2025-07-08



50 – 50…A essência dos Povos (2)




PIRES VELOSO E OS QUATRO «DÊS» DA REVOLUÇÃO DE ABRIL:

DERRUBAR O REGIME – DESCOLONIZAR

DEMOCRATIZAR – DESENVOLVER

Em todos estes aspetos, o Senhor General Pires Veloso participou com determinação e sensatez. Não será preciso investigar muito para entender a ação do Homem e do Militar. Ainda em Moçambique, no Norte difícil, Pires Veloso não se coibiu de afirmar publicamente que a «guerra» não poderia ser vencida pelo exército português. 

DE MOÇAMBIQUE AO PORTO E NORTE DE PORTUGAL COM STOP-OVER EM S.TOMÉ E PRÍNCIPE. 

HÁ DUAS PERSPETIVAS que eu gostaria de seguir nesta minha curta intervenção: - UMA DE OUVIR E PERCEBER, EM STP;

OUTRA, NO PORTO:- DE PERCEBER E CONHECER: 

A verdade é que não sei, ainda hoje, quantificar o que o país lhe terá ficado a dever [não foi pouco seguramente], depois da sua intervenção em Abril de 1974 e em Novembro de 1975 [independentemente das posições tomadas e das circunstâncias em que o foram e dos “rótulos” com que o distinguiram] – tendo pelo meio uma missão tão decisiva quanto polémica na descolonização de S. Tomé e Príncipe.(...)



               Foi ali que, por motivos evidentes [eu residia em S. Tomé desde 1953] tomei contacto com Pires Veloso. Nunca pessoalmente. Mas sabia escutar e perceber. Por essa altura – quando ele chega ainda como Governador, em finais de Julho de 1974 – eu tinha terminado precisamente os meus 43 meses e um dia de Serviço Militar Obrigatório, e exercia a minha atividade na Rádio (o já Emissor Regional da E.N.) como Coordenador de Programas e Redator-Locutor.

          Durante várias semanas, o meu programa da noite teve como convidado especial um dos delegados do MFA e da Junta de Salvação Nacional – o hoje Almirante Cavaleiro Ferreira. Igualmente tive o privilégio de conhecer o Major Moreira de Azevedo, que viria algum tempo depois a fazer parte do Governo de Transição, previsto no Acordo de Argel. Moreira de Azevedo foi um dos militares de Abril que esteve envolvido na elaboração do programa do MFA, como que «assessorando» Melo Antunes. 




          PIRES VELOSO chegou a S. Tomé já com uma ideia muito construída da situação que ali se vivia. Sobretudo no que dizia respeito a uma certa elite dos colonos, particularmente alguns administradores das Roças mais importantes – como era o caso do Sr Fonseca do Rio do Ouro. Um relacionamento de choque que viria a criar algumas situações embaraçosas para o roceiro.

          Por outro lado, era do seu conhecimento a atividade dinâmica da Associação Cívica Pró-MLSTP, fortemente empenhada na mobilização e na politização da população são-tomense. Nem esta nem a grande maioria dos colonos se poderiam considerar politizados. Uma rara oportunidade havia acontecido em 1968, quando Mário Soares foi para ali deportado, em plena Guerra do Biafra.

          Até à chegada de Pires >Veloso, S. Tomé e o Príncipe viveram um «vazio de poder», pois o último Governador – Cecílio Gonçalves – havia sido forçado a partir quase três meses antes, em choque com o então Comandante Militar Ricardo Durão. 


Jorge. T. Marques - Semana Ilustrada

          A Cívica, com liderança de Alda do Espírito Santo e de Gastão Torres, aproveitou esse «vazio» para gerar nos colonos brancos um clima de intimidação e de angústia. Para além de greves e de reivindicações generalizadas.

          Tudo isto era do conhecimento de Pires Veloso, informado pelos relatos diários ou quase dos já referidos Delegados do MFA, que chegavam à COORDENADORA em Lisboa, tal como ao ministro Almeida Santos.

          Até que a corda – demasiado esticada – acabou por rebentar em 6 e 7 de Setembro de 1974. Assaltos a estabelecimentos comerciais geraram um clima de medo. E uma boa parte dos colonos, não só brancos, acabou por se dirigir ao Palácio do Governador. Ânimos exaltados, pedia-se proteção e uma forma de embarcar para Portugal.

          Acresce que STP sempre foi uma terra de «boatos», o que ia aumentando esse clima. 




          Pires Veloso acabou por contornar a exaltação de alguns colonos, mas não podia prometer qualquer coisa de concreto. Apenas tentou serenar os ânimos e dizer que ia tentar falar com o ministro Almeida Santos. Sugeriu também que, quem quisesse, poderia «resguardar-se» no Quartel da Polícia Militar.  

Foi esse o meu contacto mais próximo com Pires Veloso.  

          Percebi que ele tinha a noção de que a autoridade era ele. Só. Solitariamente. Na metrópole, ninguém sabia quem mandava em quem. Apesar das suas boas relações com Almeida Santos, o então Ministro da Coordenação Interterritorial, provavelmente de quem teria ouvido falar em Moçambique, pois ali viveu vários anos e exerceu advocacia. Talvez não tivessem passado despercebidas a Pires Veloso as ligações de Almeida Santos a alguns setores da oposição ao antigo regime.                    



          Mas o mês de Setembro foi pródigo em acontecimentos, provocados pela Cívica, fazendo salientar a perspicácia, a sensatez e a serenidade de Pires Veloso. No dia 6, na confusão gerada, caiu morto um cidadão são-tomense. A Cívica logo aproveitou para condenar os militares portugueses, mas nada foi provado. Por outro lado, Pires Veloso soube gerir a contestação da Cívica à Companhia de Caçadores 7, de incorporação local, exigindo a sua continuação, apesar de um incidente que levou à morte de um soldado são-tomense, no âmbito de patrulhas mistas – militares negros e brancos.  

Destaco ainda por exemplo a manifestação de várias dezenas de mulheres, vestidas de preto, em frente ao Palácio. Foi a 19 e ainda hoje esse dia é celebrado como Dia da Mulher São-tomense. 




Portanto, uma das “batalhas” mais difíceis que Pires Veloso teve que travar em STP foi com a “Associação Cívica Pró MLSTP”, vulgarmente conhecida por “Cívica”. E independentemente dos “campos opostos” – foi mais tarde quase unânime a defesa do papel de Pires Veloso em todo o processo de transição. De Filinto da Costa Alegre a Alda do Espírito Santo, de Carlos Tiny a Leonel D’Alva, todos salientaram as posições de bom senso e de diálogo construtivo, para além da firmeza. Evitou o que poderia ter sido um «banho de sangue». 


Fernando dos Anjos Dias

Voltei a encontrar Pires Veloso meses mais tarde aqui no Porto, quando ele assumiu o comando da RMN, como Brigadeiro. A ele recorri algumas vezes a solicitar a sua intervenção junto das autoridades de STP no sentido de resolver situações graves que envolviam amigos meus, quer portugueses, quer são-tomenses, presos por denúncias de boicote económico, corrupção ou conspiração política. O sr Vieira, dono de uma recauchutagem, Miguel Trovoada, Maria do Carmo e Albertino Neto.

E depois foi o Verão Quente…e mais tarde o 25 de Novembro.

Aqui, mais uma vez os caminhos se cruzaram. Eu na Rádio, ainda E.N., e ele com a responsabilidade de assegurar a vigência da Democracia pretendida.

Voltando ao início…ainda hoje não sei o que o País lhe ficou a dever. 


Blogue «Pires Veloso Vice-Rei do Norte»
Por mim…e para além da amizade, fiquei a dever-lhe uma participação decisiva na elaboração do meu livro ESCRAVOS DO PARAÍSO- Vivências de S. Tomé e Príncipe (2005, MinervaCoimbra. Pgs 35 a 70) – uma conversa a meias com a [também já falecida] sua mulher D. Maria Cândida. Ficou, assim, registada uma parte da história do país, particularmente da descolonização das Ilhas do Meio do Mundo de que ele aprendeu a gostar – apesar das reservas com que encarou inicialmente a missão para ser o último Governador da ex-colónia e, por fim, desempenhar o cargo de Alto Comissário até à independência em 12 de Julho de 1975.


«(...) Percebi que ele tinha a noção de que a autoridade era ele. Só. Solitariamente. Na metrópole, ninguém sabia quem mandava em quem.(...)».

E Alda do Espírito Santo: 

(...) A Cívica, com liderança de Alda do Espírito Santo e de Gastão Torres, aproveitou esse «vazio» para gerar nos colonos brancos um clima de intimidação e de angústia. Para além de greves e de reivindicações generalizadas.(...)»

“A INDEPENDÊNCIA, SENDO A MAIOR CONQUISTA DE UM POVO, NUNCA CORRESPONDE AO NOSSO SONHO.” : 

Ler completo em: 

https://palavrasemviagem.blogspot.com/2025/04/a-independencia-sendo-maior-conquista.html


António Bondoso

Junho de 2025. 
























 














 

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