2010-07-10

A PROPÓSITO DE UMA EFEMÉRIDE !



SAUDOSISMO É SAUDADE, SAUDOSO, NOSTÁLGICO... NÃO HÁ UM QUARTO (E PEJORATIVO) SIGNIFICADO !

Mas 35 anos depois das independências das ex-colónias portuguesas em África - ainda há quem veja nas "saudades" uma atitude negativa e a merecer reprovação. Aconteceu há dias num programa da TVI.

Rebaixar a saudade, atribuir-lhe uma conotação fora de tempo pode querer significar, por um lado, um exacerbado narcisismo moral e, por outro, uma total incapacidade para perceber que as raízes estão - sobretudo - na terra onde crescemos.

E como eu digo no meu último livro "Seios Ilhéus" .,.. quem cresceu numa ilha, amou e ama mais profundamente !

S. Tomé (e Príncipe), que adquiriu o estatuto de país independente a 12 de Julho de 1975, marcou sobremaneira a minha condição de ser humano. Com defeitos e virtudes, como em qualquer outro lugar do planeta, mas com um horizonte de sonhos só igualável pela grandeza do Oceano.

Ali cheguei em 1953, com apenas 3 anos de idade! Outros para lá viajaram já homens feitos, à procura de um serviço militar mais tranquilo nos anos de mil novecentos e sessenta ou setenta.

Só pode ser saudoso de S. Tomé e Príncipe, quem viu crescer as casas e abrir ruas, quem respirou o fumo dos químicos que erradicaram o paludismo em finais dos anos de 1950, quem brincou à chuva nos caminhos de barro, quem "tocava" o arco só em calças de pijama entre o bairro da Conceição e a Escola Vaz Monteiro, quem se aventurava no canavial da Ponta Mina, quem comia caroço e jogava à bola no Parque do Sô Secreta.

Só pode ser saudoso de S. Tomé e Príncipe, quem apanhava a manga atirando pedras à árvore ou colhia o úntué na beira do caminho, quem via acordar a Cafendeia no jardim do início do Bairro de S.João - na sua injusta e penosa errância pela típica cidade colonial.
Não se é "saudosista" (na tal enganosa significância dos falsos moralistas) pelo facto de chorar as memórias dos bancos da Escola e do Liceu, pelo facto de lembrar a pesca do charoco na foz do Água Grande que divide a cidade.
Tem o direito de ser saudoso quem aprendeu a nadar nas águas da Baía de Ana de Chaves ou no pontão da Praia Maria Emília, tem o direito de ser saudoso quem recorda as primeiras aventuras "amorosas" escritas em papelinhos enrugados e enviados de carteira em carteira até ao destinatário da infantil paixoneta.

Perceba-se, compreenda-se, assuma-se, critique-se a História. Mas não nos coloquemos fora do passado. Todos somos livres de não sentir saudades. Mas não se rejeite a legitimidade da saudade dos outros. E, sobretudo - não se espalmem rótulos !

PARA QUEM NÃO LEU... fica esta pequena crónica da "viagem" !

APENAS UM PEDACINHO DE HISTÓRIA DE UM PEQUENO PARAÍSO...

E DEPOIS... HÁ SEMPRE
Há cinco anos publiquei este livro - Escravos do Paraíso - tendo consciência de que 30 anos é apenas uma gota de vida num Estado-nação. Mais cinco anos acrescenta muito pouco. Mas quem ler perceberá melhor as dificuldades de construir um país - sobretudo em quadros políticos internacionais completamente divergentes. O que não retira responsabilidade aos agentes políticos nacionais.


ENTRE 2005 E 2010, TIVE A OPORTUNIDADE DE AMADURECER MAIS ALGUMAS IDEIAS. MAS DEI-LHES A FORMA DE POEMA. A INTIMIDADE DA MINHA SAUDADE, ALGUMAS DESILUSÕES - MAS SOBRETUDO A TRANSPARÊNCIA DAS MINHAS EMOÇÕES E DOS MEUS AFECTOS.

POR ISSO... LHES CHAMEI "SEIOS ILHÉUS":


DESTE ÚLTIMO LIVRO, DISSERAM POR EXEMPLO:

O meu camarada jornalista Francisco José Oliveira - homem da Rádio em muitos anos de Angola:
"Desde logo, importa referir que a obra é profunda, telúrica, num apelo à terra que pariu inúmeras gerações, espalhadas durante séculos pela diáspora santomense. Ao mesmo tempo, transborda de sensualidade e de erotismo, porque o autor joga magistralmente com uma duplicidade de conceitos expressos por palavras homófonas e homógrafas mas que deixam ao imaginário de cada leitor a transição para a geografia do corpo de uma mulher e do corpo ubérrimo da terra".

E o meu conterrâneo Manuel Rodrigues Vaz - também jornalista e agora Editor - igualmente jornalista em alguns anos de Angola:
"Habituado que estava a encará-lo apenas como jornalista, não imaginava a força e o sabor dos seus poemas, cuja cadência ondulante a lembrar os ambientes quentes de África com toda a magia dos seus poentes inesquecíveis e o pulular das suas gentes cheias de cor e encanto nos prendem e cativam crescentemente".

POR HOJE BASTA ISTO... pois o objecto da crónica é a efeméride de 12 de Julho de 1975 - data da independência de S. Tomé e Príncipe, um país cuja economia o Fundo Monetário Internacional (FMI) vê hoje com alguma preocupação, tendo em conta a paridade da moeda com o Euro.


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