bilingues produzidos em Portugal apenas se adequam ao contexto europeu.
            Para além do Tribuna de Macau, há outros jornais em língua portuguesa como o Clarim, o Hoje Macau e o Ponto Final.
            José Sales Marques, macaense e antigo Presidente do Leal Senado – hoje Presidente do Instituto de Estudos Europeus – aproveitando mais um aniversário do Hoje Macau[18] e referindo-se à questão do que deve ser um jornal em língua portuguesa naquele território, hoje, afirmou que “deve contribuir para a divulgação da língua portuguesa e da nossa cultura numa perspectiva de diálogo humanista e sem preconceitos sobre o passado, como processo legítimo de vincar e aprofundar uma mais-valia da RAEM: a sua diversidade cultural”.
            Recorda-se ainda que a Administração de Macau mantém em funcionamento um canal de rádio e outro de televisão em língua portuguesa, apesar da diminuta percentagem de falantes – mas como resultado dos acordos que levaram à transferência de poderes para a RPC. E é exactamente no vasto território chinês que a língua portuguesa é cada vez mais procurada. Só em Pequim, já existem quatro universidades que leccionam a língua portuguesa.

CONCLUSÃO

Tendo em atenção que a língua portuguesa é a sexta a nível mundial, a terceira língua europeia mais falada no mundo com cerca de 250 milhões de falantes – para o ano de 2050 as estatísticas apontam para 357 milhões, embora com menos portugueses mas mais falantes nos países lusófonos[19] – é fundamental considerar a língua e a sua expansão como um investimento decisivo para o futuro; produção de materiais adequados, pelo menos em duas línguas; formação específica de professores; acordos bi-laterais com os países dos vários continentes onde se notou e nota a presença portuguesa; uma parceria especial com o Brasil – o país da CPLP com maior número de falantes – e apoiar os Órgãos de Comunicação Social com vocação para serem veículos de promoção e divulgação, sem esquecer a Internet. Foi exactamente “na rede” que pudemos consultar o sítio geoscópio[20], no qual se propõe o ano de 2015 como “O Ano da Expansão” e ponto culminante dos 600 anos do processo, considerando a decisão estratégica da expedição a Ceuta. Até lá, são propostas quatro datas para assinalar a efeméride:
- 2009 – 500 anos sobre a batalha de Diu.
- 2010 – 500 anos sobre a criação de Goa.
- 2011 – 500 anos sobre a presença dos portugueses em Malaca.
- 2014 – 500 anos sobre a primeira grande operação de marketing internacional de uma grande potência, uma inovação dos portugueses com a embaixada a Roma.
            Entre outras sugestões, o autor da “iniciativa” propõe ainda avançar com um projecto de filme internacional e um jogo online sobre a batalha de Diu (1509), a concluir em 2009 – não no sentido de exaltação imperial, mas como crónica romanceada das lições de estratégia e de inovação militar e tecnológica.
Novembro de 2008
António Augusto Bondoso    



[1] - O Império acabou. E agora? – Antónia de Sousa, Editorial Notícias, Lisboa, 2000.
[2] - Doutorado em Ciências da Educação pela Univ de Salamanca e fundador do Instituto Superior de Ciências da Informação e Administração de Aveiro. Em Revista de Cultura Pensar Iberoamérica, nº5- Janeiro/Abril de 2005.
[3] - Brian Juan O’Neill, em Revisra Macau, II Série nº64, Agosto de 1997.
[4] - idem
[5] - Joseph Sta Maria, luso-descendente de Malaca. A capa do livro mostra duas dançarinas “portuguesas” vestidas com típicos trajes folclóricos, provavelmente de origem minhota. 
[6] - 16 de Janeiro de 2006.
[7]- 23 de Janeiro de 2006. Consultada em Elos Clube de Uberaba, a 20/11/08, em www.uaisites.adm.br/iclas/solidariedade e em http://passaleao.blogspot.com/
[8] - Maria Isabel Tomás, em Os Crioulos Portugueses do Oriente – uma Bibliografia, Instituto Cultural de Macau, 1992 e Teotónio R. de Souza, em Lusofonia sem Lusofilia? O caso do Antigo Estado da Índia – consultado em 12/11/08 em www.geocities.com/Athens/Forum/1503/lusof_goa.html
[9] - Agência Lusa, em 21/11/08 – Lisboa e Dili.
[10] - Agência Lusa em 21/11/08 – Lisboa e Dili.
[11] - Revista Macau. IV série, nº1, consultada em 13/11/08 em www.revistamacau.com/
[12] - Atlas de Portugal, consultado em 21/10/08 em www.igeo.pt/atlas
[13] - Rui Graça Feijó, 2008, em Etnográfica. (Língua, nome e identidade numa situação de plurilinguismo concorrencial: o caso de Timor-Leste).
[14] - Termo que no Sudeste Asiático significa “língua”.
[15] Catholicisme et Protestantisme dans l’Ile de Timor: 1556-2003.
[16] - Sítio da BBC Brasil na Internet, artigo de Sílvia Salek, publicado a 4 de Novembro de 2002
[17] - Jornal Tribuna de Macau em língua portuguesa, Junho de 2008. www.jtm.com.mo/
[18] - www.hojemacau.com/news, consultado em 21/10/08.
[19] - Diário de Notícias, 16 de Novembro de 2008, com base num relatório da ONU sobre a situação da população mundial, que não inclui S.Tomé e Príncipe.
[20] - http://geoscopio.tv/2007/06/a-diferenca-portuguesa/2015.  Por JNR.


António Bondoso
Jornalista e Mestre em RI.

2016-03-09


CÉU ETERNO…

Para mim, não é mister haver um qualquer acontecimento ou uma simples notícia dele, para me trazer África - particularmente S. Tomé e Príncipe - ao pensamento e ao coração. Neste dia, e antes que se volte a falar das efemérides do 11 de Março, de novo o meu horizonte se alargou para o Equador Atlântico. É fatal como o destino. E agora, que já vamos a caminho da celebração dos 48 anos da independência do país, volto a recordar o meu "Céu Eterno": 

Foto de A. Bondoso


CÉU ETERNO…

De São Tomé tenho o céu
E as nuvens carregadas de mensagens.

Chovem letras e palavras
De saudade
Que o calor liberta
Evaporando
E depois se concentram bem fechadas
No andar superior da nossa idade.

Não cuido de saber o que me dizem
Nem preciso confirmar quem as escreve
São palavras de ternura e de amizade
São ideias que germinam
Cristalinas
Derrubam mitos e lendas que não sabem
Andalas despidas de palmeiras
Ressequidas.

De São Tomé tenho o sol
E toda a sede fresca de um desejo
De São Tomé tenho o Príncipe
E o azul claro das águas que revejo

De São Tomé tenho o tempo
Em horas e dias pendulares

De São Tomé tenho a alma
Dissimétrica e pura nos olhares

De São Tomé tenho a gente
E o sorriso generoso das crianças

De São Tomé tenho o aroma das flores
E a força épica das raízes do ocá

De São Tomé tenho a música
A mais bela melodia já tocada
Por um eterno ossobó e por uma camussela delicada.

======== António Bondoso
Julho de 2015.
40 anos independência STP


9 de Março de 2016
António Bondoso
Jornalista - CP 359