2012-11-14



AINDA A VISITA DA SENHORA MERKEL...

RELENDO LUÍS SEPÚLVEDA[1]

Hoje, dia de “greve geral” – e quanto ela se justifica! – aproveitei para reler, como faço muito regularmente, o incontornável lutador Luís Sepúlveda. E nas suas “Crónicas do Sul” deparei com um texto sobre as questões da emigração/imigração na Europa, a propósito dos tumultos de rua em França quando Sarkozy era ministro do interior. O título, muito sugestivo, era «Carne de Blogue» (3), e derivava depois para a imigração no país da senhora Merkel. É um texto marcante, que não resisto a citar:


[1] - Crónicas do Sul. 2008. ASA, Porto.



Quão longe vão os tempos de Willy Brandt e de Olof Palme!
Até da Europa solidária de Jacques Delors.
Fica o registo.
António Bondoso.




2012-11-11


A IMBECILIDADE CAMPEIA... 


A imbecilidade campeia.
Velozmente tece a sua teia
Aproximando
Apertando
Triturando
Morrendo e putreficando.

Mas o mundo dos sons apresenta-se vivo
Renovado.

A alma alegra-se ouvindo
De um canário encantatório
Trinado rico marcante
Código morse rendido
A esse falar ilusório.

E quando se fina o gorjeio
Veloz compasso melódico,
Volta a morrer a harmonia
Do meu plumoso presente.

E breve de novo me dou conta de que a imbecilidade campeia.
-------A.Bondoso (a publicar). 



2012-11-10


À VOLTA DE MIM E DO MUNDO...







Há pessoas com muitas capacidades.
Alguns mostram-se sem saber, outros sabem mostrar-se, há quem pense que o mundo gira à sua volta – a obsessão é quase um pecado – há muitos que estão “convencidos”, ainda outros que sabem “convencer” e também aqueles que se deixam convencer. Outros, porém, convencem-se de que – em seu redor – tudo o que mexe, pensa, fala ou escreve tem um único destinatário: eles próprios! É o que se pode chamar de suprema atitude narcísica. 
Há humildes competentes, existem falsos humildes, há quem seja humildemente arrogante e ainda o grupo dos teimosos. Alguns serão certamente competentes, mas a maioria coloca-se no grupo dos teimosos incompetentes. 
E há aqueles que vivem no mundo da ilusão. Iludem-se com o que pensam saber mas não sabem, iludem-se com um fugaz clarão do que pensam ser sucesso, vivem na ilusão da mentira, sabendo que não sabem de onde lhes chega a convicção ilusória. Dizendo de outra forma, sabem que a matéria não lhes pertence mas, contudo, conseguem transformá-la (nada se cria, tudo se transforma) remodelá-la, dando-lhe uma aparência de novidade e de autenticidade.
De facto, há pessoas com muitas capacidades. Espero que, por isso, possam perceber o texto.
Mas se alguém não percebe que tudo isto tem a ver com o carácter – ou falta dele – definitivamente é um incapacitado!
---------A. Bondoso. 


2012-11-09


À VOLTA DE MIM E DO MUNDO... 


De repente...quase calcamos uma das muitas víboras que rastejam por aí, dando razão a Maquiavel: o homem é mau por natureza.
E embora os bons sejam aos milhões, sentem-se impotentes para arranjar um antídoto que surta efeito perante o fatídico veneno das cuspideiras.



Há serpentes...


Cobras capelo e de chapéu
Que se passeiam em jardins de uma cidade
Que rastejam nas matas mais profundas
À espreita de emboscada planeada
À espera de um ataque fulminante.

Há serpentes...

Cascavéis em desertos já passados
Víboras da cor da terra
Com meias da cor da pele,
Qual disfarce dos guizos em ruído
Sibilina postura d’entre dentes.
----------------------------A.Bondoso (a publicar)

2012-11-04


MOIMENTA DA BEIRA E A GUERRA COLONIAL.



A guerra, qualquer guerra, deixa marcas profundas. Recuperáveis a médio e longo prazos no aspecto material, mas dificilmente ultrapassáveis no íntimo psicológico dos actores – sobretudo daqueles em que as “marcas” persistem, quase não havendo fronteira entre os problemas físicos e os psíquicos. É o que se designou chamar de “Stress Pós-Traumático de Guerra”, assunto que vai merecer hoje destaque em Moimenta da Beira, por iniciativa da Delegação de Tondela da Associação Nacional dos Combatentes do Ultramar. 


As guerras, todas as guerras, sejam elas nomeadas como “justas” ou “necessárias” – designação impossível por oposição à sempre injusta violência e aos seus efeitos – são igualmente imorais. E como escreve Tim O’Brian, em As Coisas Que Levavam os Homens Que Lutavam, “se uma história de guerra parece moral, não acreditem nela”. É uma citação com que Arturo Pérez-Reverte, jornalista da TVE, abre o seu livro Território Comanche, sobre a guerra da Bósnia: “(...) As bombas levantam pó, cascalho e metralha, e depois matam-te e ficas como aquele soldado croata, completamente só, na valeta da estrada, junto da ponte de Bijelo Polje. Porque os mortos, além de parados, estão sós, e não há nada tão só como um morto”.


 Mas quem tem a “sorte” de não ser atingido...e “apenas” vê morrer ou sente a impotência de salvar a vida de um camarada, ou apresenta ausência de reacção no sentido de poder ajudar o estropiado a seu lado, nunca mais ficará só. Poderá ficar com deficiências físicas ou não...mas no seu interior haverá sempre – mais ou menos evidente, consoante os casos – uma máquina de filmar que rebobina e projecta as imagens de pânico, ânsia, terror, medo, impotência. Por vezes até, sentimentos de culpa por vivo permanecer. Nunca mais estará só, tal como o seu comportamento afectará igualmente familiares e amigos chegados. É sobretudo destas questões que se vai falar hoje em Moimenta da Beira, concelho que também contribuiu com a sua percela de vítimas durante a Guerra do Ultramar, para uns, Guerra Colonial para outros, ainda Guerra da Independência para o “outro”.


Designações que o antigo regime português foi incapaz de ultrapassar no sentido político, preferindo dar razão ao general prussiano Karl von Clausewitz – quando este dizia que “a guerra não é meramente um acto político, mas sim um autêntico instrumento político, uma continuação da actividade política, uma realização da mesma utilizando meios diferentes”. Nestes casos, ou não houve diplomacia, ou a diplomacia falhou, ou a diplomacia se prolongou demasiado no tempo, incapaz de matar a guerra no tempo certo. 


E os resultados, independentemente de quem vence – se realmente existem vencedores – são sempre problemáticos, trágicos e de difícil solução. Mas é fundamental discuti-los sem tabus e sem culpas.  
António Bondoso. 

(NOTA:--- Fotos do Autor (1,4,6) e retiradas da pg.7 do jornal Terras do Demo, de 25 de Outubro 2012, com a designação de Publicidade).