2013-01-19


A PROPÓSITO DOS "RETORNADOS", "REFUGIADOS", "ABANDONADOS" e outros rótulos mais ou menos pejorativos. ( I )

Por muito dissecado e analisado, escrito e estudado, em qualquer perspetiva, a descolonização e os seus efeitos imediatos, por tardios, será sempre um tema complexo e divisor - porque carregado de traumas, de saudades e de saudosismos, de memórias e de histórias que fazem a História. A nossa é antiga de muitos séculos. Assumimos o grande feito das descobertas, devemos assumir os erros da colonização e não podemos colocar de parte o atabalhoado processo de descolonização - resultado de treze anos de uma guerra em três frentes, que os políticos não souberam [alguns não quiseram] terminar, negociando em tempo oportuno uma saída ao espírito do tempo. 
Repesco agora algumas ideias, em razão sobretudo de uma nova vaga de estudos e investigação, que se apresenta em forma de livros mais ou menos ficcionados e em série de rádio e de televisão. DEPOIS DO ADEUS - assim se chama a série da RTP - vai, inevitavelmente, reabrir o "diálogo" que, também inevitavelmente, voltará a ser acalorado e picante quanto baste sobre os que vieram de África. Já o foi na apresentação do projecto e mais será, seguramente, nos próximos meses. É minha convicção que o reabrir do "processo" não  será negativo. Pelo contrário, o amadurecimento das ideias traz perspetivas mais concretas e mais esclarecidas, independentemente de continuar a haver [nesta altura já muito menos] algumas posições ressabiadas. E é natural que o enfoque continue a ser dado às chamadas "jóias da coroa" ou do império [Angola e Moçambique], com um pequeno lugar no palco para a "simpatia" de Cabo Verde. O resto... por exemplo S.Tomé e Príncipe, não é matéria "vendável". 


A este propósito, anexo aqui um "post" que a minha mulher escreveu (bem) e fez publicar no facebook:

"Nesta tarde invernosa dei comigo a ver a nova versão de "Portugal no Coração" conduzida por um Malato "trapalhão" e as gargalhadas afectadas de Marta Leite Castro.
O tema interessava-me: nova série "Depois do Adeus" sobre o regresso dos portugueses que viviam nas ex colónias, ditos "retornados".

Várias vezes tenho afirmado que a História deve ser assumida sem traumas. No entanto, a primeira vez que ouvi falar na série comentei que achava cedo demais por me parecer que há ainda "feridas" abertas. Responderam-me que estava errada e que é bom falar nos assuntos. Verdade. Sempre gostei de frontalidade verdadeira.

Sempre ouvi meu pai, antes do 25 de Abril, falar " em surdina" na independência. O processo foi o que foi e pecou por tardio. Deveria ter sido muitos anos antes, mas Salazar e Marcelo não souberam resolver esta questão em tempo certo e de forma pacífica.

Não tenho trauma algum. Costumo dizer que sou tra(n)smontana por nascimento, africana por criação e do coração, uma passagem breve por Lisboa, "tripeira" na descendência, vivi o deslumbramento do Oriente e da Beira por amor!

*Verifiquei, com uma tristeza muito grande, que a terra que me viu crescer, S. Tomé e Príncipe, hoje, felizmente, País independente, continua a não existir tal e qual como antigamente. É um País pequeno e com muitas dificuldades, mas merecia ter sido referido. ( ouviu-se o seu nome numa canção de Dany Silva e já não foi mau...).

*Foi bom ouvir um dos actores dizer que estávamos (retornados) 10 anos à frente e que trouxemos modernidade e alegria a este Portugal que era cinzentão.

*Paulo de Carvalho disse que "ainda não é o tempo de reflectir, que pensa que as pessoas perdoaram, mas não esqueceram."
(Lá vem mais sofrimento, digo eu...).
Paulo de Carvalho disse ainda: "Não deixemos que o Poder (qualquer Poder, em qualquer parte do mundo), nos roube o sonho!"

Eu acrescento: Não deixemos que, recordar momentos dolorosos que muitos portugueses de todas as raças viveram, nos desvie da crise que atravessamos neste País novamente cinzento!
Que o sofrimento que vai ser recordado sirva para nos unir a todos como irmãos na luta pela igualdade em todo o mundo." ( Maria do Amparo Bondoso). 
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Aproveitando a "boleia", decidi retomar algumas das ideias que expressei no meu livro ESCRAVOS DO PARAÍSO - VIVÊNCIAS DE S.TOMÉ E PRÍNCIPE, de 2005, editado pela MinervaCoimbra e cuja capa aí está. Particularmente para vos dar conta de alguns aspetos que antecederam a nossa vinda para Portugal, o nosso regresso, o nosso retorno - se assim quiserem! 






Com a transição, bem ou mal feita, viémos e ficámos - adaptando as nossas vidas a esse PREC tumultuoso e ultrapassando todas as dificuldades, apesar de eu ter sido colocado temporariamente em Lisboa, enquanto a minha mulher esperou pelo normalizar da sua situação, em Vila Nova de Gaia - localidade onde já se encontrava parte da família [irmãos, tios e avó], independentemente de a mãe ter regressado a S.Tomé, de onde o meu sogro entendeu não partir, pelo menos enquanto sentisse tranquilidade suficiente. 
ANTONIO BONDOSO.



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