2011-03-10

À VOLTA DE MIM E DO MUNDO !



O Discurso é uma Arma...

por António Bondoso a quinta-feira, 10 de Março de 2011 às 2:10

As palavras matam. E podem assassinar um regime. Um discurso pode ser uma arma que, mal analisada, mal interpretada, mal utilizada - pode dar um rumo às situações, muito diferente daquele imaginado. E o discurso de posse do PR , se não for rápida e eficazmente explicado, pode permitir "colagens" e aproveitamentos nada agradáveis para o presente e futuro próximo deste país agonizante. Omissões no diagnóstico, propositadas ou não; pouca clareza na prescrição dos remédios , não demonstra coragem. É ficar a meio do medo ! Quando fala em consenso alargado, por que razão não diz claramente que - na sua perspectiva - a melhor e imediata solução é o que se pode chamar de "governo de salvação nacional" !?

Apenas pelo simples facto de pensar que o Governo vai morrer de morte natural. Ou então... agonizar por influência da alta finança. E aí, os responsáveis serão outros. Desde logo o Governo e quem o apoia e, depois, o Fundo Europeu de Estabilidade ... antes do FMI. É isto que está a marcar a agenda política portuguesa, sabendo-se que as sondagens não permitem - ainda - uma solução de partido único do PSD.

Nem este partido nem o PR estão interessados em arcar com o ónus da queda deste governo Sócrates. Tem sido mau em muitos aspectos, mas tem resistido - à sua medida e à custa dos que menos podem - à maior crise internacional desde a II Guerra Mundial.

Evitar imediatos efeitos secundários que darão à nossa crise uma dimensão fora do comum - seria, por exemplo, o BE desisitir da sua Moção de Censura. Ou então, o PS e o Governo apresentarem rapidamente uma moção de confiança. Ou ainda... o Governo demitir-se !

E as consequências do que eventualmente poderá acontecer no dia 12, seriam muito menores. Cá estaremos para ver.

Não sei se os "brandos costumes" poderão ser suficientes para impedir uma explosão maior do que a da Grécia.

E que não se caia na tentação de enviar para as ruas o Corpo de Intervenção - da PSP ou da GNR. Apesar das achas para a fogueira já lançadas, não se junte maior irresponsabilidade àquela já colocada na panela de pressão.

E que haja alguém que consiga "enquadrar" os jovens e não permita que eles possam ser instrumentalizados - uma tentação a que muitos não vão conseguir resistir. A manifestação é um direito e pacífica deve ser !

2011-03-05

À VOLTA DE MIM E DO MUNDO !


A quem não leu ( ou adquiriu) ainda o recente livro de Conceição Lima - O PAÍS DE AKENDENGUÊ - quero significar a oportunidade de ficarem a conhecer um pouco mais de África e do pensamento desta jovem e brilhante escritora/jornalista Sãotomense. Ainda o livro estava em "projecto" e fui eu um dos "escolhidos" para expressar opinião. Independentemente do resultado final, gostei de lhe transmitir estas ideias:
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Caríssima São

Camarada de palavras “em navio” e conterrânea por amizade.

Sem sair do “coração da ilha”, fui capaz – penso – de percorrer os trilhos deste teu tão sentido quanto belo “País de Akendenguê”.

De Kwame a Malabo, de Batepá a Fernão Dias, da cidade de nome santo ao Congo – percebi a tua angústia e os tempos dos teus fantasmas, mas também os sonhos, não utópicos, do “renascer” da tua Ilha-África.

Como tu, também eu não estou farto de palavras – da nossa palavra jurada – que se entranha nas unhas como as cordas do tempo.

Talvez não tenha interpretado ou decifrado correctamente os teus sinais – ousadia minha consegui-lo – mas, sem sair do “coração da ilha”, esse teu Jardim em ruínas que pintas com os olhos da imensidão do mar e amando as palmeiras que sempre quiseste verdes e rectas, “percebi” que hás-de voltar sempre à Ilha na crista das palavras, pois é lá que moram o teu coração e a tua humilde e solidária “avó” a quem pertences.

E voltarás sempre, apesar dos vampiros e dos indecifráveis desígnios dos Deuses! Sem enigmas. O teu verbo de poeta tem palavras cristalinas, embora sofridas e – por vezes – verdadeiras farpas. Por isso, as canções do teu imaginário serão mais fortes que um qualquer cataclismo, que uma eventual hecatombe.

Se te conheço, do que me recordo e da imagem que formei, a tua estrutura é a do tronco forte do “baobá”, seguro – quase eterno – capaz de enfrentar as tormentas do Grande Rio que te convoca por amor. E será lá, na tua velha casa, na tua casa de sempre, que irás conseguir separar o trigo do joio – pois ao longo da vida tropeçamos em muitos equívocos. O importante é continuar a ser livre como são todos os poetas, porque amar a imensidão do mar será sempre um acto de liberdade pelas palavras. Em busca de muitas verdades, não apenas da nossa !

É bom ouvir os Pastores e as suas lendas, pois Cristo e Maomé foram Pastores e neles se escreveu a verdade !

Sabemos, por outro lado, que as “promessas” são as dos homens comuns, tal como as dos políticos que nos governam – quer seja na nossa “ilha”...quer seja nas que nos são próximas – com falta de ética e moral duvidosa sufocando-nos com mentiras.

Foi assim que fizeram muitos orixás da terra criada por Obatalá, invejando Ogun que sabia o segredo do ferro. Os abutres, ontem como hoje, podem enganar e colher em vida – mas não fugirão para sempre nos “seus tapetes de sonhos”. Haverá certamente uma “madrugada” libertadora, em Abril ou Julho, deixando entrar uma luz pura e justiceira para julgar os abutres. Alguns já foram julgados pela História! Mas percebo que a consciência dos mortos e dos seus irmãos ainda reclamem por justiça. O problema é saber de onde ela poderá vir.

De quem, de onde ? Não seguramente dos tiranos que nos amordaçam, contra os quais esgrimiremos a liberdade das palavras. Estarei contigo nessa caminhada, sem temor dos fantasmas, sem vergar a cabeça!

Mas deves estar avisada para o facto de viagem alguma responder a todas as nossas inquietações. Mesmo que a “mafumeira” que escolhermos para nos levar pelo Grande Rio seja a mais forte e a mais veloz. É que a memória – é preciso tê-la – tem o grande inconveniente de somar feridas e sonhos. Conciliar tudo isto, sem rupturas, recomenda uma “estrutura” forte mas serena. Que não frágil !

Se te conheço, se a imagem que formei estiver certa – serás capaz! Tal como foi Kwame, o “tenaz caminhante e artesão da demanda independentista”, tal como foram Kenyata, Kaunda, Boigny, Senghor, Lumumba e – antes deles – Padmore e Du Bois.

Mas em 1953, em Kumasi, já os cifrões dividiam a ideologia em busca do poder. E a Guerra Fria também. A Gold Coast engroçava o rol das resistências ao colonialismo, mas os ventos das ilhas perderam-se no Golfo. Por isso, Kwame – preocupado certamente com a liderança e com a sua “Positive Action” – não teria “ouvido” os gritos dos humilhados e torturados no mar da morte em Fernão Dias, ou o “arquejar” dos brutalizados das “brigadas da escravidão”, que do seu corpo e alma fabricaram os tijolos dos “chalés da marginal”.

Tudo isto não foi suficiente para um “novo mapa” da tua Ilha-África. Mas talvez o teu imaginário “Mwalium” preferisse dizer-te que, as “novas fronteiras”, seriam eventualmente um processo bem mais doloroso e violento.

Por isso, que a tua inquietação se esvaia e o pó se torne pó, que é o destino do Homem. E que dos seios do teu lugar, da tua Ilha-África, se esvaia também o “leite envenenado” da Vila lá em cima, agora cidade.

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Que esta leitura vos incentive a absorver cada palavra do imaginário de São Lima.