2010-03-21

À VOLTA DE MIM E DO MUNDO !



AS CIRCUNSTÂNCIAS DA VIDA...E DA MORTE !

Num livro que acabo de publicar e a que dei o nome de "Seios Ilhéus", em homenagem à terra que me viu crescer - São Tomé e Príncipe - digo eu que

"...às vezes sinto que o tempo caminha
sorrateiro atrás de mim
perseguindo memórias cheiros e paisagens
o ser e o estar de um ilhéu de mil imagens"...

À felicidade que tive em partilhar em vida mais alguns poemas, carregados de afectos e de emoções, juntou-se infelizmente a sombra da morte.

Foi o Campos. Uma figura popular em S.Tomé, apenas pública por isso. Da Shell, para quem o conheceu e com ele conviveu no período colonial. Para os amigos, apenas o Campos. Só hoje soube que partira de "viagem", exactamente no dia em que, à hora do jantar, me chegou a notícia pelo telemóvel, - esse maravilhoso, tanto quanto irritante produto do avanço tecnológico da nossa civilização - do falecimento do Vitor Cruz. Outra popular figura "sãotomense" do tempo colonial.
A quem eu, aliás, fiquei a dever a gentileza e a disponibilidade para partilhar comigo as suas memórias e vivências das "Ilhas do Meio do Mundo". Chegou a S.Tomé em 1950, com 18 anos de idade, faleceu agora na sua casa de Pedralva - Anadia - com 78 anos de vida. Apesar de ter voltado a S.Tomé, o trauma do Vitor foi a sua partida em 1975. Dos 58 empregados da Roça Santa Margarida, ele foi o último a sair. E viveu sempre com a recordação do seu Andorinha Futebol Clube, rodeado de muitos e bons amigos - como por exemplo Américo Gradíssimo, Lucas, Elvido, João Cândido, Álvaro, Fernando Bondoso e Centeio. O Vitor, que em S.Tomé colaborou no Rádio Clube e no jornal A Voz de S.Tomé, foi em Portugal regular colaborador do jornal Região Bairradina, e é um dos meus "Escravos do Paraíso", publicado em Novembro de 2005. O Vitor que, pela sua actividade sindical na então colónia, recebeu o rótulo de "agitador" e, por isso, foi penalizado.

Nesse mesmo livro, está também em destaque uma outra figura grada da sociedade e da vida política e cultural de S.Tomé e Príncipe. Alda do Espírito Santo, há poucos dias transportada para o lugar da eterna saudade, foi professora, lutadora anticolonial, governante e poeta. De sua autoria é o poema que dá vida ao Hino Nacional Sãotomense. Um dos episódios que me contou passa por Caxias - a prisão - onde "viveu" 80 dias em finais do ano de 1965. Ali conheceu outras mulheres de luta, portuguesas, a quem chegou a ministrar aulas da instrução primária. E foi também em Caxias que Alda do Espírito Santo "inventou" o poema "repressão" - um doloroso retrato da luta contra o regime e dos acontecimentos sangrentos de 1953 em S.Tomé e Príncipe:

" Os abutres varrem a face da terra,
.................................................................
.................................................................
Que todas as vítimas imoladas
Possam soltar o canto da libertação".

Depois de honrar o nome de sua mãe ( Maria de Jesus), vítima da repressão colonial, e do seu país... Alda do Espírito Santo regressou ao seu Solo Sagrado da Pátria!

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